quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

:: os 10 melhores dos anos 60...- #09 ::

[9º]

FRANK ZAPPA
"Hot Rats"

(1969)


JAZZ FROM HELL
- por Eduardo Carli de Moraes -

Hoje Frank Zappa (1940-1993) é reconhecido como uma figura gigante no panorama da música moderna, um verdadeiro Mestre da composição, do arranjo, da guitarra e da iconoclastia cultural. Com mais de 80 álbuns em sua incrivelmente prolífica discografia, o cara tem um dos materiais sônicos mais volumosos que se conhece - e mais importante: essas toneladas de material são dignas de exploração minuciosa.

Através de sua longa e variadíssima carreira, Zappa demonstrou uma extrema versatilidade no domínio dos idiomas do pop, transitando com facilidade do rock ao jazz, da música eletrônica a trabalhos orquestrados, misturando humor escatológico, esperteza política e experimentalismo vanguardista como poucos outros artistas da música popular neste século. Aliás, ele sempre foi contra uma divisão rígida entre a música popular e a alta cultura – até porque seu gosto musical era ultra eclético. Zappa colecionava singles de rock and roll e R&B dos anos 50 ao mesmo tempo que reverenciada compositores clássicos contemporâneos como Stravinksy e Edgard Varèse.

Zappa teve uma vida pitoresca e quase engraçada (cito só meia dúzia de bizarrices): tentou estudar teoria musical numa facul da California, mas abandonou o curso depois de 6 meses; no começo dos anos 60, fez uma trilha sonora para um filme de terror B chamado O Maior Pecador Do Mundo e para um western, trampo que gerou a grana necessária para que ele construísse um estúdio em Cucamonga, California; chegou a ser acusado de conspiração para criação de pornografia (!) depois que um policial tomou posse de fitas com sex parties e passou só 10 dias (de uma sentença de seis meses) em cana. E pra que não fiquem dúvidas de que esse mago doidão da música tinha excentricidades que beiravam a loucura mais deslavada, é só ver como ele batizou sua prole. Com sua segunda esposa, Zappa teve quatro filhos, que ganharam os singelos nomes de Moon Unit, Diva, Dweezil e Ahmet Rodan. Quer mais?!?

Perfecionista ao extremo, Frank Zappa requeria dos membros de suas bandas uma “técnica intimidora”, o que ajudou a revelar ao mundo excelentes músicos, como o guitar hero Steve Vai e o fundador do Little Feat, Lowell George. Zappa também demonstrou inovações consistentes em tecnologia instrumental e de estúdio, experimentou com praticamente todos os estilos de música, inclusive música clássica, com uma versatilidade igualada por poucos nomes musicais do século 20.

Conta-se que Zappa chegava ao fim dos anos 60 “frustrado” com as vendas de seus discos, que nunca chegaram a ser sucesso comercial, e com problemas para sustentar sua banda de apoio, a Mothers of Invention, com quem tinha gravado alguns instigantes álbuns como Freak Out! (de 1966, disco que acabou perdendo dinheiro) e We’re Only In It For The Money (de 1967, uma selvagem paródia do Sgt Peppers dos Beatles onde Zappa fazia miséria com o ideário hippie).

Alguns críticos acusavam Zappa e os Mothers of Invention de serem nada além de uma piada cínica, escatológica e monumental, mas “Zappa não mostrava o mínimo desconforto em assumir duas personas aparentemente contraditórias: o debochado provocador e o compositor sério (cuja estatura de fato iria aumentar através dos anos e cujo culto sempre permaneceu intenso)” – como diz a Enciclopédia do Rock da Rolling Stone (pg 1106). Num ato de radicalismo que não é estranho a esse excêntrico gênio do rock moderno, desfez sua banda e refugiu-se no estúdio com novas companhias para gravar aquele que se tornaria um de seus discos mais notáveis: o monstro de jazz-rock dos infernos que é esse Hot Rats.

Acompanhando-o nessa jornada estavam seu velho amigo Captain Beefheart (que canta “Willie The Pimp”, única música com vocais do disco), o multi-instrumentista francês Jean Luc Ponty (que em 1970 lançaria o aclamado King Kong, só com composições de Zappa), o violinista Don ‘Sugarcane’ Harris e ainda Ian Underwood (que já havia colaborado com Zappa em Uncle Meat).

Hot Rats une radicais improvisos em que os saxofones e as guitarras endoidecem loucamente, em um pandemônio que lembra o free jazz de Ornette Coleman e Peter Brötzmann (“Gumbo Variaton” a mais incrível delas), com canções mais palatáveis e digeríveis (“Peaches Em Regalia”). Este álbum já prenuncia o trabalho de outro grande mestre do crossover entre as facetas mais radicais do rock com o jazz, John Zorn, que décadas depois marcará época fazendo o hardcore mais agressivo usando saxofones como tática de ataque. O Funhouse dos Stooges, um dos mais originais álbuns punk da história, também não existiria sem Hot Rats.

Neste álbum, provavelmente o melhor de sua carreira nos anos 60 (apesar do impacto cultural maior de Freak Out!), Frank Zappa está no cume de sua genialidade. Ele prova para qualquer cético o quanto ele tinha de inventividade musical em sua fusão de jazz e rock – e quanto era um guitarrista fudido de bom e com um estilo próprio bastante fresco e original. Em 6 músicas, três delas passando dos 9 minutos de duração (“Gumbo Variation” bate nos 16!), Zappa passeia com segurança, confiança e muito groove por esses 47 minutos de música brilhante - que consegue soar sofisticada e empolgante, ao mesmo tempo, o que não é coisa das mais fáceis de atingir. Não há nem sinal do deboche zappiano clássico, já que Hot Rats é um dos “discos sérios” da carreira do compositor, onde a sátira e as piadinhas escatológicas saem completamente do quadro, deixando subsistir somente som – e que som!

* * * * * *


“A genius of the guitar and a great producer and composer, Zappa left an immense musical legacy to be explored, much still hidden and all illuminated by a intellect that was lyrical and farsighted, when it was not obscured by its polemic trait. He had almost a philosophical attitude to music, the absolute liberty of being and playing without barriers or boundaries. Radical sounds were sewn into musical contexts never touched on by other pop musicians, in a sort of stylistic nomadism across all the territories he defined “conceptual continuity”; pop melodies were woven into jazz and virtuoso instrumentals; sequences of sounds and fragments of conversation were attached to extraordinary music. Zappa painted panoramas that surpassed sound to become culture.

(...) Zappa’s concerts with the Ensemble Modern in 1992 were a real event for the conservative world of classical music. A rock composer spearking in the tongue of the classics and proposing a sort of fragmentary yet coherent “suite”, using a quite personal linguistic crossover (linked to both his previous 30 years of work in rock and to the development of classic post-Schoenberg language) was not a common or easily digestible event. The Ensemble’s immaculate rendition empowers Zappa’s skill for constructing scores, and allows the referenced substrata to emerge – Webern, Stravinsky, Ligeti, Varèse, Bartok – as 20th century classical music as read and experienced through the Zappa composition. These final compositions may not be the favorite listening of those who prefer Zappa’s histrionics as a satirist, or his fluid, errant guitar solos, but they are definetely worthy products that delve into the depths of the restless soul of a musician who was totally immersed in such a complex century.” (ASSANTE)

DOWNLOAD (mp3 de 192kps - 63 MB - 6 faixas - 47 min):
http://www.mediafire.com/?4j2ame9mgvm

Um comentário:

Unknown disse...

Deletado, champs! Sucesso!