quinta-feira, 27 de março de 2008

segunda-feira, 24 de março de 2008

:: Zombies ::

THE ZOMBIES
Odessey & Oracle
(1967-68)


SAFRA MÁGICA
Num ano maravilhoso para o rock, The Zombies fizeram uma obra-prima sofisticada e acessível

por Sérgio Barbo (sessão "Discoteca Básica" d'uma Showbizz antiga)


O lisérgico ano de 1967 foi um dos mais inspirados na história do rock. Younger than Yesterday (dos Byrds), Sgt. Peppers (dos Beatles), Forever Changes (do Love), entre outros álbuns clássicos, são dessa safra. A obra-prima de um grupo menos badalado, porém muito peculiar e influente, The Zombies, também data desse mesmo período dourado. Pop e acessível, Odessey and Oracle é mais um na lista dos discos à frente de seu tempo e de difícil classificação até hoje. Seria protoprogressivo, pop barroco ou mersey-beat (a batida dos Beatles) psicodélico?

Tudo isso e mais um pouco tinha começado a ser engendrado cinco anos antes em St Albans, Inglaterra, pelo tecladista Rod Argent, o guitarrista Paul Atkinson, o baixista Paul Arnold (logo substituído por Chris White), o baterista Hugh Cundry e por Colin Blunstone, que quase foi recusado como vocalista por estar com o rosto repleto de hematomas no primeiro ensaio. Apesar de péssimo desportista, Blunstone tinha garganta apurada e sua voz de garoto de coral mais o teclado quase erudito de Argent se tornaram a marca registrada dos Zombies.

Misturando batidas de jazz, rhythm & blues e mersey sound, os singles “She's Not There” (em 1964) e “Tell Her No” (em 1965) fizeram sucesso na Inglaterra e mais ainda nos EUA, onde alcançaram o topo das paradas. O grupo então se tornou referência essencial para os americanos.

O ápice veio em 1967 com esse segundo álbum. Música pop com rara sofisticação (composta por Rod Argent e Chris White) e letras bem construídas abordando temas pessoais e políticos (como o horror das Guerras Mundiais). Tudo com melodias luminosas e harmonias vocais singelas, embaladas por arranjos de cordas, sopros e cravo.

Fazer um disco de nível tão elevado não poderia nunca ser fácil. E teve como consequência o desgaste das relações entre os integrantes. Resultado: a obra acabou sendo lançada após o fim do grupo, em dezembro de 1967. Ironicamente, “Time of the Season” foi um estrondoso sucesso dois anos depois nos EUA, promovendo um reinteresse pela banda. Propostas vultuosas de retorno foram declinadas por Rod Argent, pondo fim, assim, a uma banda que tornour transitável a ponte entre o simples e o elaborado, entre o pop e o progressivo.

DOWNLOAD (mp3 de 192kps - 55MB):
http://www.mediafire.com/?gwtdgnb2e91

domingo, 23 de março de 2008

:: primeiros grandes discos de 2008 (pt 1) ::

Começaram a sair os 1os biscoitos finos de 2008. Entre eles...

SUPERGRASS - "Diamond Hoo Ha" (87 MB):
http://www.mediafire.com/?xdcjmgzgbjy


BLACK CROWES - "Warpaint" (88 MB):
http://www.mediafire.com/?eky1tgkujgd



VAN MORRISON - "Keep It Simple" (64 MB)
http://www.mediafire.com/?etikvwhbyzz

sexta-feira, 21 de março de 2008

:: Temple of the Dog ::

:: TEMPLE OF THE DOG [1991]

"
O álbum lançado pelo Temple of the Dog é único em todos os aspectos. Talvez nunca houve, na história do rock, um episódio de reunião entre duas bandas que tivesse sido tão bem sucedido quanto nesse álbum. A motivação ao fazer o disco era de prestar tributo ao amigo Andrew Wood, não havia pressão de gravadora, interesses comerciais, ou mesmo prazos para lançamento. O espírito das gravações era o de amigos fazendo música. Os ensaios do Temple of the Dog aconteciam à noite, enquanto que à tarde, Stone Gossard e Jeff Ament ensaiavam em seu novo projeto, juntamente com Eddie Vedder e Mike McCready, o Mookie Blaylock que mais tarde viria a ser o Pearl Jam. Aliás, a história do Temple é marcada por pequenas coincidências. Quando Chris Cornell procurou Stone e Jeff para mostrar a demo de Say Hello 2 Heaven e Reach Down e apresentar a idéia, Stone e Jeff estavam trabalhando em uma demo junto com McCready e o baterista Matt Cameron (baterista de qual banda? Soundgarden!) Matt imediatamente se tornou o baterista do Temple of the Dog. Essa fita demo que Stone e Jeff estavam fazendo circulou pelo circuito underground da costa oeste e chegou as mãos de um surfista de San Diego: Eddie Vedder!! Eddie compôs as letras para as músicas da demo e foi para Seattle bem na época em que eram feitas os ensaios do Temple of the Dog, e assim ele soube do projeto, acabando por completar a formação da banda, cantando em 'Hunger Strike' e fazendo backing vocal em mais 3 faixas. (...) O disco, lançado em 1991, teve uma vendagem modesta até a metade de 1992 quando a gravadora A&M resolveu divulgar o Temple of the Dog após o sucesso do Pearl Jam. O álbum entrou na parada da Billboard e atingiu o top 10, chegando a marca de 1 milhão de cópias no fim do ano." Alexandre Luzardo, na DYING DAYS.

DOWNLOAD (mp3 de 192kps - 11 músicas - 96MB):
http://www.mediafire.com/?5tirmh1bxmz

domingo, 16 de março de 2008

:: os 10 melhores dos anos 60...- #05 ::

[5º]

VAN MORRISON
Astral Weeks
(1968)



MYSTIC RIVER OF SOUND
- por Eduardo Carli de Moraes -


Chega a ser inacreditável que tamanha obra-prima tenha nascido da alma de um jovem irlandês intratável de apenas 23 anos de idade – o garoto prodígio que demonstrou, no correr dos anos, ser uma promessa plenamente cumprida, Mr. Van Morrison... Famoso por seu temperamento arisco, por sua postura de “eremita”, por suas raríssimas entrevistas concedidas e pelas enrascadas em que entra tentando explicar o sentido das próprias letras, o cara, com a discrição que lhe é própria, marcou época na música da 2a metade do século passado como poucos. “Sua influência entre os cantores-compositores de rock não tem rival algum a não ser aquele outro gênio legendário, Bob Dylan“, sugere a Enciclopédia do Rock da Rolling Stone, que comenta ainda que ecos de sua poesia vigorosa e seu estilo vocal fervoroso e apaixonado podem-se ouvir em ícones posteriores que vão de Bruce Springsteen a Elvis Costello, “enquanto a incansável musa do artista irlandês manteve-o prolífico e interessante até os anos 90”. Beck e Jeff Buckley são outros dos graúdos que nunca esconderam o quanto o estilo vocal de Morrison os influenciou como cantores.

Van Morrison, nascido em Belfast, Irlanda do Norte, em 1945, tornou-se uma das figuras cult mais fascinantes da história do rock. Difícil achar que rótulo se enquadra melhor a ele, que era ao mesmo tempo um cantor folk, um potente berrador de blues, um aficcionado pelo jazz, além de ter um background musical lotado de canções folclóricas irlandesas e temas gospel. Antes de Astral Weeks, primeiro álbum clássico de Van Morrison, e o maior de todos eles (apesar de ser uma boa briga contra Moondance pelo título de Disco Mais Perfeito...), Van Morrison estava longe de se um desconhecido. Morrison já tocava com bandas irlandesas desde sua adolescência e já tinha começado a marcar a história da música pop com sua primeira banda de power-blues, o Them. E já havia composto dois singles de sucesso – “Gloria” e “Brown Eyed Girl”.

Mas nada preparava o mundo para a chegada deste álbum, que se tornaria objeto de culto através de todas as décadas que seguiram (e seguirão...) e é até hoje considerado por críticos de renome uma das maiores obras-primas da história do rock. Morrison o gravou em 2 dias apenas, acompanhado por numerosos músicos de jazz a quem dava instruções mínimas, deixando-os entregues a improvisos tipicamente jazzísticos.

Astral Weeks é um daqueles itens de culto intenso principalmente por parte dos críticos de rock e demais entendidos, enquanto o público em geral, muitas vezes, desconhece qualquer outro Morrison que não seja o mais famoso deles – Jim, do The Doors, que obviamente não tem nenhum parentesco com seu xará-de-sobrenome Van. O grande Lester Bangs, por exemplo, chegou ao ponto de, numa frase bombástica muito própria sua, chamar Astral Weeks de “o disco de rock mais importante na minha vida até hoje” (era 1979), e, após comentários auto-biográficos sobre um certo período de fossa que estava passando, arrematou com ótimas percepções sobre o álbum:

“...ele [Astral Weeks] assumiu na época a importância de um farol, uma luz nas praias longínquas das trevas; e mais, era uma prova de que havia ainda algo a ser expressado artisticamente além de niilismo e destruição. (...) Parecia que o sujeito que compôs Astral Weeks sofria de uma dor terrível, uma dor que os discos anteriores de Van Morrison haviam apenas sugerido; mas, como os últimos álbuns do Velvet Underground, havia um elemento redentor na escuridão reinante, uma compaixão suprema pelo sofrimento dos outros e um raio de pura beleza e estupefação mística envolvendo o coração da obra.” (Reações Psicóticas, pg. 22).

Outro excelente crítico musical, o inglês Simon Reynolds, comenta que “o álbum é uma visão, tanto exultante quanto atormentada, do paraíso perdido e talvez, só talvez, reencontrado”.

“De todos os artistas a emergir da era psicodélica e de seu legado, Van Morrison e o Pink Floyd são os mais fixados na nostalgia do Éden. (...) Suas canções reiteram de maneira obsessiva imagens árcades: ‘a criança virgem descalça’; vagar por jardins opalescenetes de chuva nevoenta; saciar uma alma sedenta com água pura da nascente; estar envolto na ‘tranquilidade do silêncio’... E, assim como a poesia de Morrison exalta iridescência e fluidez, sua voz e música personificam tais qualidades. Seu vocal scat-soul é um riacho de fala ininteligível; a música é uma corrente borbulhante, repleta de curvas folk, jazz, blues e soul, cheia de espirais e redemoinhos, cintilizações e manchas solares sob os cílios.” (in: Beijar o Céu)

Essa “saudade do Éden” fica clara no ambiente emocional que besunta todo Astral Weeks (“o reconhecimento da inalterável falta de um lar e a luta contra isso” é a essência do melhor trabalho de Van Morrison, diz M. Mark). Poucos momentos são mais emblemáticos disto do que quando Van canta: “i’m nothing but a stranger in this world / i’ve got a home on high...”. A mistura da melancolia por não ser nada nesse mundo a não ser um estranho, e a esperança radiosa do reencontro futuro de um Lar, é o que torna essa canção – e o álbum em geral... – um originalíssimo e estranho mélange de tristeza e luz, de angústia e radiação, algo que nos sentiríamos tentados a chamar, usando a expressão de Victor Hugo, de melancolia feliz...

Simon Reynolds, grande intérprete da obra, nota, por exemplo, que “em ‘Beside You’ Morrison deseja ansiosamente a proximidade absoluta, o êxtase sem estranhamento da intimidade pura, que talvez só seja experimentado mesmo no peito materno ou na suspensão envolvente do útero. Ele anseia ‘nunca, nunca se perguntar por quê’ e voltar ao reino de onde dúvida e medo foram banidos”.

Astral Weeks é uma das obras mais profundamente espirituais já a dar o ar de suas graças no reino vastíssimo disso que chamamos de “música pop”. Dentre os álbuns clássicos dos anos 60, este é o que se encontra mais distante do espírito da cultura de massas e da reprodutibilidade técnica espantosa que é marca da indústria fonográfica na época. Apesar de ser possível, como tentou fazer o Lester Bangs, sugerir que Astral Weeks é também o produto de uma era (a ressaca que chega batendo forte depois da orgia prolongada dos anos 60), o disco é frequente e insistentemente descrito com o adjetivo, extremamente adequado, de atemporal.

As “preocupações espirituais” de Van Morrison sempre estiveram em primeiríssimo plano em sua carreira, relegando todo o resto a um status secundário. Fama, grana e groupies nunca pareceram dizer muita coisa para ele. Valia muito mais a pena “esquadrinhar o trabalho de místicos, videntes e poetas em busca de pistas” que apontassem para o tal do Éden perdido – como nota muito bem Simon Reynolds. Em suas músicas o ouvimos sailing into the mystic e “procurando por algum tipo de fé que lhe permita sentir-se em paz onde estiver”.

Essas temáticas ditas “místicas” não estão presentes somente neste álbum, mas impregnam e atravessam toda a discografia do cantor no anos 70, como comenta Simon Reynolds: “Seus álbuns de meados dos anos 70 são atormentados por um sonho com a Caledônia, ‘uma terra antiga, que soa como um lar para ele, uma terra onde seus ancestrais começaram tudo de novo e onde gaitas de fole deram à luz o blues’, nas palavras de M. Mark. A Caledônia tem a mesma função mística na cosmologia de Morrison que Sião ou a Áfria tem para os rastafáris ou a ‘velha terra dourada’ tem para a Incredible String Band: é um reino afortunado, onde a inimizade foi abolida e todos os homens são irmãos.”

O sucesso comercial não veio, até porque Astral Weeks era um disco excessivamente contemplativo, intenso e original para que pudesse ser tocado para vastas multidões (com exceção de canções mais palatáveis e radiáveis como “Sweet Thing” e “The Way Young Lovers Do”). Mas a gravadora Warner sempre considerou Van Morrison como um artista de longo prazo, que teria uma longa carreira ao invés de um compositor de singles explosivos. Era apenas o começo de uma brilhante, longa e prolífica carreira com um disco impressionista, fascinante, hipnótico, mesmerizing...

Mais que um disco, Astral Weeks é quase um documento de uma viagem mística, de uma jornada astral em domínios bem acima da terra... O som que faz uma alma em peregrinação por vários estágios do espírito, buscando a salvação, penando e gemendo por ela... O que faz com que Astral Weeks seja um álbum tão especial, tão peculiar e tão atemporal na história da música é essa espécie de halo de luz que parece circundá-lo. Se um disco pudesse ser um anjo com uma auréola dourada reluzente sobre a cabeça, esse disco seria Astral Weeks.

DOWNLOAD (mp3 de 192kps - 74 MB - 8 músicas):
http://www.mediafire.com/?3zygianrva5

sábado, 15 de março de 2008

:: criaturas da indielândia ::




:: CIDADÃO INSTIGADO, "E o Método Tudo de Experiências"
por ALEXANDRE MATIAS (originalmente publicado no Trabalho Sujo)

Levada de conga e violão nordestino começam, sedutores, a tentar uma certa aproximação. "O que é que tu quer de mim? Que voz é esta?", pergunta, carregada de seu característico sotaque cearense, a voz do guitarrista e vocalista Fernando Catatau, líder do grupo Cidadão Instigado, acompanhado do assobio sinistro de um teclado retrô. "Que silêncio é este? Por que tu não fala o que estais pensando? Não quero estar recuando o meu sentimento, a minha alegria. Eu sinto que você está chegando mas se recusa a aceitar". O som desenha um boteco mal freqüentado, à meia luz, TV ambiente ligada ao fundo só para dar uma mínima sensação de vida, ainda que apenas úmida e viscosa. O pano sujo sobre o balcão, o copo solitário de cerveja, o display para maços de cigarro vazio, a mesa de lata riscada com nomes, palavrões e datas, os azulejos que um dia foram brancos. Tudo inspira o desespero de uma latinidade decadente, caixas de cerveja amarela usadas para esconder o mofo da parede dos fundos. Não dá pra saber quem é o predicado da canção: uma pessoa, um vício, a própria identidade.

Uma guitarra elétrica crua, sem efeitos especiais (a imagem que me vem à cabeça são aqueles velhos amplificadores Giannini, com botões do tipo "tremolo" e "vibrato"), corta o ar ativando baixo e bateria em um melancólico e quase almodovariano bolero, fazendo a consciência do protagonista - provavelmente em algum ponto entre a ressaca e o arrependimento, mesmo ainda sendo noite - tornar-se a banda mais triste do mundo, nos colocando em algum ponto entre "Amarelo Manga" e "Um Drink no Inferno". "Acho que estou te esperando", entoa quase inocente, num refrão que sorri, serviçal, por mais uma chance, "o que você talvez já saiba. É, você pode estar certa, talvez não valha apenas dizer mais nada. Mas eu te espero mais perto, estou morrendo e tenho medo de só pensar em você. Te encontra logo com a distância antes que ela te dizer que já é tarde demais".

E sem sermos perguntados estamos no meio de Cidadão Instigado e o Método Tufo de Experiências, tributo a todos os tipos de conflitos pessoais pelo qual Catatau e companhia nos conduzem em seu segundo disco. Terceiro, se contarmos a primeira e pouco ouvida demo, CDzinho de cinco faixas que poucos privilegiados tiveram o prazer de desfrutá-lo ainda em 1999. Ainda no Ceará, a banda dava a ignição em uma inesperada cruza de jazz rock com trovadorismo nordestino e tempero de rádio AM. Longe de apocalipses mais ao leste, de artistas como Cordel do Fogo Encantado, Zé Ramalho e Cabruêra, a intensidade épica do Cidadão vem do apreço dos músicos por seus instrumentos (parente, enviesado, do Cordel de Lirinha, que, optam pela estrada acústica e percussiva, enquanto os cearenses seguem a trilha elétrica e harmônica) que culmina no amor de Catatau por seu instrumento. Imerso entre Johns McLaughlins, Daves Gilmours e Lannys Gordins, a guitarra de Fernando é setentista por definição, virtuosa por natureza e tortuosa, primeiro sentimentalmente, depois como manifesto.

A guitarra torta e passional do Cidadão Instigado por excelência acaba funcionando como metáfora para o disco, tanto em termos temáticos quanto instrumentais. O Método Tufo é um disco sobre o estranhamento, partindo do ponto de vista mais evidente quando se trata do líder do grupo: o fato de ser, na prática, mais um nordestino em São Paulo. Usa diferentes ângulos para mostrar como é se sentir alheio à normalidade em uma cidade cuja normalidade parece imitar a morte, insistindo na fórmula, na aparência, na passividade, na submissão.

Musicalmente, aponta para o quarto de empregada e para a coleção de discos do tio hippie. O tom ao mesmo tempo sóbrio e sombrio que aquela guitarra impõe à qualquer intervenção que se proponha. Tanto que já tocou ao lado da Nação Zumbi, do Hurtmold e do Los Hermanos, sempre impondo seu estilo pessoal, seu timbre agudo e dedilhado torto, nunca alheio a cena alguma. E é justamente sobre o fato de os outros lhe considerarem alheio que começa o discurso que prevalece em todo o álbum.

"Quem pode explicar a razão de pinto de peitos ter nascido com o bico preto? Talvez Deus tivesse um motivo ao perpetuar este ato por mais que pensem ser um defeito", pergunta em "O Pinto de Peitos", "um defeito de Deus é sempre perfeito". "Eu não sei o que falar sobre as estrelas que povoam o meu céu, que brilham e brilham, mas não me dizem nada", canta na bêbada "Noite Daquelas".

"Fale para mim, por que eu lhe incomodo tanto? Será que são as minhas sobrancelhas grossas ou serão as minhas tortas? Será que a minha voz fanha polui a tua sonoridade sobre-humana?", ironiza feliz por saber como a música termina, em " Apenas um Incômodo", "ou será simplesmente por que eu me aceito assim e até gosto de mim? Eu sei que eu sou meio empenado e até um pouco desafinado. Mas eu não escondo e não me engano e se você me chamar de paraíba ou baiano não vai me soar estranho!".

A música continua mas logo perde seu tom dócil e volta à tensão inicial do disco encarando o ouvinte. "Pois eu sei que aos teus olhos/ Eu sou apenas um incômodo/ Que veio do nada para empestar o mundo", a voz denuncia que o clima da canção mudou, descambando para um instrumental cáustico que aponta para trios tão diferentes quanto Jimi Hendrix Experience, Built to Spill e a banda que acompanhava Arnaldo Baptista no disco Singin' Alone. "Mas escute/ Eu que vim do nada/ Não tenho encantos, nem correntes/ Só tenho um sonho que é só meu/ E duas palavras para dizer neste instante: ME AGÜENTE!".

O progressivo é outra assinatura musical do grupo e não é só a marcha "Os Urubus Só Pensam em Te Comer" que remete ao Pink Floyd (especificamente, o biênio 78/79). Ela é apenas uma das músicas que citam bichos ("Todas as vacas estão velhas/ Todas as vacas estão quase lá/ Todas as vacas estão loucas/ E abatidas em seu leito de morte" - as vacas, como os Animals de Roger Waters, chegam até a mugir) e cujo clima tenso e desconfiado é repetido, à prog-blues como o velho Floyd, dentro de qualquer gênero musical que aparecer: rock pesado (em "Calma!"), música latina ou gangsta rap (na mesma "O Pobre dos Dentes de Ouro", ótica), reggae ("Apenas um Incômodo"), cantiga de lavadeira ("Chora, Malê", que começa elétrica, cai para o folclore e termina ambient, vazia, ecoando batida policial - perfeita) e shuffle de beira de estrada ("Noite Daquelas", cômica e crônica)

O holofote central no entanto, divide-se entre a faixa de abertura ("Te Encontra Logo...", comentada no início), a balada ("O Tempo") e a belíssima "Silêncio na Multidão". "O Tempo" é, de longe, a melhor música do disco - uma letra amarga e madura, conformada com a idade, que não funcionaria lindamente tanto no repertório de Roberto Carlos, Odair José, Caetano Veloso, Nervoso ou Mombojó. "Mas o tempo é um amigo preciso que fica sempre observando aquele instante em que alguém tentou se aproximar", canta, em falsete, acompanhados por vocais de apoio de sonho. O desabafo falado de Catatau é daqueles momentos que nem é bom tentar passar pro texto para não perder toda sua magia atemporal. "Às vezes choro pois sei que não posso deixar que o passado invada meu mundo", isso tocado ao vivo deve ser fodaço, mesmo sendo intensamente e desavergonhadamente brega.

Já o épico "Silêncio na Multidão" é um exercício de hipnotismo jazz-funk que, disfarçada de crônica social. "Aqui estou eu, há meia hora parado no cruzamento da Brigadeiro Luís Antônio com a Avenida Paulista", narra falando, fingindo-se bardo, sobre uma monótona cadência reminescente instrumental Doors. "Interessante, né? Todos os dias em milhares de lugares milhares de pessoas se cruzam, mas não se falam, pois não se conhecem e nem ao menos se importam com isso. Mas é apenas um jogo de espelhos e, mais adiante, ele finge ver "um mendigo barbado" que "simplesmente pára e grita um grito de liberdade para a multidão, pois ele não agüenta viver sozinho na escuridão". O grito do mendigo (a imagem que o próprio Catatau, ele mesmo barbado, imagina que os outros façam dele) é não só todo o Método Tufo como um refrão emblemático e cético, que vem logo a seguir.

"Eu vejo as pessoas que passam por mim, que falam, que ralam, que gritam em agonia e solidão", canta emocionado, "dói no coração ver meu povo silencioso". O solo bluesy ressurrecta o mesmo timbre de uma das peças centrais do primeiríssimo disco, a demo de 99, a instrumental "Poeira". A crítica é simples: a lógica da cidade grande está matando o melhor do brasileiro. E o disco acaba funcionando como o grito do mendigo. Ele não pede para pararem o mundo - ele já desceu e chora por nós.

O que mais impressiona no disco, além de seu fio condutor progressivo, é a sua sintonia com o momento robertocarlista que vivemos. Mais do que qualquer outro contemporâneo seu, Fernando Catatau insiste em uma linha evolutiva que vai para longe da fila bossa nova, Tropicália, canção de protesto, MPB ou o vasto cânone do samba desintelectual. Tateia por um universo passional e adulto, longe da rebeldia ou do prazer, da saudade e do êxtase, da miséria física, social ou espiritual. Trilhando os passos do Rei, ele faz o ponto de intersecção entre o "Prato de Flores" da Nação Zumbi e a indiesmo MPB do Los Hermanos, passando por aquele velho rádio de estante que o dono do bar deixou ligado depois que o jogo acabou e que, de repente, começou a tocar aquela música...

DOWNLOAD (192kps - 69MB - 10 músicas - 50min):
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quarta-feira, 12 de março de 2008

:: Kyuss ::


KYUSS
"Blues For The Red Sun” (1992)

O SOM ESCALDANTE DO DESERTO CALIFORNIANO
Rock pesado e viajandão, guiado por uma guitarra malandramente ligada num amplificador de contrabaixo: ainda não inventaram nada parecido com Blues For The Red Sun, álbum definitivo do Kyuss

- Por José Fávio Júnior,
na Showbizz de Julho de 2001
(seção “Discoteca Básica”)

O Velvet Underground foi um grupo que, durante seu pequeno período de existência, passou quase batido. Hoje é referência para 9 entre 10 artistas indie/lo-fi. Disse um crítico americano que o Kyuss é o Velvet Underground de sua seara. Só poderemos comprovar daqui umas duas décadas, mas a tese é boa.

Formada na cidade californiana Palm Desert, a banda durou cerca de 6 anos (1990-95) e lançou 4 álbuns. A época é relativa à adolescência do guitarrista Josh Homme, que fundou o Kyuss na tenra idade de 16 anos, ao lado do baixista Nick Oliveri (que tinha 17), do vocalista John Garcia e do baterista Brant Bjork (hoje no Fu Manchu). Ele teve a puberdade dos sonhos de qualquer jovem roqueiro: terminou o colegial, viajou o mundo tocando, foi chamado de deus e, quando o lance ficou repetitivo e chato, saiu do mundo do rock, entrou na faculdade e arrumou um emprego de adulto. (Mais tarde, graças às pressões dos chapas do Screaming Trees, com quem ele tocava esporadicamente, Josh montou o Queens Of The Stone Age e se deu ao luxo de convidar Mark Lanegan, ex-vocalista do ST, para integrar seu grupo – o convite foi aceito em maio de 2001.)

Foi na turnê do álbum de estréia, o cru Wretch, que a banda conheceu seu quinto membro. Chris Goss, ex-integrante da seminal Masters Of Reality, chapou com a performance e se tornou o responsável por toda a produção do Kyuss. Aquele hard rock, ora bem lento, ora bem rápido, com muito groove e quase sempre viajandão, precisava de alguém que soubesse fazer o solo tremer na mesa de som.

Josh plugava sua guitarra Ovation UK II preta num amplificador de baixo, a afinava o mais grave possível, pisava no fuzz e saía compondo riffs turbinados com a urgência de um garoto que acabara de tirar a habilitação para dirigir. É por isso que a sequência inicial de Blues For The Red Sun, com “Thum, “Green Machine”, “Molten Universe” e “50 Million Year Trip (Downside Up)”, cheira a estrada empoeirada. O grupo, que no início de carreira (quando se chamava Sons of Kyuss) promovia grandes festas no meio do deserto californiano usando geradores, onde tocava por horas a fio, transporta o ouvinte para esse ermo. Quente, seco, duro. Mas com um suingue atmosférico quase sensual, culpa do baixo do então cabeludo e desbarbado Nick Oliveri – substituído por Scott Reeder na turnê do disco. “50 Million...” é o maior exemplo: um rock que dá vontade de balançar a cabeça e a cintura ao mesmo tempo. Depois dela vem a filosofia de “Thong Song”. “Meu cabelo é compridão / Nenhum cérebro, só músculo / (...) Eu odeio música devagar”, canta Garcia, sem a menor culpa, como que sorvendo goles de cerveja entre os versos. Das 14 faixas, apenas oito possuem letra. Existe uma preocupação muito grande com o instrumental, vinhetas e introduções, como acontece em “Freedom Run” (7 minutos e meio de psicodelia e “lesação”).

Dave Grohl,. Billy Corgan, Mellisa Auf Der Maur e muita gente boa da cúpula do rock bota Blues For The Red Sun entre os dez discos da vida (há os que preferem o abusado Welcome to the Sky Valley, com suas três suítes musicais, cada uma dividida em várias partes). Um pouco da magnitude do Kyuss pode ser medida pela qualidade das bandas que excursionaram junto: Faith No More, Smashing Pumpkins, Ween... Ver Josh tirando aquele som lindo era (e sempre será) uma experiência mais do que incandescente.

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terça-feira, 11 de março de 2008

:: Dead Kennedys ::

:: DEAD KENNEDYS – “Fresh Fruit for Rotten Vegetables” (1980)
por André Barcinski (Showbizz / Março de 2000)

Nos EUA de Ronald Reagan, era preciso peito para batizar uma banda de Kennedys Mortos. Imagine alguém entrar numa loja no Brasil e dar de cara com um disco da banda Fernadas Montenegros Esquartejadas ou Algozes do Frei Damião. O choque seria o mesmo. E Jello Biafra queria mesmo chocar. Quando ainda era conhecido por Eric Boucher, o rapaz já era revoltado: contra o governo, contra os direitistas, os militares, os yuppies, a sociedade de consumo, o rock.

Depois que se mudou para a liberal São Francisco, no fim dos anos 70, Eric resolveu expelir todo esse ódio em forma de música. O resultado foi o Dead Kennedys. Seu primeiro LP, Fresh Fruit for Rotten Vegetables, caiu na cena californiana como uma bomba atômica. Até então o punk americano tinha tradição de bandas festeiras, tipo Circle Jerks e Ramones. Política não era o forte. Não havia um Clash ou um Sham 69 na terra do Tio Sam.

Mas Jello e seus colegas, o guitarrista East Bay Ray e o baixista Klaus Flouride, mudaram tudo isso. Fresh Fruit... foi o primeiro manifesto anarquista punk americano. Com sua voz de personagem de desenho animado, Jello conclamava o povo a matar os pobres (“Kill The Poor”), linchar os síndicos (“Let's Lynch The Landlord”), tomar drogas (“Drug Me”), roubar correspondência (“Stealing People's Mail”) e visitar o Camboja (“Holiday in Cambodia”). Falava também de guerra química, golpes militares e conspirações direitistas. Tudo isso embalado por uma ironia corrosiva e por uma explosiva combinação de punk, surf music e experimentalismo.O Dead Kennedys nunca se encaixou na teoria simplista de que punk se faz só com dois acordes e um pulmão forte. Suas músicas têm arranjos elaborados e mudanças inesperadas de ritmo e andamento.


Jello colheu exatamente o que plantou: discórdia e incompreensão. Foi processado por obscenidade, teve discos recolhidos, brigou na Justiça e incomodou muita gente. Era uma mosca na sopa da sociedade americana, um câncer – necessário. Jello levou o lema “faça você mesmo” ao extremo: montou a própria gravadora , a Alternative Tentacles, e lançou todas as bandas de que gostava. Chegou a candidatar-se a prefeito de São Francisco, propondo que os policiais usassem nariz de palhaço. Teria o meu voto, fácil.

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segunda-feira, 10 de março de 2008

:: Steely Dan ::



:: STEELY DAN - "Pretzel Logic" (1974)

Com uma seleta legião de fanáticos seguidores de seu aclamado "Pop Perfeito", o Steely Dan é uma ilha de bom gosto no mundo da música de consumo. Com um molho especial, calcado no melhor do Jazz, os melhores músicos de estúdio do planeta e composições do nível de um Cole Porter, produziu uma dúzia de discos antológicos que deram a diretriz de quase tudo feito no gênero a partir dos anos 70. (...) Com o nome tirado do romance "Beat Naked Lunch" de William Burroughs, o Steely Dan na verdade é o projeto de uma dupla de geniais compositores nova-iorquinos chamados Donald Fagen (1948) e Walter Becker (1950) que se conhecem desde os tempos de colégio. Eram jovens suburbanos típicos que passavam o dia estudando e as noites viajando com muito Charlie Parker, Duke Ellington e John Coltrane enquanto se entupiam da melhor literatura beat underground como Kerouac, Corso, Ginsberg etc... Depois de inventarem uma multidão de bandas com nomes estranhos e tentarem a cena teatral da Broadway, se mudam para o Brooklin e conhecem o produtor Gary Katz, que propôs a formação de uma banda pop para dar vazão ao excesso de sofisticação da música da dupla e ganhar um qualquer com isso. - WHIPLASH!

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Antes de formarem o duo Steely Dan, Donald Fagen e Walter Becker eram compositores para a ABC, tendo escrito êxitos para artistas como Barbara Streisand. Depois de explorrem a fundo o seu som em Can't Buy a Thrill, e de o elevarem a outro nível em Countdown To Ecstasy, o par regressou às coordenadas Tin Pan Alley. Seguindo a fórmula dourada do pop - as canções de 3 minutos - o duo decidiu jogar ironicamente em termos de estilo e gênero. O resultado foi Pretzel Logic, um álbum que se converteu em disco de platina.

A primeira canção define o tom do álbum. "Rikki Don't Lose That Number" é uma comovente história de amor não correspondido. O tema oscila entre um samba ligeiro e uma balada para piano, até o sensacional solo de guitarra de Jeff 'Skunk' baxter disparar numa linha de country folk californiano exatamente no meio da canção. Seguindo o mesmo rastro, "Any Major Dude Will Tell You" é iluminado por raios de sol de Orange Country.

Mas o grupo não se tinha perdido a sua característica mordaz. "Monkey in Your Soul", quase um cruzamento entre Noel Coward e Stax, é uma maliciosa carta escrita com tinta venenosa, enquanto a petulância ferida da inveja é tratada com um humor negro em "Through With Buzz".

O disco também se destaca pelos seus engenhosos pastiches. O caráter desfiante dos solitários adquire um dinamismo digno de um filme policial em "Night By Night", enquanto o homicídio de "With a Gun" bem poderia fazer parte do argumento de um filme dos irmãos Coen. A festiva "East St. Louis Toodle-Oo" merece ser destacada pela steel guitar tocada ao gênero ragtime. - 1.001 DISCOS PARA OUVIR ANTES DE MORRER

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DOWNLOAD (mp3 de 192kps - 11 músicas - 46MB):
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terça-feira, 4 de março de 2008

:: os 10 melhores dos anos 60...- #06 ::

[6º]

THE JIMI HENDRIX EXPERIENCE
Electric Ladyland (1967)

- por Eduardo Carli de Moraes -


A aparição de Jimi Hendrix, comparável a de um monstro mitológico que emerge d'um pântano coberto de algas e lama, soltando fogo pelas fuças como um vulcão humano em erupção (&*%$#@!), foi um dos marcos supremos do rock psicodélico americano em meados dos '60. E seu primeiro álbum junto ao Experience soava tão revolucionário e explosivo que garantiu para o negão, de cara, o status de um dos guitarristas mais versáteis e virtuosos da história. Poucos símbolos na história da guitarra são mais poderosos do que este: aquele garoto canhoto com seus cabelos black power em desalinho, portando roupas coloridas tipicament hippies, empunhando sua Fender Stracoster virada de cabeça pra baixo, por vezes até fazendo graças como palhetar com a língua, tocar o instrumento nas costas ou botar fogo nele ao fim de shows que, mesmo sem esse gran finale teatral, poderiam sem dúvida merecer o adjetivo “incendiários”... O tamanho do mito e a vastidão das imagens icônicas poderiam soterrar a música e o artista – mas não foi o que aconteceu; a música de Jimi Hendrix vive!

A história colocaria sobre a cabeça de Jimi Hendrix a coroa quase unânime de melhor guitarrista de todos os tempos, aquele que gerou uma profunda impressão sobre músicos de funk e black music (como Sly Stone e George Clinton do Funkadelic), de rock pesado (como Eddie Van Halen e Tom Morello, do Rage Against The Machine), até mesmo de mestres do jazz (como Miles Davis, que planejava gravar algo em contribuição com ele). “Na altura em que Are You Experienced? foi lançado, Jimi Hendrix (americano natural de Seattle que estava expatriado no Reino Unido) já havia enganchado três singles no Top 10 Britânico (“Hey Joe”, “Purple Haze” e “The Wind Cries Mary”) e havia feito um show inesquecível no Festival Pop de Monterey, no Canadá. O êxito na América foi menor, o que não impediu o disco de ser o 15٥ mais vendido de toda a década de 60, segundo a RIAA (4 milhões de cópias).

Criador de alguns dos riffs mais clássicos da história do rock – “Purple Haze”, “Foxy Lady” e “Crosstown Traffic”, por exemplo – Hendrix fez nos anos 60 um som de um peso e uma força incomuns para aqueles tempos, sendo um precursor direto do hard rock que viria na década de 70 guiado pelo Led Zeppelin e pelo Black Sabbath. Sua original mistura de blues clássico (presente em “Red House”, um dos destaques de seu disco de estréia), sonoridades psicodélicas e grooves funkeados influenciou toda uma geração e “sua imagem como um voodoo child psicodélico conjurando forças incontroláveis tornou-se um arquétipo do rock” – como diz a Enciclopédia da Rolling Stone.

Mas não só como guitarrista Jimi fez história, já que seus talentos como compositor e como cantor não são nada desprezíveis. “Hendrix também se revela um exímio vocalista no modo como anima as canções de amor, luxúria, viagens interestelares e desorientação toxicômana”, como comenta Gene Sculatii. Sua carreira foi literalmente meteórica – sua primeira banda, o power trio Experience, só sobreviveu por três álbuns; sua segunda banda, a Band Of Gypsys, se desfez após algumas apresentações ao vivo e não chegou a deixar um disco de estúdio; e, claro, a vida do cantor e guitarrista foi tragicamente interrompida em 1970 com sua morte acidental. Sua influência, porém, permanece ecoando e repercutindo.

Escolher um álbum de Hendrix como o melhor de sua carreira é tarefa das mais árduas, mas Electric Ladyland parece ser a melhor pedida. Are You Experienced? pode ter tido um impacto maior na música pop, mas seu Electric Ladyland, terceiro e último álbum com o Experience, reúne num só disco todas as vertentes e qualidades do caldeirão de feiticeiro hendrixiano. É o mais ambicioso de seus álbuns: pensado para ser um LP duplo numa época em que essa era uma idéia ainda excêntrica, continha músicas quilométricas (como a versão blues de “Voodoo Chile”, que ultrapassa os quinze minutos de duração), longas pirações psicodélico-atmosféricas que certamente soavam ultra-vanguardistas nos anos 60 (como “1983”, que passa dos treze minutos de duração), pop psicodélico altamente beatle (“Little Miss Strange) misturado com ataques guitarrísticos que beiram o hard-rcok (“Crosstown Traffic”).

É um álbum que merece tranquilamente o adjetivo de “épico”. É uma odisséia musical de um músico extremamente ousado e aventureiro, no cume de sua inspiração. A ambição de Electric Ladyland às vezes pode soar desmesurada, mas é uma ambição bem diferente daquela que moveria as punhetas progressivas que começariam a chatear o mundo na década seguinte. É a ambição de um músico extremamente versátil, que caminha com facilidade pelos mais diversos idiomas da música popular, nos dando a nítida sensação de que não havia nada que ele não pudesse fazer. É sentar no magic carpet criado pelas ondas sônicas de Hendrix e embarcar nessa longa, estranha e magnífica viagem final do Experience, pelos prados e pântanos de algum paraíso da psicodelia que podia ser chamado Wonderland ou Terra do Nunca, mas acabou apelidado de Electric Ladyland...

DOWNLOAD (mp3 de 160 kps - 16 músicas - 85MB):
http://www.mediafire.com/?yllmxbm2myy