quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Can You Pass the Acid Test?!?


Esse doc é um barato. Ken Kesey e seu bando de Merry Pranksters (algo como "Fanfarrões Joviais") atravessam a América de Costa a Costa num busão colorido, com muito LSD misturado à laranjada e com Neal Cassady, herói do On The Road de Jack Kerouac, como motorista alucinado.

Foi uma das trips mais emblemáticas dos anos 60, regada a psicodelia, THC e Grateful Dead, seguindo caminhos paralelos aos de Timothy Leary e os "malucos" do Atlântico, numa jornada que viria a inspirar até mesmo os Beatles a embarcarem nas coloridices lisérgicas de Magical Mystery Tour. Aqui, viaja-se não com um fim em vista, mas a jornada é a própria recompensa.

A direção do filme é do Alex Gibney, também responsável pela cine-bio do Mr. Gonzo Hunther Thompson e pelo também excelente Taxi To The Dark Side, chute nos fundilhos da politicagem norte-americana em época de guerras por petróleo no Afeganistão, no Iraque, no Oriente Médio. 

Magic Trip, mais do que uma mera biografia sobre o autor de um dos romances norte-americanos mais impactantes do último século (Um Estranho no Ninho), é uma viagem ao turbilhão pulsante do Sonho Hippie e da inspiradora Geração Beat - e também sobre as razões que levaram toda esta turma de intrepid travelers a cantar, fazendo a eco a Lennon: “the dream is over”. 

Recomendadérrimo!

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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

"I would love to be the one to open up your mind..." (Wilco)


The illegality of cannabis is outrageous, an impediment to full utilization of a drug which helps produce the serenity and insight, sensitivity and fellowship so desperately needed in this increasingly mad and dangerous world. 
Carl Sagan

 If the words "life, liberty and the pursuit of happiness" don't include the right to experiment with your own consciousness, then the Declaration of Independence isn't worth the hemp it was written on. 
Terence McKenna 


MACONHA, CÉREBRO E SAÚDE (*)
por Renato Malcher-Lopes e Sidarta Ribeiro

Nunca foi tão oportuna quanto agora a discussão sobre os efeitos cerebrais e fisiológicos da Cannabis, popularmente conhecida como maconha. Se por um lado uma parcela da sociedade começa a questionar a pertinência das políticas públicas que criminalizam seu uso, por outro a ciência avança a passos largos para decifrar a enorme variedade de efeitos fisiológicos e psicológicos induzidos por seus princípios ativos. […] A maconha é uma das drogas recreativas mais usadas no mundo e está entre as mais antigas plantas domesticadas pelo homem. Esteve presente nos primórdios da agricultura, tecnologia, religiões e medicina. Testemunhos eloqüentes de seu impacto na civilização estão presentes nas escrituras sagradas e nos mais antigos documentos médicos das mais diversas culturas.

O número de artigos científicos publicados sobre o sistema canabinóide cresce linearmente a cada ano, de forma que a maconha protagoniza uma verdadeira revolução, representando uma das mais promissoras fronteiras no desenvolvimento da neurobiologia e da medicina. A descoberta dos endocanabinóides, ou seja, moléculas análogas aos princípios ativos da maconha, mas produzidas pelo próprio cérebro, é a grande novidade por trás dessa guinada científica. Neste início de século XXI, acredita-se que os canabinóides possam estar envolvidos na remodelação de circuitos neuronais, na extinção de memórias traumáticas, na formação de novas memórias e na proteção de neurônios. […] A desregulação do sistema canabinóide pode estar envolvida nas causas da depressão, dependência psicológica, epilepsia, esquizofrenia e doença de Parkinson.


I. A HISTÓRIA NATURAL DA MACONHA

Acredita-se que a Cannabis seja originária da região central da Ásia, onde ainda é encontrada em sua forma silvestre. Hoje em dia, uma extensa faixa de estepes entremeada por desertos recobre esta região seca e gelada. Entretando, há evidências de que a planta já existia por ali numa época em que o clima era mais úmido e quente, o que confirma sua extraordinária capacidade adaptativa. Desta região a planta teria se espalhado pelo mundo graças aos movimentos migratórios de nômades e à atividade de comerciantes. A milenar relação do homem com esta planta acabou por gerar inúmeras variedades das três subespécies da Cannabis (indica, sativa, ruderalis), selecionadas segundo o interesse de quem as cultivava, tais como a qualidade da fibra e a quantidade da resina que produziam. 

Vêm da China as mais antigas evidências da relação do homem com a Cannabis. Em 1953, numa vila chamada Pan-p'o, às margens do Rio Amarelo, trabalhadores escavavam as fundações de uma fábrica moderna sem imaginar que retiravam do chão a terra que os separava da pré-história de seu povo. Ali, sob sedimentos acumulados por mais de 6 mil anos, eles encontrariam indícios de que a Cannabis já fazia parte daquele cotidiano da idade da pedra: peças de cerâmica caprichosamente decoradas com marcas de tramas feitas de fibras de Cannabis. O achado arqueológico sugere que a Cannabis era usada na tecelagem rudimentar e na confecção de cordas e redes de pesca pelos ancestrais dos chineses. Outros sítios arqueológicos espalhados pela China e na Ilha de Taiwan revelaram que ao longo dos séculos a versatilidade dos usos da Cannabis tornou seu cultivo imprescindível para a vida nas vilas do leste asiático. Seus pequenos frutos se tornaram um dos mais importantes grãos usados na alimentação, e uma fonte primordial de óleo comestível e combustível. […] A qualidade das fibras da Cannabis também possibilitou aos chineses a invenção do papel.

Segundo o botânico e geógrafo russo Nicolay Vavilov (1887-1943), o homem primitivo experimentava todas as partes das plantas que pudesse mastigar, de forma que os brotos e inflorescências de variedades de Cannabis ricas em resinas aromáticas e pequenos frutos oleosos deveriam lhe parecer especialmente atraentes. Evidentemente, para aqueles que vieram a comer da planta, foi inevitável ingerir também os princípios psicotrópicos abundantes na sua resina, transformando a despretensiosa refeição numa experiência certamente inesquecível, com enormes consequências para a humanidade. Naquele contexto, os efeitos mentais da maconha teriam representado para esses coletores incautos nada menos do que um mergulho profundo em uma realidade completamente fora deste mundo, produzindo intensas sensações místicas.


....o homem antigo gradualmente aprendeu a reconhecer as propriedades farmacológicas das plantas por tentativa e erro, experimentando-as. Esse tipo de conhecimento empírico foi sendo adquirido e preservado pelos antigos xamãs asiáticos. […] Em 2006, foi encontrada na divisa entre China, Mongólia e Rússia a tumba de um xamã que viveu a cerca de 2.500 anos. Com ele foi enterrada, além de um instrumento musical, uma cesta de ouro contendo um farto suprimento de brotos e inflorescências de maconha que, devido ao frio, ainda presevavam um alto teor de canabinóides. Para xamãs como este, as propriedades psicotrópicas e medicinais dos mais diversos princípios da natureza, inclusive a maconha, eram sagradas e constituíam valiosas ferramentas farmacológicas necessárias ao ofício diário de diminuir as dores do corpo e dialogar com as diferentes dimensões da consciência.

A mais antiga farmacopéia (enciclopédia de medicamentos) do mundo, o Pen-ts'ao ching, foi escrita no primeiro século depois de Cristo a partir da compilação desse conhecimento tradicional, passado de geração em geração. […] A maconha era ali indicada para o tratamento de dor reumática, constipação, problemas femininos associados à menstruação, beribéri, gota, malária e falta de concentração...

O grego Heródoto (484-425 a.C.) nos legou em sua História o mais vívido e explícito relato que existe sobre os efeitos psicoativos da maconha na antiguidade. Segundo este relato, como parte de um ritual de purificação após enterrarem seus mortos, os citas entravam em uma tenda no centro da qual colocavam um caldeirão de bronze contendo pedras aquecidas. 'Os citas então jogam as sementes de maconha nas pedras em brasas: as sementes queimam como incenso e produzem um vapor tão denso que nenhuma sauna grega poderia superar. Ao se deliciarem com esses vapores, os citas uivam como lobos'. [...] A Cítia eventualmente desapareceu como nação, mas seus descendentes se espalharam pela Europa oriental, legando costumes presentes até hoje no folclore dessa região, sobretudo no norte dos Bálcãs, onde, por ex., se toma sopa com sementes de Cannabis no dia de ano-novo.

O filósofo grego Demócrito, contemporâneo de Heródoto, relatou que 'a maconha era bebida ocasionalmente, misturada com mirra e vinho, para produzir um estado visionário'. […] “...o uso médico e religioso da maconha sob a forma de uma bebida chamada bhanga já fazia parte da cultura dos persas na época de Heródoto... a bhanga teria a capacidade de revelar aos mortais os mais altos mistérios.

É bem possível que os hebreus já soubessem da existência da maconha antes mesmo de sua fuga do Egito, tendo em conta que os historiadores acreditam que o êxodo descrito no velho testamento possa ter ocorrido durante ou pouco antes do reinado do faraó Ramsés II (1195-1164 a.C.), o qual provavelmente conhecia muito bem os efeitos da maconha, conforme se pôde constar pela grande presença de canabinóides nos cabelos de sua múmia.



Em nenhuma outra civilização a maconha teve um prestígio religioso e medicinal tão expressivo quanto na Índia. De acordo com o Vedas, conjunto de textos que compõem as bases filosóficas do Hinduísmo, os deuses teriam mandado a maconha ao homem para que este pudesse alcançar mais coragem, libido e prazer. Uma fábula conta que, em um dia ensolarado, Shiva, o deus mais importante do Hinduísmo, estava aborrecido por causa de um desentendimento com sua família e saiu sozinho para caminhar nos campos, até que resolveu buscar proteção do sol sob a sombra de um majestoso arbusto de maconha. Curioso a respeito da planta que lhe dera abrigo, Shiva comeu de suas folhas e se sentiu tão revigorado que adotou a planta como sua favorita. […] Um livro sagrado escrito entre 2000 e 1400 a.C. reconhece a propriedade que a maconha tem de aliviar a ansiedade. O Vedas também se refere à maconha, uma das cinco ervas sagradas do Hinduísmo, como sendo uma fonte de alegria, regozijo e liberdade.

Diz uma lenda da corrente mahayana do Budismo tibetano que Siddharta Gautama, a primeira encarnação de Buda, se alimentou exclusivamente de sementes de maconha, uma por dia, durante os seis anos de preparação que precederam sua chegada ao Nirvana. Já na tradição do Budismo Tântrico... a maconha é utilizada para facilitar a meditação e potencializar as percepções sensoriais envolvidas em cada aspecto das cerimônias tântricas. Nos ritos sexuais, uma boa quantidade de bhang é ingerida com antecedência, de forma que os efeitos potencializadores dos sentidos coincidam com o auge da prolongada cerimônia sexual cujo objetivo final é o de alcançar a comunhão espiritual com a deusa Kali.

Foi somente por consequência da ocupação britânica da Índia, já no século XIX, que a Europa veio a tomar contato com as propriedades medicinais da maconha.... seu uso se espalhou pela Europa e EUA de tal forma que, já nas primeiras décadas do século XX, dezenas de remédios à base de maconha estavam sendo produzidas pelos mais importantes laboratórios farmacêuticos, sendo recomendadas pelos médicos para os mais variados problemas, incluindo: enxaquecas, dor-de-dente, cólicas menstruais, hemorragia menstural e pós-parto, risco de aborto, úlcera gástrica, indigestão, inflamação crônica, reumatismo, eczema, estímulo do apetite e tratamento de anorexia.

Paralelamente, contudo, desenvolviam-se vacinas e antibióticos contra doenças infecciosas, além de novos remédios com indicações mais específicas, que passaram a ser de maior interesse para a indústria farmacêutica do que aqueles com efeitos múltiplos, como os que continham extrato de maconha... Finalmente, em 1941, a maconha saía oficialmente das páginas da farmacopéia norte-americana para figurar nas páginas policiais daquele país.


...O uso da maconha foi consagrado como símbolo do pacifismo hippie e da defesa das liberdades individuais, estabelecendo-se a partir de então como um ícone da cultura pop norte-americana. Em 1980, nada menos do que 68% dos norte-americanos já haviam experimentado a maconha ao menos uma vez.

No Brasil, escravos e campesinos usavam-na socialmente no final do dia de trabalho, quando se reuniam de forma quase ritualística para relaxar em rodas de fumo... a planta era fumada para facilitar o transe místico... Mas o efeito relaxante da maconha não era visto com bons olhos por patrões e senhores de escravos. [...] O uso da maconha passou a ser combatido como vício pela elite econômica [...] e sofreu perseguição de cunho fortemente racista, e sua proibição eventualmente passou a servir de pretexto para a opressão de indivíduos de origem africana que, sobretudo após a abolição da escravatura, eram vistos pelos brancos como uma parcela perigosa da população.

* * * * *

Um aspecto que distingue a maconha de muitas outras plantas medicinais é o conjunto de efeitos mentais que seu uso provoca. As relações milenares do homem com a Cannabis certamente decorrem de estados psicológicos prazerosos associados a seu consumo, e da possibilidade de obter tais efeitos de forma rápida e transitória. A maconha em doses não excessivas geralmente provoca uma experiência de alteração mental livre de náusea, vômito, diarréia, dor de cabeça, pânico, fortes alucinações ou perda de consciência. O 'barato' causado pela maconha, embora não seja normalmente estudado por ser valor terapêutico, está associado à melhora do humor, à redução da ansiedade e à sedação moderada, qualidades desejáveis no tratamento de diversas doenças. 

Contudo, se é certo que muitos dos efeitos psicológicos da maconha estão direta ou indiretamente relacionados aos seus usos terapêuticos, também é certo que o interesse do homem por eles vai muito além da esfera medicinal. Assim, em diferentes tempos e culturas, as propriedades psicoativas da maconha têm sido utilizadas para finalidades religiosas, artísticas e recreativas.

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Um dos efeitos imediatos mais mencionados é o alívio do estresse mental e físico. [...] De forma geral, a maconha funciona como um ansiolítico, causando um relaxamento que é frequentemente acompanhado da sensação de bem-estar e euforia, muitas vezes evidenciada por longos acessos de gargalhadas. Aumentam também a sensação de paz interior e empatia, facilitando as interações interpessoais. É comum ainda a alteração na percepção do tempo, que parece passar mais lentamente. 

As emoções e percepções se intensificam, aprofundando a apreciação estética, lúdica e sensual dos sentidos. A percepção visual se enriquece, sendo marcada por cores mais vibrantes, com diferentes nuances, contornos que se destacam  com mais clareza do fundo e variações mais nítidas de luz e sombra, realçando a percepção da tridimensionalidade. Assim, elementos visuais sutis ganham vivacidade sob efeito da maconha, permitindo ao usuário enxergar com clareza texturas, padrões, formas e estruturas complexas que não lhe seriam perceptíveis sem o uso da droga.


Com relação à audição, os relatos frequentes dos usuários indicam que a maconha aumenta a acuidade auditiva, facilitando, por exemplo, a percepção de mudanças sutis de ritmos, timbres e notas musicais. É facilitada também a identificação das palavras cantadas e de cada instrumento tocado e a separação espacial dos instrumentos se torna mais clara.

[...] Sob efeito da maconha o raciocínio muitas vezes adquire mais velocidade e fluidez, resultando em associações mais flexíveis de conceitos, idéias e emoções. Além disso, imagens mentais ganham maior vividez. Se por um lado esses efeitos favorecem a criatividade e a elaboração de metáforas, por outro lado, sobretudo em usuários pouco experientes, dificultam o raciocínio lógico e objetivo.  [...] Tais alterações na forma de pensar, associadas aos efeitos relaxantes e ao aumento da capacidade imaginativa, certamente contribuem para um aprofundamento da instrospecção reflexiva.


Se por um lado a maconha diminui a ocorrência de sono REM e por extensão diminui efetivamente a oportunidade de sonhar, seus efeitos sobre a vigília são de certa forma oníricos, promovendo um afrouxamento perceptual e lógico que é descrito por muitos usuários como similar ao sonho. Vista por esse lado, a ação da maconha seria a redução do sonho noturno (night-dream) e o aumento da divagação da vigília (day-dream). Seu uso facilita o processo criativo e a geração de insights. Além de ser um poderoso estimulador do apetite, a maconha é também utilizada como relaxante ou mesmo como afrodisíaco. 

O aprofundamento geral da experiência sensorial enriquece a apreciação e produção das artes, fazendo da maconha uma droga especialmente utilizada  pelos que vivem da sensibilidade artística. Não é por acaso que o cantor e compositor de reggae Peter Tosh, líder (assim como Bob Marley) do movimento Rastafari globalizado nos anos 1970, afirma em seu hino pela legalização da maconha (Legalize It) que a maconha é usada por muitos na sociedade, como juízes e médicos, mas começa sua lista pelos cantores e instrumentistas. 

Além de favorecer a veiculação de emoções através das artes e estimular a comunicação verbal, a maconha também favorece estados de baixa ansiedade, como a contemplação lúdica, a introspecção, a empatia e o transe místico. 



alguns documentários cannábicos de alta instigância:













quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Alquimistas do Som (documentário completo) - experimentalismo na MPB



"Alquimistas do Som é um documentário sobre a experimentação na MPB. Alguns dos mais importantes músicos brasileiros comentam, em depoimentos exclusivos, suas incursões no experimentalismo: as origens, as motivações e as consequencias para a sua obra e para a linha evolutiva da MPB. Depoimentos atuais são ilustrados com musicais de Fernando Faro, além de outras imagens do arquivo da TV Cultura. Alquimistas dos Sons promove um emocionante reencontro dos artistas com imagens históricas da televisão." Com Tom Zé, Egberto Gismonti, Arrigo Barnabé, Neuzza Pinheiro, Carlos Rennó, Júlio Medaglia, Lenine, Arnaldo Antunes...


terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Coletinha de Skazeiras! Aperte o play e boa curtição...


01) pietasters; 02) mighty mighty bosstones; 03) the clash; 04) save ferris; 05) toasters; 06) tokyo ska paradise orchestra; 07) sublime; 08) rancid; 09) mad caddies; 10) big bad voodoo daddy.

Weapons of Mass Distribution! (...) Um Manifesto


A Internet é uma arma de distribuição em massa. Mas a elite econômica do planeta têm alergia e pavor diante do que representa esta "terrível" palavrinha: distribuição... O capitalismo sempre teve simpatias muito mais intensas por outra prática... a da concentração. Ainda que precise defender os privilégios dos que concentram capital através da... repressão e da destruição. Tudo aquilo que a Internet possui de mais revolucionário e mais libertário está hoje sob ameaça de perecer nas mãos homicidas dos que querem um mundo onde nada seja de graça, onde tudo seja pago e tudo tenha dono. Preferem reduzir a pó uma imensa biblioteca pública, com o pretexto de que ela não dá lucro aos que já possuim mais do que precisam, para instalar no lugar... um shopping center. 

Em Auto-de-Fé, magistral romance de Elias Cannetti, há uma cena memorável em que o protagonista, Peter Kien, em meio aos 25.000 volumes de sua majestosa biblioteca particular, exalta-se num monólogo shakespeareano diante dos livros mudos nas estantes. Sua imaginação quixotesca o faz imaginar gigantes onde há tão somente moinhos-de-vento: cada obra, transfigurada por sua fantasia delirante, aparece-lhe como que dotada de "espírito", receptáculo pulsante de uma vida condensada em palavras. Cada um daqueles volumes, parecendo-lhe ter um coração pulsando entre suas letras e frases, é uma fonte onde ele tenta encontrar a sabedoria, o diálogo, a companhia. Relembrando catástrofes há muito esquecidas pelo comum dos mortais, Kien entoa para os guardiões da "sabedoria de séculos":

"Na história de um país ao qual todos nós devotamos igual veneração... houve um acontecimento horroroso, um crime de dimensões míticas, cometido contra vós [livros] por um poderoso demônio, por sugestão de um conselheiro muito mais diabólico ainda. No ano 213 a.C., por ordem do imperador chinês Shi-Hoang-Ti, usurpador brutal que ousou arrogar-se os títulos de 'o Primeiro, o Sublime, o Divino', foram queimados todos os livros existentes na China. Esse celerado, cruel e supersticioso, era por demais inculto para compreender a importância dos livros que continham argumentos contra o seu regime despótico." (Ed. Cosac & Naify, pg, 124)

A China, em 213 a.C., não foi o único palco na História para um "assassínio de centenas de milhares de livros", como sabemos: a Biblioteca de Alexandria, ao ser incendiada pelos cristãos, também arrastou para o pó um inestimável e precioso tesouro "para sempre consumido pelo fogo". Alguém conseguiu chegar ao fim de Ágora, o filmaço de Alejandro Amenábar, sem a sensação de ter o peito transpassado por uma lança? "O horror! O horror!" O trabalho de gerações, os frutos da reflexão de centenas de poetas e sábios, trucidado para sempre e conduzido à noite infinda do esquecimento total!

Também foram reduzidos à cinza, história humana afora, muitos livros "heréticos" de livres-pensadores da Idade Média (Giordano Bruno foi até assado vivo pela Inquisição Católica...), muitos livros "libertinos" de iluministas, "avançadinhos" demais no questionamento das autoridades políticas e religiosas, e demasiado "atrevidos" em suas exaltações da desrepressão sexual... Até bem perto de nós chega este fenômeno histórico, que tanto merecia já estar ultrapassado e aposentado: o Salman Rushdie, escritor indiano, depois de publicar seu romance Os Versículos Satânicos, foi condenado à morte pelo aiatolá xiita do Irã, fulminado por uma fatwa muçulmana, perseguido por uma teocracia e seu séquito de fanáticos!... E continuamos ouvindo muita lenga-lenga sobre o tal do "progresso"...

Farenheit 451, a distopia sci-fi de Ray Bradbury, não me parece tão longe de nós: não é inteiramente implausível que se instaure em algum canto deste planeta um Estado totalitário que teria uma espécie de "Esquadrão de Bombeiros" destinado a varrer da face da Terra a informação "perigosa" retida nas bibliotecas, livrarias, revistarias... Ou um "ministério" do governo que investigaria e dizimaria todos os porões e sótãos de indivíduos muito fissurados em "cultura alternativa", e portanto suspeitos... Novas fogueiras alimentadas com zines, poemas, reportagens, manifestos... Hecatombes de servidores e sites que, na nossa realidade "cibercultural", equivalem a pequenas Bibliotecas de Alexandria. Ai! Lá vêm os vândalos incultos com seus lança-chamas! E seguram suas armas com a empáfia de quem possui um distintivo do FBI - ou do BOPE...


O agente complicador, a pedra na engrenagem dos novos totalitarismos que tentam surgir, é que, na era da Internet, se por um lado os holocaustos não necessitam de lança-chamas (faz-se tudo com o dedão descendo sobre o delete...), por outro lado o DELETE deles não consegue barrar a profusão descontrolada e anárquica do nosso COPY. Eles matam o Napster, assassinam o Megaupload, apagam contas de Rapidshare e Mediafire, ameaçam-nos com SOPAS, PIPAS e ACTAS, perseguem e criminalizam "downloadadores", mas o intercâmbio de arquivos prossegue firme e forte, abrindo vias novas quando as vias outrora transitadas são "tesouradas" pelas otôridades.

Um dos aspectos mais fascinantes da Internet é que... tornou-se impossível DESLIGÁ-LA. Não existe a possibilidade de nenhum tirano neste planeta trazer abaixo a rede mundial de computadores: não existe um "PC central", uma espécie de "Headquarters da Net", que servisse como uma espécie de Casa Branca ou Pentágono, e que bastaria destruir com um míssel teleguiado para que a conexão global caísse. Não!

Como explicam tão bem os dois documentários Steal This Film, a natureza descentralizada da tecnologia internética torna virtualmente impossível a repressão absoluta sonhada pelos tiranos totalitários: a Internet não tem centro. Cada PC é um centro. Cada PC é um replicador. Cada PC é um potencial pirata. Para matar a pirataria, eles precisariam "cortar" todos os fios desta imensa teia. Mas jamais o permitiríamos. Uma rebelião global explodiria se o tentassem. "No pasaran!" McLuhan ensina: uma vez inventada, uma tecnologia não pode ser "des-inventada"; ela incorpora-se à "condição humana", vêm somar-se às "extensões do homem", gera uma necessária reconfiguração das mídias que a precederam. A Internet veio para ficar. Cabe a nós defendê-la contra os que querem reduzi-la ao poder do dinheiro e à lei do trabuco.

Talvez os historiadores do futuro, lá em 2.250 ou 2.400, irão olhar para trás e perceber com muito mais clareza do que nós, que estamos no centro do turbilhão, que a Primavera Árabe, por exemplo, não teria podido acontecer sem a Internet. As tais das "redes sociais" mostraram ser exatamente isso que o nome sugere: não algo meramente "fantasmagórico" e "virtual", mas uma força concreta de organização social. A mídia tradicional foi chutada para escanteio diante desta nova mídia que permite que nos comuniquemos e nos organizemos sem a necessidade de um intermediário estatal ou corporativo.

Cairo, Egito - Comemoração do triunfo da Revolução de 2011

A guerra à pirataria fica mais truculenta do que nunca, mais até do que na época do "bombardeio" yankee ao Napster, justamente agora que a Internet mostra sua força de revolução social e política. Não deve ser mera coincidência... Também não me parece ser por mera coincidência que os coletivos culturais que compõe o Circuito Fora do Eixo tenham aparecido só com a popularização da Internet: o FDE e sua imensa rede, sempre em expansão, que possibilitou estes 200 GRITOS em 2012, é também um filho da net, um fruto da cibercultura, um empreendimento gigantesco que mostra o potencial imenso das redes-em-rede.

Querem parar essa força a qualquer preço. Uma nova "caça às bruxas" se inicia, e os "vermelhos comedores de criancinha" agora são... os "piratas", diabólicos e imorais ladrões da obra de sublimes e mau-pagos artistas! Reza a ladainha deles que a indústria do entretenimento passa por maus bocados, que têm tido prejuízos por causa da orgia desse troca-troca virtual. Tadinhos!

Como todo mundo sabe muito bem, os CEOs da Sony e da Warner agora mendigam pelas ruas de Bangladesh, vestidos em andrajos, fedendo a cachaça, implorando uma esmola... Os artistas na folha-de-pagamento dos grandes estúdios de Hollywood ou das grandes gravadoras multinacionais, estes também, coitados, hoje correm o risco de morrer de inanição, de tão desnutridos e esqueléticos que ficaram por culpa... da pirataria na Internet. É...

Na real, a Indústria debulha-se em prantos, chora histericamente pelo leite derramado dos lucros, feito uma criancinha mimada que, acostumada a ganhar do paizão um presente de Natal de 1 bilhão de dólares todos os anos, fica dando faniquitos de playboyzinho frustrado diante da perspectiva de um presente... de "só" uns 500 milhões...

O capitalismo de modelo norte-americano, tão obcecado com especulação financeira e lucros provindos de juros, parece não enxergar mais um palmo diante do próprio nariz: não enxerga que a Internet não pode ser "possuída" no sentido "totalitário" que eles desejam, que não há possibilidade de controle do modo como eles gostariam, que há algo de profundamente anárquico em pleno desabrochar quando pessoas fazem brotar blogs, tumblrs, torrents... Cada vez mais as pessoas vão percebendo o potencial da Internet como uma tecnologia que, mais que qualquer outra já inventada pela humanidade, permite uma liberdade de expressão impensável não só nos totalitarismos do passado, mas também nas democracias de décadas atrás. É uma nova democracia que nasce junto com a Aldeia Global. Uma outra globalização possível, menos perversa que a globalização da Tirania do Capital.

Qualquer um de vocês, que está lendo isso agora, e qualquer um dos milhões que estão fazendo outras coisas na Internet neste instante, é um potencial criador de conteúdo. Feito um vasto coração de mãe, ou um salão de festas imenso, na Internet... sempre cabe mais um. Componha e grave uma canção e encontre na Internet um palco e uma platéia. Escreva um conto e um poema, e lance-os nos oceanos da rede, como outrora faziam aqueles que entregavam às águas de um rio uma mensagem numa garrafa, e tenha a convicção de que achará leitores. Crie um movimento social, uma "causa" para militância, uma revolta organizada, e com certeza a Internet te fará encontrar pessoas com afinidades às tuas, dispostas a entrar na tua luta, comprar tua briga, somar forças contigo.

A Internet é nossa. E cabe a nós transformar essa bagaça, de tão imenso potencial, em algo que nos faça avançar para além desta tirania-do-lucro que se traveste de democracia cristã e o caralho à quatro... Cada pessoa detrás de cada PC é um não só um potencial criador de conteúdo, contribuidor do grande projeto coletivo da construção de cultura, mas têm em mãos uma máquina de cópia e disseminação. Nunca antes na história da humanidade existiu a possibilidade de "condensar" em espaços minúsculos uma quantidade tão estonteante de informação. A Biblioteca de Alexandria, se fosse inteirinha convertida para zeros e uns, caberia num pen-drive. Em breve, será a coisa mais comum do mundo que as pessoas tenham em casa HDs de capacidade mensurável em terabytes. A minha HD externa, por exemplo, que apelidei de Funésia - A Memoriosa, em homenagem ao clássico conto do Borges, guarda em suas entranhas uma quantidade de filmes, séries e álbuns musicais que seria preciso umas 7 vidas para conhecer na íntegra.

Cada um de nós possui, tendo um PC conectado à Internet, a possibilidade de acesso a uma biblioteca multimídia que centenas de gerações, por milênios e milênios atrás de nós, não conheceram. A humanidade finalmente criou weapons of mass distribution - o que se esconde por trás de siglas como .mp3, .divx e .pdf é uma fantástica tecnologia que esqueceu de ser sonhada por H.G. Wells e que possibilita a compactação de gigantescos amontoados de informação em miudíssimos recantos do espaço físico. A distribuição em massa da produção cultural humana é essencial para que nos informemos, nos cultivemos, tomemos decisões mais conscientes e sejamos menos enganados pelas tramóias, lorotas e falcatruas de políticos, publicitários, padres, papas, programas de TV e outros tiranos e ideólogos.

O poder treme de pavor, é claro, diante de uma população bem-informada, ativa, organizada, que se expressa e se une, que combina passeatas por Twitter e discute revoluções no Facebook. Uma campanha, anos atrás, comparava a arte de baixar MP3 ao "download de comunismo". Nesse ponto, acho que acertaram na mosca: o que a Internet ajuda a criar, decerto, é uma mentalidade mais comunitária do que competitiva, em que a cultura é vista como patrimônio comum da humanidade e não como posse e privilégio de algumas empresas e alguns milionários. Cada PC é uma arma de distribuição em massa de informação, de cultura, de música, de cinema, de poesia, de filosofia, de arte, do que quer que seja. E "distribuição gratuita" é um termo que faz aqueles que se sentam no topo da pirâmide social temerosos, prontos prum xilique.


Afinal de contas, o capitalismo nunca gostou muito da idéia de distribuição equânime, justiça social ou acesso universal à educação e à cultura. Querem-nos consumidores submissos e incultos, manipuláveis por propagandas escrotas, sorrindo nos templos do consumo cego, "trampando em trabalhos que odiamos para comprar um monte de merda de que não precisamos" (como diz Tyler Durden). E é só a Internet mostrar seu potencial de transformação do sistema e sugestão de novas vias, que o capitalismo-em-crise (vejam o que virou a Grécia!), tendo que encarar o duro confronto com os Occupys Wall Street que pipocam e as revoluções árabes que triunfam, apela para o último expediente da impotência:  a truculência autoritária. Que está, aliás, tão perto de nós: vejam o que o tucanato paulista vêm fazendo para lidar com a "dissidência", seja dentro do câmpus da USP ou lá em Pinheirinho.

 É só a gente quer expandir o âmbito da distribuição, sugerir que este mundo precisa de uma distribuição mais igualitária de capital, de propriedade, de moradia, de acesso a bens culturais, que os CEOs e acionistas de Wall Street fazem cara feia e soltam seus cachorros. E alguns políticos escrotos, que são praticamente paus-mandados de multinacionais, que obedecem cegamente a quem pagar mais, dão seu aval aos concentradores de capital - os 1% que roubam os 99%. E são os 1% que pagam a polícia para protegê-los da classe que produziu a riqueza que eles roubaram. A propriedade que possuem os milionários, nem é preciso ser Proudhon pra saber, é de fato um roubo. 

Mais de 30.000 crianças morrem de fome ou em virtude de doenças evitáveis TODO SANTO DIA por causa deste roubo. Isso para falar só das crianças. Isso sem mencionar os danos ecológicos ao ecossistema do planeta causados por um sistema que premia a ganância e que é gerido por ladrões que se locomovem em limusines blindadas. E é só alguém mencionar a imensa disparidade entre os que vivem na opulência e os que vivem na mendicância, e é só alguém alegar que seria preciso expropriar os exploradores e distribuir a riqueza, para que eles corram a chamem a Tropa de Choque, que avança com seu séquito de sprays de pimenta, bombas de gás lacrimogêneo, escudos e escopetas.

Neruda sabe, porém, que "poderão cortar todas as flores, mas não hão de deter a primavera!"


Nota Fúnebre: todos os mais de 800 discos outrora compartilhados aqui no blog foram DELETADOS pelo Mediafire, provavelmente por pressão do FBI nestes tempos pós-Megaupload. Eram mais de 54 gigabytes de música que foram gradativamente postos na roda durante os últimos 4 anos de trampo e que, duma hora pra outra, desintegraram. 

"o de cima sobe e o de baixo desce"
(chico science)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012


01) móveis coloniais de acaju; 02) garotas suecas; 03) karnak; 04) sérgio sampaio; 05) pata de elefante; 06) fusile; 07) orquestra imperial & rodrigo amarante; 08) skuba; 09) maglore; 10) pó de ser.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Os 3 Melhores Documentários Musicais de 2011...


por Ana Alice Vercesi


 Conhecido por transformar trechos de sua própria vida em ficções deliciosas, como “Quase Famosos” e “Singles”, Cameron Crowe foi na contramão dos outros grandes diretores que se aventuraram em documentários musicais em 2011 e decidiu registrar em vídeo a história dos próprios amigos. Esse toque pessoal, longe de comprometer o resultado, trouxe a “Pearl Jam 20” um frescor que garantiu o primeiro lugar ao filme aqui no blog.


Para quem espera uma história baseada na banda que tem em Eddie Vedder um ícone, mais do que um líder, a surpresa será grande. Primeiro porque o Pearl Jam nasceu dos restos mortais do Mother Love Bone, grupo que também era feito de um líder carismático e inesquecível: Andy Wood, que morreu de overdose em 1990. O resgate da breve trajetória e das raras imagens do MLB, cujas raízes explicam o som “grunge” que tanto caracterizou uma geração de músicos, já vale o documentário. Para se ter uma ideia, o próprio Vedder só ousou cantar uma música do Love Bone no palco na comemoração de dez anos do Pearl Jam.

A partir daí, o eixo narrativo se concentra no baixista Jeff Ament e nos guitarristas Stone Gossard e Mike McCready, que encontraram em Vedder a voz, a lírica e a intensidade que procuravam para seu som. Viram esse mesmo baixinho muito tímido, importado dos mares da Califórnia, se ambientar à cinzenta Seattle e à cena local formada por amigos de infância. Presenciaram o vocalista se agigantar nos palcos aos poucos e dominar o escopo criativo do Pearl Jam. E por fim, narra o fortalecimento da banda em meio às intempéries da linha do tempo, como as farpas trocadas com o Nirvana, a briga judicial com a Ticketmaster e a morte dos fãs no festival Roskilde.

Dos três filmes lembrados aqui, “PJ 20” é o que mais lembra uma narrativa tradicional de documentário e, ao mesmo tempo, tem aquele toque de filme caseiro, de família sentada na sala relembrando imagens que nem sabia que ainda possuía guardadas. E essa humanização só mesmo quem já passou muitas noites na sala de jantar é capaz de traduzir.


Top 3 Docs 2011, segundo lugar: “Foo Fighters: Back and Forth”, de James Moll

Espécie de flor de lótus gerada no meio do esterco que foi o fim do Nirvana, o Foo Fighters esperou álbuns e álbuns por sua redenção perante a comunidade musical. E exatamente um ano antes de sua apresentação em solo brazuca no Lollapalooza, a banda de Dave Grohl, – o até então considerado “cara mais legal do rock” – disponibilizou nos cinemas o documentário que, a reboque do aclamado recém-lançado álbum “Wasting Light”, traria o resgate de sua nada calma história.

Vamos muito, muito por partes. “Back and Forth” presta, a princípio, um serviço aos fãs mais recentes, que estão acostumados a ver as caras sorridentes do grupo e todo o sucesso atual que ele alcança, e nem imagina os sacos de sal que o povo já comeu, como as idas e vindas de Pat Smear na guitarra; a overdose do batera Taylor Hawkins; e as demissões nada amigáveis do guitarrista Franz Stahl e do baterista Willian Goldsmith. Também narra uma trajetória incrível de uma banda que surgiu de uma demo tape que Grohl gravou sozinho, ainda em meio à letargia que se seguiu ao suicídio de Cobain, e que aqueles moleques do clipe de “Big Me”, uma paródia impagável dos comerciais de Menthos, jamais imaginariam onde iria parar.

Por outro lado, é uma biografia mais que autorizada e, por isso mesmo, mantém os dentes do ex-baterista do Nirvana brilhantes na tela. Uma outra narrativa lançada em livro também em 2011, “This is a Call – The Life and Times of Dave Grohl”, do jornalista Paul Branningan, esclarece alguns desses episódios que o filme abranda um certo tanto. Apesar de fã declarado de Grohl, o autor consegue esmiuçar um pouco mais, entre outras coisas, como o baterista Willian descobriu que a banda toda estava refazendo “The Colour and The Shape” sem ele. Como Franz Stahl sacou, em 1997, o que Dave Grohl decidiu deixar em panos limpos só lá na frente, em One by One (2002): que aquela era banda dele, e ele decidiria no fim das contas como ela seria, por mais que adorasse que todos dessem ideias. E, entre todos os contratempos do mundo, os muitos e muitos “brancos” de criatividade que aplacaram o grupo em toda sua história.

Com uma discografia considerada pela crítica como bastante irregular, o Foo Fighters tem, no entanto, um mérito gigante na história da música das últimas duas décadas que “Back and Forth” ressalta com maestria: eles são pura celebração da festa que é o rock and roll, com propriedade técnica. Um moleque que cresce ouvindo a banda precisa se esforçar em um nível bem maior para tirar as músicas se comparado a outros grupos contemporâneos e, dado o seu alcance pop mundial, os integrantes indicam bandas um tanto decentes que a molecada deveria ouvir, antigas e novas. Sem contar a facilidade com que Grohl trafega pelos mais diversos gêneros, seja em colaboração com o Queens of the Stone Age, com seu projeto de heavy metal Probot ou em parcerias pelo mundo afora – sem a Roberto-Carlização que acomete Andreas Kisser, por exemplo.


Tio Martin Scorsese ganhou o terceiro lugar com sua tentativa de narrar a vida do beatle George Harrison em Living in the Material World

Em “Shine a Light”, registro ao vivo de um show dos Rolling Stones capturado por Scorsese, o diretor penou para descobrir o set list de Mick Jagger & Cia. O papel só lhe foi entregue momentos antes da apresentação começar. Uma espécie de segredo guardado longe do cineasta, um desafio para que ele rebolasse nos 30 e comandasse as câmeras sem ter muito tempo para poder preparar a equipe. E agora, nessa nova incursão do cineasta ao mundo da música, mesmo com toneladas de imagens e depoimentos, o desafio do segredo permanece.

O motivo, a princípio, é simples: uma banda de sucesso é e será sempre um segredo bem-guardado. Algo que apenas os que viveram toda a “mania” são capazes de entender e compartilhar. O próprio Ringo Starr declara isso. E Eric Clapton, uma das (tentativas de) linhas condutoras do filme, deixa bem claro que, apesar de se sentir muito amigo de George, não é capaz de dizer o quão próximos eles eram de fato.

“Living in the Material World” busca retratar os dois lados do beatle que, enquanto buscava a transcendência do corpo físico, era incapaz de resistir por muito tempo às tentações da carne. O problema é que, enquanto há centenas de imagens do rapaz na Índia, gravando mantras ou pregando a paz, pouco se revela a respeito do lado negro da força de Harrison. Paul McCartney se limita a dizer que, “como homem, ele gostava do que os homens gostavam”, e uma resignada Olivia Harrison é capaz de assumir o poder de sedução de seu falecido marido. Klaus Voorman, colega dos Beatles dos tempos de Hamburgo, assume o vício de George nas drogas e o quanto isso o consumia. Mas só.


Lágrimas de Ringo

Outro desafio enfrentado por Scorsese foi lidar com o material já existente em imagens. Nesse aspecto, o diretor mostra momentos brilhantes ao alinhar foto e vídeo em várias passagens; trabalhar com frames aparentemente banais capturados por George, seja em seu jardim, na praia ou na cozinha, e costurá-los na narrativa; e arrancar lágrimas de Ringo enquanto esse descreve seu último encontro com o guitarrista.

Apesar das inúmeras críticas em relação à falta de um narrador em off, que ajudaria a contextualizar muitos dos depoimentos (não há preocupação em saber se o espectador conhece de fato os entrevistados, e quem não tem familiaridade com a história da banda pode se perder bastante), Scorsese consegue com essa estratégia que todos tenham um peso equivalente, salvo os ex-integrantes da banda e as viúvas de Lennon e Harrison. Um peso que parece ser o mesmo que o guitarrista deu a todas essas pessoas enquanto vivia, como descreveu Clapton.

Uma das falas mais poéticas é do ex-piloto de F1 Jack Stwart, que enxergava em George a mesma capacidade de sentidos aguçados que um piloto vivencia nos momentos extremos de velocidade. Talvez a vida do autor de “Something” tenha sido isso mesmo: uma viagem supersônica com os sentidos a mil, da qual nós, sentados à beira da estrada, só tenhamos direito mesmo a ver um borrão.








DOWNLOADS (VIA THE PIRATE BAY):

"...a voice once stentorian is now again meek and muffled..."





FIONA APPLE
"Oh Well"
in: Extraordinary Machine (Jon Brion "pirate" version)


Lee Ranaldo (Sonic Youth) voando solo... intenso e luxuriante!



  
   Jimi Hendrix | Voodoo Child (Slight Return)




Fire | The Jimi Hendrix Experience (BBC Sessions)




2,571 plays



 

sábado, 11 de fevereiro de 2012

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Céu - Caravana Sereia Bloom [2012]

Vazou um dos álbuns mais aguardados da música brasileira neste 2012: Caravana Sereia Bloom da Céu, o sucessor do malemolente e viajado Vagarosa.

download

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

O fluxo da melodia e a arte do Zen (por Allan Watts)

...o Zen é mover-se com a vida, sem tentar parar ou interromper seu fluxo; é a consciência imediata das coisas à medida que vivem e se movem, diferente da mera captação de idéias e sentimentos sobre as coisas, símbolos apagados de uma realidade viva. [...]. O que quer dizer que o contato entre um fato e a resposta da mente a ele não deve ser interrompido pelo pensamento discursivo. [...]
O que foi dito é, de muitas maneiras, muito semelhante à arte de ouvir música; se paramos para considerar nossa reação intelectual ou emocional em relação a uma sinfonia enquanto esta estiver sendo executada, para analisar a construção de um acorde ou nos determos num compasso particular, perde-se a melodia.
Para ouvir toda a sinfonia temos de nos concentrar no fluxo das notas e das harmonias à medida que soam, mantendo a nossa mente sempre no mesmo ritmo. Pensar sobre o que passou, imaginar o que virá ou analisar o seu efeito sobre nós é interromper a sinfonia e perder a realidade. Toda a atenção deve ser dirigida à sinfonia e devemos esquecer de nós mesmos...

“O único efeito colateral sério da Marijuana é que você corre o risco de ser preso.” - Alan Watts (1915-1973) http://deoxy.org/w_psyrel.htm 
“O único efeito colateral sério da Marijuana
é que você corre o risco de ser preso.” - Alan Watts (1915-1973)
Conheça mais das idéias deste "guru" hippie-zen: 
http://deoxy.org/w_psyrel.htm 


sábado, 4 de fevereiro de 2012

Não Devemos Nada a Você (We Owe You Nothing)


Não Devemos Nada a Você
(We Owe You Nothing)
Daniel Sinker

por Bernardo Santana (@Barra Funda Fighters)



Fórceps você mesmo. Ou chute sua própria bunda. Esse é o único método anarquista/libertário que você vai encontrar em todas as trezentas e poucas páginas de Não Devemos Nada a Você, primeiro lançamento internacional da Ideal, que traz 30 entrevistas com figuras importantes do underground estadunidense coletadas das páginas da revista Punk Planet. E quer saber uma coisa? É o único método que importa!

Das palavras – e, principalmente, das ações concretas – de músicos/ativistas/artistas como Jello Biafra, Ian McKaye, Steve Albini, Noam Chomsky e representantes de organizações ativistas como a Ruckus Society e a Vozes no Deserto, fica uma lição principal: faça (você mesmo) o que acha certo pela sua comunidade, do seu jeito, com coragem e criatividade e você já estará contribuindo pra um progresso gigantesco de si mesmo e de quem vive à sua volta. Disfarçado de obra sobre a cena independente musical dos EUA, na verdade o livro é um daqueles poucos espécimes de obras inspiradoras. De fato, se ele não tivesse caído na minha mão (Valeu, Fred!), eu provavelmente não estaria escrevendo esta resenha agora. Nem fazendo este site. Bom, talvez estivesse… mas ainda demoraria muito!


A vontade é comprar quantos exemplares suas economias permitirem e largar por aí nos bancos de praça e de transportes públicos pra quem interessar possa. Deve ser pra isso que servem as economias, afinal! Além de um libelo pela transformação da sociedade por meio de iniciativas de quem vive nela, NDNV também ajuda a esclarecer muitos preconceitos que existem em relação às ações underground que rolam lá em cima. Não, nem todos os norte-americanos são acéfalos. Sim, ser libertário é trabalhar duro, provavelmente muito mais duro do que você precisa trabalhar pra ficar rico (ou algo que o valha…). Não, não é nada impossível começar e continuar algo relevante pra sua comunidade. E não, você não está sozinho nessa.

Aliás, muito pelo contrário. A quantidade de iniciativas e pessoas que pipocam das páginas é animadora. Vale lembrar aí que as entrevistas foram feitas de 1997 a 2007, com gente que está por aí hoje, e ainda vai estar por muito tempo, tocando, distribuindo, escrevendo, publicando, fazendo barricadas, peitando governos e dogmas irracionais e etc. Mas pra tudo isso, antes vem aquele providencial chute bem dado em seus próprios glúteos pra sair da letargia, citado ali no começo. Uma prerrogativa de cada indivíduo, e somente dele. Tudo que Não Devemos faz é pintar um alvo pra sua bica.