segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Entrevista com CONTRACONDUTAS DA AIDS

Realizamos uma entrevista com o coletivo Contracondutas da Aids. Ou seria uma plataforma de autoria múltipla? Uma multidão? Bem, o leitor poderá averiguar isso e tirar suas próprias conclusões já na primeira pergunta. Na sua página no Facebook e no seu blog, os divíduos que compõem as Contracondutas tentam fazer uma arqueologia/genealogia do dispositivo da Aids, tentam averiguar como a Aids pôde se produzir como um discurso de verdade, capaz de fazer os “homossexuais” desempenharem o papel de um “agressor biológico” específico, hipostasiado em “doença-vírus-identitária”. Eles lançam luz sobre a aliança entre saber médico e governamentalidade responsável pela gênese desse dispositivo e sobre a exploração capitalista dos corpos, assignados ou não como aidéticos, “uma mais-valia da carne, da carne humana”, vinculada à crescente medicalização da vida. “[…] na era da “Aids de Controle”, que sucedeu a da “Aids Disciplinar”, a intenção não é mais eliminar uma parte da população para servir, entre outras coisas, de exemplo de como não se comportar, mas, sim, de manter um controle identificatório e médico sobre os corpos e a vida, manter certo número de indivíduos disponíveis como cobaias da tecnociência capitalista e o poder médico como soberano da vida”, eles nos dizem. Passemos à entrevista.

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Depredando o Orelhão. Quem são vocês? Um coletivo, uma plataforma múltipla de autoria… uma multidão? Como se dá a escrita? Quais as potências que vocês percebem na escrita?

Contracondutas da Aids. Essa pergunta, ao mesmo tempo banal e previsível, trai a obviedade esperada, por ser uma tentativa de delimitar de antemão uma identidade que nunca esgotaria o que tanto pode ser um conjunto de “singularidades somáticas” quanto a expressão unívoca que aqui se materializa. Nos faz lembrar das manifestações de junho/julho de 2013, quando representantes da sociedade de controle expressaram com certo pesar que não sabiam como negociar com xs manifestantes, uma vez que essxs não possuíam carro de som, umx líder e uma pauta. Em todo caso, permitam-nos citar umx dxs manifestantes que, ao ser questionadx por sua identidade, disse: “Anote aí: sou ninguém.” Mas, para ir mais diretamente ao ponto, podemos ser todas essas coisas, somos um devir sempre minoritário, nas margens micropolíticas do que se tem pensado quando o assunto é Aids. Se surgiram tantas possibilidades nessa pergunta, isso é um excelente sinal. Também poderíamos dizer: somos um vírus que se multiplica sem nunca poder ser encontrado, pois no momento em que foi localizado, já mudou sua forma, somos uma cepa resistente aos anti-retrovirais dos aparatos identificadores da biopolítica. Sobre essa questão de como se dá a escrita, gostamos de pensar que não temos a menor ideia. Não que não haja um tipo de metodologia ou direção para onde caminhamos. Mas como essa pergunta acompanha a questão da identidade, poderíamos afirmar que se trata tanto de espectros que habitam as falas e escrituras – fantasmas silenciados que finalmente resolveram cintilar na sombra que há por trás dessas versões aparentemente neutras e transparentes das teorias “oficialistas” – quanto de uma série de associações e mutações que se dão quando as diferentes contracondutas se intersectam. A escrita é esse nó entre o que apenas chega como um eco e esses vultos que tentamos com muita dificuldade distinguir nas profundezas violentas onde repousam inquietas as vozes interditadas pelo discurso hegemônico. A potência está justamente na resistência à assimilação, tanto acadêmica quanto epistêmica, está na força do grito que não foi calado. Para nós, se trata de manter uma superfície incorporal, a potência de uma presença descarnada, trincar de forma irreparável a superfície insidiosamente coesa do pensamento médico-estatal, a potência que tem gênese unicamente no corpo desconhecido.

D. O que é a Aids? Qual a novidade da versão “adquirida” da síndrome da imunodeficiência? De que formas a Aids vem sendo usada como meio de controle? Quem é atingidx por esse controle e quem o pratica?

C. Bem, essas são justamente as perguntas que em grande parte resumem o trabalho que tentamos realizar. Talvez seja certo afirmar que estamos mais interessadxs em pensar o que não é a Aids em vez de tentar decifrar um enigma. É preciso ser escorregadio e misterioso como a própria doença, se quisermos jogar esse jogo. A palavra talvez não seja “novidade” (aliás, quem gosta de novidade?). Novidades são apenas lampejos que desaparecem no calar das noites, duram exatamente o momento que um novo raio leva para cair. Ao contrário, diríamos que não há absolutamente nada de novo no que fazemos, a não ser que estamos muito mais interessadxs em ouvir os ecos que há tempos viajam no vácuo que permeia os discursos infinitamente quebráveis da teoria oficialista. Mas não apenas isto, pois diferenciamos bem este trabalho que associamos com uma forma dissidente de saber da Aids (saber que fascina, pois é antes de tudo uma “verdade”, verdade que se materializa no corpo, que persiste na resistência política à bionorma), que cuida exatamente de mergulhar nos interstícios abismais que existem na aparente obviedade do vírus. É bem verdade que talvez esse tema tenha estado repousando como umx vampirx que desperta depois de trezentos anos, tentando dar sentido à realidade que já x abandonou. Sobre ser atingidx, certamente podemos pensar em termos de estilhaços de uma bomba atômica que inicialmente atinge um grande número de pessoas que morrem instantaneamente, mas há sempre a radiação que afeta a todxs, em menor ou maior quantidade. É nesse momento radioativo da Aids que talvez nos encontramos, momento aparentemente calmo em sua superfície, mas que repousa num turbilhão de fatos mal construídos, meias-verdades, uma dor que não tem forma e se volatiza, se adapta e se recria, uma metáfora performativa que cria o que descreve.

D. Diz Deleuze: “Entre o poder e o saber, há diferença de natureza, heterogeneidade; mas há também pressuposição recíproca e capturas mútuas e há, enfim, primado de um sobre o outro.” E ainda: “[…] segundo Foucault, tudo é prática; mas a prática do poder permanece irredutível a toda prática do saber. Para marcar essa diferença de natureza, dirá Foucault que o poder remete a uma ‘microfísica’”, a “[…] uma dimensão do pensamento irredutível ao saber: ligações móveis e não-localizáveis.” E, contudo, nas palavras de Foucault, “entre técnicas de saber e estratégias de poder, nenhuma exterioridade, ainda que cada uma tenha seu papel específico e que se articulem entre si, a partir de suas diferenças.” Vocês se propõem analisar os poderes e os saberes cujo cruzamento produz o dispositivo da AIDS. Que poderes e que saberes são esses? Quais as diferenças de natureza, as pressuposições recíprocas e as capturas mútuas existentes entre eles? Há algum primado de uns sobre os outros?

C. Entendemos perfeitamente o que diz Deleuze nessa sua gentil citação, especialmente se pensarmos que no caso da Aids foi preciso uma cumplicidade entre o aparato estatal e o saber médico, exatamente essa heterogeneidade e pressuposição mútua de que fala Deleuze, ou ao menos é isso que percebemos. Começamos nossas reflexões a partir do discurso da secretária de saúde estadunidense na época do governo Reagan, Margareth Hecler, que acompanhada do “descobridor” do vírus, Robert Gallo, numa aliança entre saber médico e governamentalidade, estabelece uma estratégia que só muito tempo depois revelaria suas reais dimensões. O que complica essa questão de saber e poder é que, ao menos no caso da Aids, esse saber é intrínseco ao Estado, pois como é sabido, não houve, por exemplo, publicação de artigos comprovando a tese de Gallo antes da conferência em que Hecler, em nome do governo estadunidense (e, portanto, do Estado), dita o que funcionará como mecanismo legitimador de um saber que é médico e, a princípio, nada teria que ver com a secretária de saúde. O que queremos dizer é que a “verdade” foi capturada pelos organismos governamentais, sequestrada das lentes dxs cientistas e pasteurizada num discurso absolutamente poroso. Portanto, é menos uma questão de comprovação e legitimidade do que da violência e arbitrariedade de um “método” não mais empírico, não mais da ordem dos discursos científicos, mas do controle biopolítico.

D. Na Insurreição dos Saberes Sujeitados, percebemos dois grandes movimentos: o primeiro é o reposicionamento político marcado pela mudança do nome que designa o blog e a página que vocês mantêm no Facebook; o segundo é a apreciação das relações de poder-saber da Universidade. Falem-nos desses movimentos.

C. Não que tenhamos esgotado esse assunto, mas falamos bastante disso no último texto. Mas pensando nas pessoas que não o leram e tentando resumir de forma pouco satisfatória (recomendamos que leiam), digamos que essas questões se colocaram como entraves que incomodavam e impediam que avançássemos sem deixar rastros perigosos. No caso da mudança de Dissidentes para Contracondutas foi algo que nos incomodou muito, especialmente após alguns contatos diretos com pessoas que se colocam diretamente como representantes de um movimento dissidente da Aids. Nesse sentido, a necessidade de nos diferenciar foi tanto ética quanto epistemológica, uma vez que não falamos desde esse lugar da dissidência, em grande parte marcados por uma recusa absoluta do poder médico, ado Biopanóptico, recusa em tomar medicamentos e ataques veementes ao corpo médico hegemônico. Não diremos que se resume a isso, mas, antes, esses são traços constituintes de um corpo dissidente que tomou para si a responsabilidade de aprender e lidar com o próprio corpo, que rompeu a colonização do corpo e da subjetividade empreendida por um saber que até então reinou absoluto sobre xs indivíduxs e singularidades. Nesse sentido, não há força mais provocativa e subversiva que a dissidência. Nosso trabalho, no entanto, é diferente, é uma dissidência também, sem dúvida, mas que avança em outras frentes, que utiliza e utilizará o saber produzido pela dissidência (não apenas dxs próprixs sujeitxs localizadxs pelo Biopanóptico, como também do corpo médico dissidente), mas que investiga outras questões de cunho histórico, filosófico e sociológico, especialmente as ligações da Aids com questões de governamentalidade. De forma bastante reduzida, diríamos que a razão foi essa, diferenciar mantendo ao mesmo tempo um vínculo crucial. Quanto à Universidade, enfim, é uma instituição longe da neutralidade (no sentido dos vínculos com políticas governamentais e mesmo de investimentos privados que de uma forma ou de outra funcionam direcionando as pesquisas), seus efeitos na legitimação do saber são insidiosos, para dizer o mínimo, as relações hierárquicas são mecanismos violentos de silenciamento e coerção, seu saber limitado e recortado em compartimentos mofados que não mais consegue fazer uma apreensão imanente de um acontecimento ou fenômeno – no caso da Aids, um acontecimento que está longe de se resumir às lentes dos microscópios da biotecnologia. Por essas razões, sentimos necessidade de minar esse espaço, abrir trincheiras e radicalizar na estratégia de publicação e divulgação. Não temos tempo para perder com Lattes e orientadorxs chatxs, incompetentes e conservadorxs, não temos energia e sangue para doar a essa instituição.


D. É possível falar de um processo de medicalização da vida? Se sim, em que consiste esse processo? Há algum marco inicial para ele? Como ele se conecta ao heterocapitalismo? Quais seus efeitos (disciplinares, regulamentadores, etc.) sobre os corpos e as subjetividades?


C. Até para quem é leigx nesse campo da epistemologia médica é fácil notar que da Coca-Cola e da aspirina ao coquetel, perdemos completamente a relação que no passado parece ter existido com Gaia, com nosso próprio corpo. Podemos ver essa relação ainda muito presente, por exemplo, no que resta das populações indígenas. Ao menor sinal de dor, rapidamente recorremos a um fármaco, sem atentar para como funciona nosso organismo, que tipo de comida é mais saudável e nos faz sentir melhor, etc. Somos condicionadxs a comer o que as grandes corporações querem, em especial as da indústria da carne, que ainda são o carro-chefe. Claro, sabemos que nem todo mundo pode escolher o que comer ou ter acesso a um tipo de conhecimento que permita escolher melhor, saber o que é melhor. Mas é justamente aí onde percebemos a medicalização da vida, porque já parece bem evidente que a indústria médico-farmacêutica depende das doenças que essa dieta empurrada goela abaixo causa nas populações. Portanto, a medicalização está visceralmente conectada à causa, que talvez seja ela própria em doses menores e formulações levemente diferenciadas. A margarina que quase toda a população usa tem apenas uma molécula que a diferencia da estrutura molecular do plástico. Comemos plástico saborizado. Seguramente foi no pós-guerra que houve uma enorme difusão de medicamentos que na verdade surgiram tanto de experimentos quanto de drogas feitas para os soldados. A cocaína em sua forma mais atual é derivada de uma tecnologia militar, pelo menos se estivermos de acordo com o que autorxs como Preciado já disseram. A ritalina parece atuar no cérebro de crianças de forma muito parecida com a cocaína. É importante dizer, com Foucault, que o problema não são as drogas em si, o problema é que não nos chegam drogas boas, de qualidade, que possibilitem a ampliação de potências, etc., como ocorria nas décadas de 50, 60 e 70. Drogas legalizadas, como, por exemplo, as pílulas anticoncepcionais, são mecanismos altamente reguladores e prescritivos do gênero e do comportamento “femininos”, como bem mostrou Preciado. Em relação a Aids, temos um fenômeno que merece ser acompanhado de perto que é chamado PrEP, “Profilaxia Pré-exposição”, indicada em contextos de possível risco. Já está sendo sugerida a utilização compulsória desse medicamento por “homossexuais” – identidade obsoleta que está diretamente relacionada com a Aids, tendo sido assimilada pelo corpo social a partir da emergência da Aids. Acreditamos que isso responde um pouco à última questão, sobre a maneira pela qual uma identidade, uma subjetividade é acionada e mesmo produzida a partir de um medicamento ou enfermidade.


D. Quais as condições de possibilidade ou as bases (epistêmicas, políticas, etc.) para uma teoria descolonial da Aids?


C. Parece estar implícito nessa pergunta que o que fazemos não é algo descolonial, e isso talvez se dê por uma interpretação unilateral do que seja uma teoria descolonial. Como parece impossível entrar em terreno minado sem explodir alguma bomba, permitam-nos simplesmente dizer que estamos ansiosxs para ler algo desse gênero, uma teoria essencialmente des-colonial da Aids, adoraríamos ver algo escrito em tupi-guarani sobre Aids, com certeza teríamos muito a aprender… A partir do momento em que nos vemos de certa forma submetidxs a um conjunto de regras ou diretrizes para que o conteúdo seja digno de ser considerado descolonial, essa designação não mais nos interessa. Claro que estamos apenas chamando atenção para o fato de que a própria “teoria descolonial” está longe de ser algo homogêneo, e mesmo entre alguns nomes mais notórios desse metiê, não há um consenso. Mignolo e Dussel pensam a modernidade como colonialidade em si e propõem não bem uma hermenêutica descolonial, mas, antes, um “giro” descolonial que implicaria um descentramento do ocidente como destino histórico e genealógico. Ora, isso pode estar muito bem em outros campos, e vemos com bons olhos esse giro, que consideramos essencial. Mas, no que diz respeito à Aids e suas implicações, diríamos estar num movimento muito inicial, ao menos no Brasil, para que pudéssemos falar a partir de uma cosmologia indígena, por exemplo, sobre Aids, o que certamente seria bastante interessante. Em todo caso, nos reservamos uma tarefa que não necessariamente exclui conceitos e teorias oriundas do Ocidente, especialmente os elaborados por Foucault, Donna Haraway, Preciado, Butler, etc., que, como sabemos, não são necessariamente descoloniais, nos moldes desse novo cânone. Estamos muito no início de um processo que se arrasta e sofre mutações a cada segundo e especialmente permitimo-nos nos enganar, sim, mas não a esse respeito, não na tentativa de funcionar com base em um conjunto de pressupostos descolonias, se quiserem, que nos permitiria “criar” algo completamente novo, descoladxs da colonialidade do poder, para usar o conceito específico. Tanto estamos a par disso que na postagem anterior, A Insurreição dos Saberes Sujeitados, dedicamos um trecho específico a isso, inclusive por termos interlocutorxs que chamaram atenção a esse respeito. Lá explicamos mais pormenorizadamente as limitações de tal empreendimento, com o qual, desde o início, jamais nos comprometemos. Lógico, é perfeitamente possível pensar a Aids através de outros conceitos, outras bases epistemológicas, podemos pensar a Aids desde já a partir do entendimento de que ela é uma tecnologia imperialista e colonizadora, não sem razão enfatizamos repetidas vezes a “colonização dos sujeitos”, da colonização das subjetividades por meio dessa ferramenta colonial. Para o momento, recusamos a tarefa de “criar” uma teoria, de forma alguma é o que pensamos fazer. Em termos de gestos, em termos de práticas, lutar contra o poder médico é em si um gesto descolonial, usem a teoria que quiserem, recusar esse destino reservado pelo discurso médico é descolonial, produzir um saber-poder, um tipo de conhecimento marginal, com as cicatrizes do bisturi do biopoder, é descolonial. Portanto, resumindo, teríamos que diferenciar a priori uma prática política que inclui necessariamente a produção ou não de uma teoria e algo que seria como certa hermenêutica, uma polícia descolonialista que filtraria o que é colonial ou não de acordo com alguns pressupostos.


D. Em La droga Género, lemos: “El éxito de la tecnociencia contemporánea es transformar nuestra depresión en Prozac, nuestra masculinidad en testosterona, nuestra erección en Viagra, nuestra fertilidad/esterilidad en píldora anticonceptiva, nuestro sida en triterapia. Sin que sea posible saber qué viene antes, si la depresión o el Prozac, si el Viagra o la erección, si la testosterona o la masculinidad, si la píldora o la maternidad, si la triterapia o el sida. Esta producción en auto-feedback es la propia del poder farmacopornográfico en el cual vivimos hoy en día.” O que é esse poder farmacopornográfico e como ele se relaciona com o dispositivo da Aids? Qual o papel da indústria farmacêutica nesse dispositivo?


C. Poder farmacopornográfico é um conceito de Beatriz Preciado bastante apropriado para pensarmos o papel que essas drogas têm como dispositivos reguladores e prescritivos da subjetividade e para problematizarmos a exploração capitalista sobre os corpos, uma mais-valia da carne, da carne humana. Por outro lado, esse conceito já foi criticado pela forma universalizante e totalizante em que é usado. Em todo caso, essa citação nos interessa por um possível desdobramento que nos seria útil, possibilitando evidenciar ou enfatizar o efeito de captura dessas tanatotecnologias chamadas “coquetéis” e o fato de que o próprio coquetel (de acordo com nossas fontes médico-epistêmicas laterais) é o que engendra a doença. Essa é uma das vertentes bastante difundidas entre xs dissidentes da Aids.
Responder de fato a essa pergunta levaria, pelo menos, umas 50 páginas, é um dos tópicos que merecerão uma atenção especial. Contudo, há algumas coisas que podem desde já ser mencionadas e que não constituem mais um segredo. Por exemplo, o fato de o AZT ser uma medicação quimioterápica de forma alguma indicada para atacar um vírus. Sabemos que, na verdade, por ser uma medicação que destrói as células, qualquer pessoa saudável que fizer um tratamento com AZT, consumindo quantidades nocivas todos os dias (sabemos que quimioterapias são feitas em intervalos de tempo consideráveis entre uma sessão e outra), poderá notar uma série de transformações em seu corpo parecidas com “os sintomas da Aids”: perda de peso, diarreias (essa medicação arruína a flora intestinal completamente), destruição do sistema imunológico de modo que doenças oportunistas surgirão, etc. Hoje, na era da “Aids de Controle”, que sucedeu a da “Aids Disciplinar”, a intenção não é mais eliminar uma parte da população para servir, entre outras coisas, de exemplo de como não se comportar, mas, sim, de manter um controle identificatório e médico sobre os corpos e a vida, manter certo número de indivíduos disponíveis como cobaias da tecnociência capitalista e o poder médico como soberano da vida. No futuro, ao tratar desse tópico, esperamos também poder abordar as formas pelas quais se dão os mecanismos de teste e comprovação da “eficácia” de medicamentos, questão por si só bastante perturbadora.


D. Foucault nos adverte: “[…] contra as usurpações da mecânica disciplinar, contra essa ascensão de um poder que é vinculado ao saber científico, nós nos encontramos atualmente numa situação tal que o único recurso existente, aparentemente sólido, é precisamente o recurso ou a volta a um direito organizado em torno da soberania, articulado sobre esse velho princípio”, “[…] a uma certa teoria da soberania, que seria a teoria dos direitos soberanos do indivíduo […]”. Em que sentido os corpos são plataformas políticas? Como podemos resistir à medicalização geral do comportamento, das condutas, dos discursos, dos desejos, etc., sem recairmos, por exemplo, na teoria dos direitos soberanos do indivíduo? Quais as linhas de fuga, particularmente para aquelxs que foram localizadxs pelo Biopanóptico e assinaladxs como aidéticxs?


C. Foucault se referia em grande parte aos valores e princípios que estão vinculados a um ideal burguês, princípios que emergem com a revolução burguesa: toda essa lógica de “Direitos”, “Direitos humanos”, “Todos somos iguais perante a lei”, é uma ideal que vem do Iluminismo. Sabemos como esse mecanismo que prega uma igualdade jurídica e legalista é traiçoeiro. Por exemplo, quando Chomsky, no debate que teve com Foucault, argumenta em favor de uma sociedade anarcosindicalista e prega ideais como Justiça e Bondade, Foucault lhe recorda, não sem certa violência que advém do deslocamento do óbvio, que esses são valores formados dentro e por uma sociedade de classes, são valores burgueses que precisam ser destruídos, ou que, de qualquer maneira, ao reivindicarmos justiça e “direitos”, no mínimo devemos ter consciência das implicações que há nesse exercício de liberdade e justiça. É uma questão que se complica ainda mais quando reivindicamos, por exemplo, a criminalização da homofobia ou mesmo o famoso “matrimônio igualitário”. Não estamos dizendo que as pessoas não devem se casar, mas questionando que valores estamos reproduzindo, que moral está por trás de um casal higienizado e monogâmico que acabou de dar entrada nos papéis para adotar uma criança? Que mecanismos traiçoeiros reativamos ao fazer funcionar mais e melhor o aparato jurídico-estatal, ao pedirmos mais polícia? Talvez seja nesse sentido que devemos exercer uma violência contra o óbvio ou, mais exatamente, contra isso que de tão óbvio não aparece. Não há resposta para isso, porque qualquer um que arriscar prescrever uma fórmula de como agir politicamente se compromete com uma forma de fascismo, malgrado a revolução “comunista-socialista”. Por exemplo, uma situação especialmente vinculada ao poder médico é o controle sobre o gênero, um termo mais específico cunhado pelas pessoas trans é o de Cissexismo, termo de uma importância política cortante. Com ele, se denuncia não apenas o heterossexismo, mas a imposição de um gênero que seja inteligível independente da prática sexual, que corresponda ao que a medicina e a psiquiatria impõem como inteligível. Nos damos conta de que através de um mecanismo médico-legal, um controle vertical e implacável se dá desde o nível mais molecular até o mais molar. Em outras palavras, com a patologização das identidades trans*, se cria um mecanismo médico-jurídico que patologiza de “baixo para cima”, ou seja, com esse mesmo mecanismo pode-se classificar, desde a mais tenra infância, um comportamento que se desvia da norma como patológico. Ainda assim, não podemos dizer que se perde completamente o potencial político ao se aceitar os termos médicos. Essa é uma questão que não concerne a não ser a quem vive na pele esse embate político. Contudo, há que se averiguar como esses controles que se dão na medida que se reivindica um direito, uma benesse do Estado. Se há esse controle e vigilância sobre o gênero, a sexualidade e o corpo, fica bem mais fácil entender de que forma o corpo é político e de que forma o simples fato de resistirmos às normas de gênero e à cisnorma é ato de pura violência contra essa norma, contra o controle sobre a vida. Precisamos resgatar essa ideia de violência, de sermos implacáveis, uma vez que nos chega violentamente esse controle sobre a vida, sobre quem somos, como devemos nos vestir, transar, sonhar. E acreditamos que toda essa fluidez identitária que existe hoje de forma um pouco mais rígida, especialmente na sigla LGBT, em grande medida não existiria sem o advento da Aids. Aliás, aproveitando o ensejo, nosso grande motivador é justamente a identidade atribuída à doença, é o que argumentamos desde o início. A Aids só pôde existir mediante a captura dxs sujeitxs identificadxs como responsáveis, o alarme só foi possível ao se acionar a abjeção dessxs sujeitxs como âncora, como suporte. Se hoje sabemos que não existe tal identidade, ou seja, não existe essx sujeitx homossexual (o que existe são fluxos de desejo, normas respeitadas e recusadas em menor ou maior escala), o que sobra dessa verdade, quem responsabilizaremos? Independentemente dessas especulações, o que mostramos e tentamos mostrar, entre outras coisas, é que essas identidades, essas siglas surgiram com o advento da Aids, são um produto do poder e do controle. Em fins da década de 60 e ao longo da década de 70, esses termos sequer haviam saído ainda dos manuais médicos. Claro que a dicotomia bicha/bofe, etc., existia, mas o que vemos hoje, pessoas que reivindicam sua heterossexualidade, isso jamais teria havido sem o aparecimento de todo esse aparato regulador de subjetividades “adquirido”. Quanto às linhas de fuga, acreditamos iniciar seus traçados, resistindo de formas muitas vezes fracassadas à formatação do pensar, a todas essas cadeias que paralisam e sufocam tudo que pode existir de perigoso no exercício do pensar. Não arriscaríamos dizer o que devem ou não fazer as pessoas, mas gostamos do exemplo dxs dissidentes da Aids que, de certa forma, tomaram de volta para si o saber sobre seus corpos, que investigam, resistem, criam outras estratégias. Gostaríamos de conseguir esse efeito em outras frentes, associando-nos, por exemplo, a outras plataformas de pensamento que sejam sujas e perigosas, infectando o chão esterilizado das publicações “legítimas”.

D. O que podemos esperar do próximo capítulo?

C. Não recordamos em que momento decidimos que chamaríamos de capítulo, pois isso remete sempre a um livro. Obviamente, bem poderia ser isso, mas não temos ainda os meios necessários para oficializar o que sem problemas se transformaria num livro. Enfim, se trata de pesquisas, experimentos, provocações que gostamos de dividir especialmente com gente perigosa. Não nos interessa publicar no Qualis A, não nos interessa ser citadxs em trabalhos exclusivamente universitários. O que nos interessa é infectar com o vírus da rebeldia, vírus incurável e extremamente contagioso. E é essa forma mais eficiente e estratégica de publicação que um meio virtual e fluido permite. Dito isso, podemos afirmar que nos sentimos mais livres para caminhar um pouco mais em direção aos circuitos intocados dos conceitos médicos, do Olimpo da microbiologia, dxs deusxs do saber absoluto sobre a origem e fim da vida. Com o teatro encenado por Margareth Heckler e Robert Gallo, uma nova forma de empiria surgiu (ou, pelo menos, a antiga foi implodida). São questões que nos interessam certamente, pois, para nós, a Aids nunca é um fato isolado, é uma engrenagem que faz funcionar melhor todo o aparato de poder e controle do heterocapitalismo, e por isso a chamamos de Biopanóptico. Enfim, o corpo é um campo de batalhas.

sábado, 25 de outubro de 2014

Angeli relembra a Era FHC: confira mais de 20 cartuns sobre o Tucanato no poder




























Aécio Neves Congrega a Escória Fascista (por Altamiro Borges) + Fascismo Inc. (Documentário Completo e Legendado em Português)


AÉCIO NEVES CONGREGA A ESCÓRIA FASCISTA
Por Altamiro Borges 

"Diga-me com que andas e te direi quem és! Para quem tem dúvida sobre o que pode representar um eventual governo de Aécio Neves é só ver quem já anunciou apoio à sua cambaleante candidatura. O Clube Militar, que reúne os “milicos de pijama” saudosos das torturas e assassinatos do período da ditadura, soltou manifesto apoiando o presidenciável do PSDB para “enfrentar a sovietização do país”. Já o milionário “pastor” Silas Malafaia, famoso por suas posições de estímulo ao ódio e ao preconceito, postou no Twitter que é Aécio Neves “desde criancinha”. E o deputado carioca Jair Bolsonaro, conhecido por defender as torturas praticadas pelo regime militar, também aderiu à campanha tucana.

Além de representar os “modernos” neoliberais do PSDB, que afundaram o Brasil no reinado de FHC, e a velha oligarquia do DEM, Aécio Neves passa a expressar também as obsessões doentias dos fascistóides nativos. Sua eventual vitória no segundo turno não representaria apenas uma guinada conservadora no Brasil – com ataques à democracia, à soberania nacional e aos direitos sociais. Pior ainda. Ela expressaria uma ofensiva fascistóide no país. O neonazismo, que ganha terreno na Europa e nos EUA, passaria a ter mais força também no país.”

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FASCISMO INC.
Dirigido por Aris Chatzistefanou
(Grécia, 2014, 83 min)
Dos mesmos produtores de Dividocracia e Catastroika

por Cynara Menezes (Socialista Morena)

Quem fornecia o pesticida Zyklon-B (cianeto de hidrogênio) colocado nas chamadas “câmaras de gás” utilizadas pelos nazistas para exterminar milhões de judeus? A empresa alemã IG Farben, antecessora da mesma Bayer que continua a fornecer inseticidas mundo afora.

A ignorância em torno do socialismo não resiste a cinco minutos de pesquisa no Google. A mais recorrente mentira que a direita tenta espalhar e que encontra receptividade em jovens sem leitura, desconhecedores da história e que se contentam com meia dúzia de frases nas redes sociais, é que o sanguinário Adolf Hitler foi um socialista. Isto baseado na “genial” sacada de que o nome do partido dele era Partido Nacional Socialista. Certamente devem achar que a Coréia do Norte é democrática e popular, já que se chama República Democrática Popular da Coréia. Ou talvez o PSB brasileiro seja socialista, né?

Vários esquerdistas na rede perderam algum tempo desmentindo a idiotice. Os melhores links, em minha opinião, estão no artigo Detonando a Mentira de que os Nazistas eram de Esquerda (em inglês), onde o blogueiro e tuiteiro Shoq escancara o total nonsense desta história. Mas o cineasta independente grego Aris Chatzistefanou foi além e praticamente desenhou para quem se recusa a pesquisar ou pelo menos usar a lógica.

A ascensão do nazismo de Adolf Hitler na Alemanha e do fascismo de Benito Mussolini na Itália durante os anos 1920, 1930 e 1940 só foi possível com a colaboração e o suporte financeiro de grandes corporações ainda hoje poderosas: BMW, Fiat, IG Farben (Bayer), Volkswagen, Siemens, IBM, Chase Bank, Allianz… Sem contar, é claro, com os grupos de mídia.

O filme Fascismo Inc. é o terceiro feito por Chatzistefanou para mostrar as origens da crise econômica na Europa e na Grécia em particular. São imperdíveis também os primeiros da série: Dividocracia e Catastroika, que denunciam a bolha imobiliária e depois a “ajuda” do FMI (Fundo Monetário Internacional), fiel à sua velha cartilha de socorrer os ricos em detrimento dos pobres. Em Fascismo Inc., o cineasta esmiúça a estreita colaboração de industriais e banqueiros com os nazistas para perseguir e destruir o sindicalismo e os socialistas, a quem chamavam de “terroristas” (qualquer coincidência com o Brasil de hoje será mera semelhança). Detalhe: Hitler extinguiu o Partido Comunista alemão um dia depois de tomar posse.

O documentário relata inclusive como a perseguição aos judeus não foi apenas uma questão racial, mas também tinha interesses econômicos. Como os judeus integravam uma poderosa classe média na Alemanha de então, os nazis se utilizaram do racismo para fazê-los bode expiatório da crise, acusando-os de “roubar os empregos” dos alemães –não por acaso, o mesmo discurso que a direita utiliza atualmente em relação aos imigrantes na Europa. O fascismo de Benito Mussolini não foi, ao contrário do que os ditadores pregavam, um movimento de massas: o rei Emanuel III entregou o poder a Mussolini porque era o que queriam as indústrias do Norte da Itália. Para confrontar as massas de esquerda, era preciso criar um movimento de massas de direita. Que melhores líderes para isso do que o psico Adolf e o fanfarrão Benito?

O filme mostra ainda como, no tribunal de Nuremberg, as empresas envolvidas com o nazismo foram submetidas a uma pantomima de condenação. Enquanto os oficiais nazis foram enforcados, quem entrou com o dinheiro para financiar a empreitada foi solto anos depois –os diretores da IG Farben (Bayer), que fornecia os químicos para matar gente, foram condenados a no máximo 8 anos.

Mas o pior são os sinais que Chatzistefanou está vendo, na sociedade grega, de recrudescimento deste nazi-fascismo financiado pela grana: os partidos neonazis gregos são apoiados por parte da elite econômica e dos grupos de mídia (olha eles aí de novo) do país. E o cineasta está convencido de que é uma tendência que pode se espalhar como consequência da crise. “Nosso lema é: ‘o que acontece na Grécia nunca fica na Grécia. Temo que este crescimento da extrema-direita e movimentos neo-nazistas que estamos vendo nos últimos anos na Grécia apareçam em outros países da Europa onde a austeridade foi imposta do mesmo jeito” (leia mais aqui).

Muita gente usa a tirania do ditador soviético Josef Stalin para atacar a esquerda. Stalin (cujo exército, por sinal, derrotou os nazistas) é acusado da morte de milhões, mas o socialismo foi uma de suas vítimas. Hitler também matou milhões, mas o capitalismo não sofreu sob o nazismo ou o fascismo. Pelo contrário: foi seu financiador.

Assistam o filme, é muito bom. Legendas em português.





quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Em terra de tucano... quem toma banho é rei!


- A culpa é de São Pedro! - brada Geraldo Alckmin.

- É nada. A culpa é das cagadas do Alckmin! - retruca a ONU.

- A culpa mesmo é todinha da Dilma! - opina o Aécio Neves.

- Candidato, não seja leviano: a culpa é da má gestão tucana! - responde a presidenta.

- O problema é o aquecimento global! - sugere o climatologista.

- O aquecimento global não existe! - sustentam altas autoridades corporativas.

- Ai que sede da porra! - o povo paulista em coro.

- Como é bom fazer negócios com a tucanada! - comemora a Bolsa de Valores em New York…


Leituras recomendadas:

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Vai ter NINJA! Lançado o novo portal http://www.midianinja.org




Comover, viralizar, politizar! As vésperas da Copa do Mundo no Brasil, Mídia Ninja lança plataforma colaborativa e rede social voltada para o midiativismo e para o jornalismo cidadão. Fruto de uma parceria com a plataforma Oximity, radicalizamos nossa proposta, apostando na produção colaborativa, no financiamento coletivo e na livre distribuição de todos os nossos conteúdos. 

Foi em junho de 2013, quando todo o país foi tomado por manifestações, que nos tornamos uma alternativa de mídia independente. A multidão, que para muito além dos 20 centavos, se manifestava por mais direitos e por mais democracia, ao chegar em casa das ruas e se ver na televisão filmada a partir de helicópteros e descrita por apresentadores que os chamavam de vândalos, buscou nas redes novas representações. 

No meio de “tiro, porrada e bomba” e de toda a repressão e criminalização dos movimentos que se seguiu, os ninjas criaram uma rede de colaboração em todo o Brasil, pelo interior e capitais, transformando o streamming, a linguagem do fotojornalismo e a cobertura em tempo real das ruas em uma nova forma de mobilização. Desde então, seguimos ajudando a criar ondas de participação e viralização nas redes em sinergia com milhares de ativistas e movimentos.

Tudo isso é apenas o começo! Estamos juntos! Afinal, Junho é o aniversário de Junho! Hora de fortalecer as lutas globais e o movimento midialivrista no Brasil. 

Somos Todos Ninjas!

Street Art & Graffiti collection: Brazil's streets FUCK OFF to FIFA

Brazilians streets screaming out their discontent!

Suggested reading:

“Throw FIFA Out of the Game”,
 The New York Times article by Dave Zirin,
author of “Brazil’s Dance With The Devil”
"Most people associate FIFA, the organization that oversees international soccer, with the quadrennial joy of the World Cup. But as the 2014 tournament begins next week in Brazil, FIFA is plagued by levels of corruption, graft and excess that would shame Silvio Berlusconi. (…) In Brazil, site of the 2014 World Cup, the FIFA-driven push to build new stadiums at a breakneck pace has led to the deaths of nine construction workers. FIFA’s demands for security and infrastructure may end up displacing as many as 250,000 poor people, who live in the favelas surrounding Brazil’s urban centers. The cost of the games continues to tick upward, the latest figures climbing as high as $15 billion. (…) Finally, the world is seeing FIFA for what it is: a stateless conglomerate that takes bribes while acting as a battering ram for world leaders who want to use the majesty of the World Cup to push through their development agendas at great human cost.” - David Zirin
READ FULL ARTICLE

REBLOG ON TUMBLR

sexta-feira, 9 de maio de 2014

"O Enigma de Junho" - Série de artigos de Idelber Avelar explora legado da ditadura, crise da representatividade, Passe Livre, dentre outros ingredientes...


"Há que se virar pelo avesso, então, as perguntas que ocuparam os analistas: como é possível que as massas saiam assim às ruas num país de quase pleno emprego, como o Brasil, que está longe das obscenas taxas de desemprego da Espanha? Como é possível que isso aconteça num país em que não há ressentimento ante uma tirania, como foi o caso no Egito da Primavera Árabe? Como isso é possível, perguntavam-se, num país em que recentemente 30 milhões de pessoas ascenderam à classe media e um pacto de classes bem-sucedido, o lulismo, ancorado na figura de um notável estadista, parecia ter domesticado todo conflito? Essas perguntas acerca de como é possível que isso esteja acontecendo cumpriram o papel de mascarar o fato de que a pergunta que importa de verdade é a oposta, ou seja: como é possível que isso não tenha ocorrido antes? Como é possível que isso não tenha acontecido durante duas décadas? Muito especialmente, como é possível que isso não tenha ocorrido na última década, a do lulismo? 
O pacto lulista se ancora na incorporação de uma ampla parcela dos mais pobres ao consumo - ao consumo, não à cidadania, ou em boa parte dos casos à cidadania entendida como consumo - sem que nenhum privilégio dos mais ricos seja tocado. Isso se torna possível, claro, somente num contexto em que o bolo esteja continuamente crescendo, o que ocorreu na década passada graças ao boom das commodities que o Brasil exporta em grande quantidade. Muitas das políticas de ascensão social do lulismo foram instrumentos de uma proletarização de formas de vida e de convivência com a floresta ou com o semi-árido, por exemplo, que tanto o neoliberalismo de Fernando Henrique como o desenvolvimentismo petista não podiam senão ver como pré-capitalistas ou pré-modernos, predestinados a morrer, em suma. No caso da Amazônia, essa troca (a passagem de um modo de vida com certa conversa com o entorno selvático a outro modo de vida no qual esse entorno serve como matéria-prima e substrato sacrificial de uma modernização movida a hidrelétricas, pecuária extensiva e soja) se produz intensamente durante os anos Lula e chega neste momento, não é exagerado propô-lo, ao seu esgotamento como pacto." - Idelber Avelar
Um novo Junho vem aí e nada mais oportuno do que relembrar as jornadas de Junho do ano passado - um mês histórico para os movimentos sociais e mobilizações populares no Brasil. Confira a série de 4 artigos de Idelber Avelar - um trabalho jornalístico primoroso - sobre “O Mistério de Junho”:

I: Os protestos de 2013 e a Amazônia

II: Os protestos de 2013 e o legado da ditadura

III: Os protestos de 2013 e a quebra do pacto lulista

IV: Os protestos de 2013 e a crise de representatividade


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Confira também:

segunda-feira, 7 de abril de 2014

“Raízes e Frutos da Rebelião” – Comentários sobre a luta dos Zapatistas mexicanos contra o Capitalismo Neoliberal (por Eduardo Carli de Moraes)

CddeMexico

“To kill oblivion with a little memory,
we cover our chests with lead and hope.”

SUBCOMANDANTE MARCOS,
Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN).
In: 'Our Word is Our Weapon: Selected Writings',
Foreword: José Saramago (Nobel Prize In Literature)
Published by Seven Stories Press (New York, 2003, Pg. 100.)


PART I - THE BIG-BELLIED BEAST
AGAINST THE GRASS-ROOTS RESISTANCE


CHAPTER I - CHIAPAS LOSES BLOOD THROUGH MANY VEINS

“We are a product of 500 years of struggle: first, led by insurgents against slavery during the War of Independence with Spain; then to avoid being absorbed by North American imperialism; then to proclaim our constitution and expel the French empire from our soil; later when the people rebelled against Porfirio Diaz's dictatorship, which denied us the just application of the reform laws, and leaders like Villa and Zapata emerged...” - First Declaration of the Lacandon Jungle, January 2, 1994

EZLNIn the mountains and jungles of the Mexican southeast, an insurrection explodes in January 1st, 1994. Several municipalities in the province of Chiapas are taken over by the armed rebels that call themselves Zapatistas, followers of the legacy of Mexican revolutionary Emiliano Zapata (1879-1919).

Led by the campesinos and the indigenous populations of Chiapas, this neo-zapatist movement blossoms into the spotlight of the world's arena in exactly the same day of the implementation of NAFTA, the Free Trade Agreement of the North American countries.

From day one, it was made quite clear by the rebels that one of the objectives of EZLN's uprising was to be an obstacle to the implementation of Free Trade policies in Mexico. The economical set-up of Neoliberalism (based on privatization, free competition, consumerism etc.), argues the Zapatistas, is nothing but an authoritarian imposition of rules made-up by “the world of money”:
“The world of money, their world, governs from the stock exchanges. Today, speculation is the principal source of enrichment, and at the same time the best demonstration of the atrophy of our capacity to work. Work is no longer necessary in order to produce wealth; now all that is needed is speculation. Crimes and wars are carried out so that the global stock exchanges may be pillaged by one or the other. Meanwhile, millions of women, millions of youths, millions of indigenous, millions of homosexuals, millions of human beings of all races and colors, participate in the financial markets only as a devalued currency, always worth less and less, the currency of their blood turning a profit. The globalization of markets erases borders for speculation and crime and multiplies borders for human beings. Countries are obliged to erase their national border for money too circulate, but to multiply their internal borders.” - (Marcos, Unveiling Mexico, p. 117)
Wall Street and Washington join hands and try to persuade Mexicans that "Free Trade" will be a marvel for Mexico, but Mexicans have every reason to be suspicious of their neighbor who stole from it a big slice of territory in bygone years. Today, at the frontier that separates the countries, the yankees have built up a huge Wall of Segregation, and soldiers with license to kill can deal with illegal immigrants in very unbrotherly ways.  The same country responsible for La Migra (and Guantánamo Bay, and Abu Ghraib detention facility...) preaches the Free Trade gospel as if it was salvation.

The men and women who have arisen to speak out their discontent in Chiapas are yet to be fully heard by the world-at-large. Artists and writers have helped spread their voices, from Manu Chao and Rage Against the Machine, to José Saramago and Eduardo Galeano. 20 years later, the Zapatistas are still struggling against the powers that want to crush human dignity in the bloody altars of profit. And if the Zapatistas' scream has the potentiality to be heard and comprehended all around the world, it's because they accuse the established capitalist system of committing crimes that are visible worldwide, in many different countries: ecological devastation; ethnical genocide of indigenous populations and destruction of their cultures; concentration of capital in the hands of a few multinational corporations etc.

Zapatismo has been called the first revolutionary movement of the Internet-era, the avant-garde guerrilla that's pioneering the ways to be followed by the guerrillas of tomorrow. But reactionary political powers have been violently trying to silence their voices – and the “money world”, also referred to by Marcos as "The Beast", doesn't refrain from methods such as military agression, police repression,  institutionalized murder, and para-military militias. All in order to maintain the Order imposed by The World of Money and to bury the voices of these “indians”, covered in masks and carrying guns, that insist in demanding social justice, autonomy and real democracy.

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Marcos describes Chiapas's tragedies very vividly in his poetry-filled words: “This land continues to pay tribute to the imperialists”, writes the insurgent Zapatista, “and there's a thousand teeth sunk into the throat of the Mexican Southeast” (Unveiling Mexico, 1992, pg. 22-23). Would the indigenous populations of southeast Mexico have risen in rebellion if the suffering they endured hadn't become unbearable?
“In times past, wood, fruits, animals, and men went to the metropolis through the veins of exploitation, just as they do today. Like the banana republics, but at the peak of neoliberalism and 'libertarian revolutions', the Southeast of Mexico continues to export raw materials, just as it did 500 years ago. It continues to import capitalism's principal product: death and misery.
The health conditions of the people of Chiapas are a clear example of the capitalist imprint: 1.5 million people have no medical services at their disposal. There are 0,2 clinics for every 1.000 inhabitants, 1/5 of the national average. There are 0,3 hospital beds for every 1.000 Chiapanecos, 1/3 the amount in the rest of Mexico... Health and nutrition go hand in hand with poverty. 54% of the population of Chiapas suffers from malnutrition, and in the highlands and forest this percentage increases to 80%.... This is what capitalism leaves as payment for everything that it takes away. (...) Chiapa's experience of exploitation goes back for centuries. ” - Sub Marcos, Unveiling Mexico
In Subcomandante Marcos' political tought, which seems to be deeply rooted in an understanding of Latin America's reality similar to Eduardo Galeano's, Imperialism is the name of the beast which has it's thousands of teeths sunk into Chiapas neck – and so many numberless others places on this Earth where 85 flesh-and-blood earthlings retain the same amount of wealth as half of the world's population (according to Oxfam). Welcome to the established economical and political orden in 3rd planet from the Sun, a place of extreme inequality in which the criminal status quo is defended by armies and warmongers, for the profit of speculators, gangsters and banksters.
“A handful of businesses - one of which is the Mexican state - take all the wealth out of Chiapas and in exchange leave behind their mortal and pestilent mark..(...) Pemex has 86 teeth sunk into the townships of Estación Juárez, Reforma, Ostuacán, Pichucalco, and Ocosingo. Every day they suck out 92.000 barrels of oil and 517.000.000.000 cubic feet of gas. They take away the petroleum”, states Marcos, “and in exchange leave behind the mark of capitalism: ecological destruction, agricultural plunder, hyperinflation, alcoholism, prostitution, and poverty.”
It's easy to delineate the image of the Enemy in the Zapatistas' hearts: the face of the big-bellied beast of Greed. Imperialism is dirty business, greediness in action, devastating egotism that turns nations into vampires that suck the life-blood of others. Besides the petroleum that gets sucked out of Chiapas by greedy oil companies, another similar process affects the production of coffee: 35% of Mexico's coffee is produced in Chiapas, but more than 50% of Chiapas' coffee production is exported. The campesinos that work in the fields to produce it have terribly inadequate life-conditions of nourishment, health, education etc. The true producers are dying of hunger and disease while foreign powers ride on golden streets of robbed privilege.

The list can be enriched with many other “commodities” that are sucked-out of Chiapas to feed, elsewhere, the belly of the beast. There are 3.000.000 animals waiting to be slaughtered for beef in Chiapas: “the cattle are sold for 400 pesos per kilo by the poor farmers and resold by the middlemen and businessmen for up to 10 times the price they paid for them.” (Unveiling Mexico, p. 23) Chiapas' forests are also among the culinary preferences of the greedy hungry beast: whole woods are cut down by capitalism's chainsaws, and this precious wood is then shipped out of Chiapas to be sold elsewhere for huge profits. Similar histories could be told about honey, corn or hydrelectric energy - goods that Chiapas produces in large quantities, but get eaten away by this beastly creature which Marcos denounces and summons to answer: “what does the beast leave behind in exchange for all it takes away?” (pg. 24)

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CHAPTER II - THE TIME TO HARVEST REBELLION INSTEAD OF DEATH

John Lennon asked us in his era-defining song to “imagine a brotherhood of man”, but Chiapas isn't the place to look for it. It ain't brotherly treatment to exploit, repress and steal fellow humans – and that's what businessmen and fancy capitalists have been doing against the Chiapanecos. “1.000.000 indigenous people live in these lands and share a disorienting nightmare with mestizos and ladinos: their only option, 500 years after the “Meeting of Two Worlds”, is to die of poverty or repression.” (Marcos: p. 26)

There are 300.000 Tzotziles, 120.000 Choles, 90.000 Zoques, and 70.000 Tojoales, among other indigenous populations, that inhabit the land of the poorest state in Mexico. Chiapas could be rich, but it's wealth is sucked away and taken abroad, to bank accounts of greedy capitalists, and if you join the Zapatista up-rising against this reality you might end up killed by the repression. How many people has the Mexican Army killed in order to silence the voices that question the undoubtable goodness of the so-called “Free Market”? I leave the question unanswered, for now, and move on, from exploitation to rebellion.

At the dawn of the New Year, in January 1st 1994, the Zapatista National Liberation Army descended from the Lacandon Jungle to take over the power in several cities of Chiapas, including San Cristobal de Las Casas and Ocosingo. They believed to be “professionals of hope”, “transgressors of injustice”, “History's dispossessed”, finally raising their voices to demand liberty, justice, democracy, dignity. This is the moment when they became visible, when they stepped out of the shadows, when they shouted for the whole World to hear.
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January 1st, 1994: EZLN takes power over San Cristobal de las Casas. Photo by Antonio Turok.
“Death does not hurt; what hurts is to be forgotten. We discovered then that we longer existed, that those who govern had forgotten about us in their euphoria of statistics and growth rates. A country that forgets itself is a sad country. A country that forgets its past cannot have a future. And so we took up arms and went into the cities, where we were considered animals. We went and told the powerful: “We are here!” And to the whole country we shouted: “We are here!” And to all the world we yelled, “We are here!”...”
This movement is deeply rooted in History: far from being immediatist and pragmatic, the Zapatista movement demands respect for the rights of human populations who descend from the occupants of this land prior to the European's invasion. This scream of rebellion raises from an ocean of blood: the genocide of the Indians and the destruction of their civilizations is still an open wound in the Zapatistas hearts, and they won't allow the world to forget these past misdeeds. In January 1994, Subcomandante Insurgent Marcos reminded us than in Mexico
“during these past ten years (1984-1994), more than 150.000 indigenous have died of curable diseases. The federal, state, and municipal governments and their economic and social programs do not take into account any real solution to our problems; they limit themselves to giving us charity every time elections roll around. Charity resolves nothing but for the moment, and again death visits our homes. That is why we think no, no more; enough dying this useless death; it is better to fight for change. If we die now, it will not be with shame but with dignity, like our ancestors. We are ready to die, 150.000 more if necessary, so that our people awaken from this dream of deceit that holds us hostage.” (pg. 17)
Seen from the capitalists' perspective, there's a dispensable strata of the population labeled as “Indians” (so called because Columbus thought, more than 500 years ago, that the land where he had arrived was India...). “Check out the text of the Free Trade Agreement, and you will find that, for this government, the indigenous do not exist.” (p. 66) Social inequality and marginalized people go hand in hand in Mexico: “on a national level there are 2,403 municipalities. Of these, 1.153 have a level of marginalization considered high or very high. States with high indigenous population have the majority of their municipalities with high and very high levels of marginalization: 94 out of 111 in Chiapas; 59 out of 75 in Guerrero; 431 of 570 in Oaxaca...” (p. 67)

 For 10 years the Zapatista uprising had been fermenting in the woods, since 1984, and at the beginning of 1994 time had arrived for their voice to be heard, not only in Mexico, but throughout the world, amplified by the Internet, sending its shout throughout the Global Village.  One of the easiest ways to understand the emergence of Neo-Zapatism is to look at the consequences of the NAFTA (North American Free Trade Agreement) agreement becoming active: free market had kicked out the barriers and products from abroad were about to flood into Mexico, like a tsunami, drowning out Mexican campesinos with the devastating power of a Dust Bowl Storm. The Zapatistas knew very well that NAFTA would certainly enrich some big corporations, mainly american and canadian, but would wreck the equilibrium of the local economies – especially in southeast Mexico. NAFTA was inforced with “dictatorial” fashion: it's a fact that neither civil society nor the indigenous populations of Mexico were consulted on the matter, even tough they would be tremendously affected by the transformations in the National Constitution.
 “The preparations for NAFTA included cancellation of Article 27 of Mexico's constitution, the cornerstone of Emiliano Zapata's revolution of 1910–1919. Under the historic Article 27, Indian communal landholdings were protected from sale or privatization. However, this barrier to investment was incompatible with NAFTA. With the removal of Article 27, Indian farmers feared the loss of their remaining lands, and also feared cheap imports (substitutes) from the US. Thus, the Zapatistas labeled NAFTA as a "death sentence" to Indian communities all over Mexico. Then EZLN declared war on the Mexican state on January 1, 1994, the day NAFTA came into force.” - Wikipédia

According to Marcos, NAFTA “only means freedom for the powerful to rob, and freedom for the dispossessed to live in misery.” (p. 73) We've heard this real-life story many times: everytime a Wal-Mart opens in a city, lots of smaller stores go bankrupt because they can't compete with Wal-Mart's prices. That's why it's possible to considerer EZLN as a movement demanding national sovereignty; from the Zapatistas perspective – which arises from the experience of thousands of Mexicans – what is called “neoliberalism” is just a fancy name for imperialist capitalism, for foreign domination, for the sad reality known for centuries in Latin America of wealth being robbed from a country and getting transformed in capital that enriches some big-shot abroad.

In Ana Carrigan's excellent article “Chiapas: The First Postmodern Revolution”, she reminds us that years before NAFTA forced itself into North America there was already a lot of rebellion by campesinos in Mexico: in April 10, 1992, for example, 4.000 indigenous campesinos marched to the country's capital and read a letter adressed to President Carlos Salinas, in which “they accuse him of having brought all gains of the agrarian reform made under Zapata to an end, of selling the country with the North American Free Trade Agreement (NAFTA), and of bringing Mexico back to the times of Porfirio Díaz.” (pg. 36)
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"You are in Zapatista territory: here the People rules and the Government obeys."
“The Zapatistas made their first, spectacular public appearance in San Cristobal de Las Casas. On October 12, 1992, amid demonstrations marking 'The Year of The Indian, 500 Years of Resistance', 4.000 young men and women armed with bows and arrows suddenly appeared out of the crowd. Marching in military formation, they advanced to the central plaza where they attacked the monument to the founder of San Cristobal, the 16th century Spanish encomendador, Diego de Mazariegos. As the symbol of 500 years of opression crashed from its pedestal, the Indians hacked it to pieces and pocketed the fragments before disappearing. In the annals of indigenous resistance, the toppling of Mazariego's statue had a symbolic resonance equivalent to the destruction of the Berlin Walls.” (ANA CARRIGAN)
The communities in Chiapas who have embraced the EZLN program were bound to clash with Mexican establishment. The powers that be, unbrotherly as usual, sent Army soldiers in great numbers in a bloody attempt to silence the rebels. As Juana Ponce de León states,
“for the government, the issue is simple. There are vast oil reserves, exotic wood, and uranium on the autonomous indigenous lands of Chiapas; the Mexican government wants them, but the indigenous communities, who have no currency in the world's markets, are in the way. While projecting through the national and international press an image of concern for the human rights issues and the intention to resolve them, the government orchestrates the privatization of the Mayan lands and a low-intensity war to weaken and divide the communities.” (Traveling Back for Tomorrow, XXV).

A graffiti at City Lights Books, Lawrence Ferlinghetti's bookstore in San Francisco
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You might also enjoy:

Galeano and Jean Ziegler discussing "The World's Criminal Order"
(In Spanish, Portuguese subs)

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PART II

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CHAPTER III - THE CLASH BETWEEN OBLIVION AND MEMORY
“...there once was a man named Zapata who rose up with his people and sang out: 'Land and Freedom!' The campesinos say that Zapata didn't die, that he must return... They say that hope is also planted and harvested. They also say that the wind and the rain and the sun are now saying something different: that with so much poverty, the time has come to harvest rebellion instead of death.” - Sub Marcos, Our Word is Our Weapon: Selected Writings, pg. 33, Seven Stories Press. All following quotes are from this source.

ezln 1 (1)The Zapatistas know their task is Herculean: the Mexican federal Army, certainly backed-up by Washington and Wall Street, greatly outnumbers the army of the Zapatista rebels. The power of destruction of the Establish Capitalist Powers is crushing: they own the police and the prisons, and they pay the soldiers and militias to persecute the Mexicans who join EZLN. The defeat of this insurrectional movement is something that has been aimed at by established powers for the last 20 years - according to Marcos, the enemy would like to see “democracy washed with the detergent of imports and water from antidemonstration cannons.” (pg. 54)

In 1994 Mexico's president Carlos Salinas de Gortari is considered by EZLN as “the sales manager of a gigantic business: Mexico, Inc.” (pg. 63) Free Trade, for the Zapatistas, is nothing but capitalism's “law of the jungle”, and it generates a couple of millionaires while throwing millions into hunger, sickness and death. To use Occuppy Movement's imagery, the top of the social pyramid, the richest 1% of the country, don't give a fig about defending the rights of the Mexican people as a whole (the 99%): “the only country mentioned with sincerity on that increasingly narrow top floor is the country called money.” (pg. 63)  “On every street corner misery knocks on the windows of the car.” (pg. 64)

Even tough they see peace and social justice as an ideal to accomplish, the Zapatistas feel they would remain powerless if they were Gandhian pacifists. Thus they take arms, just like the guerrillas led by Fidel and Che in Sierra Maestra in late 1950's Cuba. EZLN, as the name itself sufficiently states, is an armed rebellion and doesn't comply with what Marcos called, in Aguascalientes, august 1994, “pacifist complicity with injustice” (p. 56) and “fraudulent unconditional pacifism” (p. 58)

EZLN is quite aware that military victory is rather unlikely against such a powerful army as that of Mexico's established powers, backed-up by Washington and Wall Street. So Marcos tends to underline the symbolical importance of the Zapatista's up-rising, its capacity to inspire similar movements throughout Latin America. The 4th Declaration of the Lacandon Jungle, January 1996, states: “Brothers and sisters of other races and languages, of other colors, but with the same heart, now protect our light, and in it they drink of the same fire.” (p. 87)
“To confront an army superior to ours in weapons and personnel, although not in morality, nullifies the possibilities of sucess. But to surrender has been expressly forbidden; any Zapatista leaders who opt to surrender will be decommissioned. No matter the outcome of this war, sooner or later this sacrifice – which today appears useless and sterile to many – will be compensated by the lightning that will illuminate other lands. For sure, the light will reach deep into the South, shimmer in the Mar de Plata, in the Andes, in Paraguay, and the entirety of this inverted and absurd pyramid that is Latin America...” (74)
The future of Latin America lies not only in its ability to build international solidarity, planting the seeds of a future of social justice and true democracy, but also in its struggle against oblivion. The Zapatistas claim that memory has been progressively wipe-out by the forces of a capitalist production, distribution and consumption system that runs on shallow foresight and narrow hindsight. In other worlds: the system wants us to buy like crazy, and think only of immediate enjoyment of products sold in the markets, thus imposing to our minds oblivion of future and past generations. This is one of the most important ideas to understand if we want to grasp what these more than 20 years of the Neo Zapatista movement in Mexico means:

“On the side of oblivion are the multiple forces of the market. On the side of memory is history.” This thesis of the markets' attempted murder against memory is illustrated by the treatment conferred upon indigenous populations by capitalists and their accomplices among politicians. The Zapatistas are saying: the past is not to be forgotten, consumed down to ash, thrown in the garbage can, in order for us to “enjoy” the here-and-now of mass society, mass production, mass consumption, and mass ecological catastrophes. The Zapatistas see the past as “a guide to be learned from and upon which to grow”. The problem is:
“the past doesn't exist for technocrats, under whose rule our nation suffers. The future can be nothing more than a lengthening of the present for these professional amnesiacs. (...) What better example of this phobia of history is there than the attitude of the Mexican government toward the indigenous peoples? Are not the indigenous demands a worrisome stain on history, dimming the splendor of globalization? Is not the very existence of indigenous people an affront to the global dictatorship of the market?” (MARCOS, pg. 147)
The sad thing is: instead of learning from the past in order to build a better future, the authorities in charge of markets and governments complicit to them are basically waging war against those who are labeled by the repression forces and portrayed by the plutocratic media as "The Terrorists". The inner enemy. The war against the Zapatistas waged by the Mexican Federal Army, with the aid of the Yankees, is simply an attempt to silence by massmurder those who are demanding freedom, dignity, and social justice. In March, 1995, EZLN writes “to the people of Mexico and to the peoples of the world”:
“Our voice was silenced all at once by the noise of the machines of war. Terror was unleashed again in the Mexican lands by the one who, from arrogance and power, looks at us with contempt, denies our name, and gives us death in answer to our thought. (...) With the complicity of big money and a foreign vacation, he wanted to force us with bayonets to deny our history. (...) For that reason, our past went to the mountains. We went into the caves of those who came before us. Death cornered us... Death came to wield its knife-edged oblivion. It came to kill memory. Again, our hand filled with the fire to avenge our own pain, again being animals eating dirt, dying persecuted and forgotten.” (pg. 81)
The name Zapatistas then gains the meaning of a very powerful symbolical weapon: a “collective name”, that any individual can claim for himself, and by adhering to it he goes away from the forgetfullness that his individual self lies buried in.  A campesino who haves always felt as nobody, as one of the many who History will forget, now can call himself a Zapatista and thus believe he's part of a collective entity that won't be so easily brushed away to oblivion. Every zapatista will die, but zapatismo will live, beyond the duration of individual lives. When an individual leaps from being an unrelated isolated atom and joins his forces with the supra-individual movement, it's as if his heart has been connected to a vaster entity and now pulsates with a collective heart.
 “No longer are we the unmentionables. We the forgotten have a name. (...) Having now a collective name, we discovered that death shrinks and becomes small before us. The worst death, that of oblivion, flees so that the memory of our dead will never be buried together with their bones.(...) “They, our ancestors, taught us to be proud of the color of our skin, of our language, of our culture. More than 500 years of exploitation and persecution have not been able to exterminate us. (...) If they destroy us, the entire country will plummet and begin to wander without direction or roots... Mexico would negate its tomorrow by denying its yesterday.” (October 12, 1995, pg. 82-83)
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