terça-feira, 21 de dezembro de 2010

<<< planeta terra: crônica tardia >>>


  PLANETA TERRA 2010
por Fabrício Boppré (*)

E foi-se o Planeta Terra, provavelmente minha última incursão num festival desse tipo. Tendo assistido já uns três ou quatro, no Brasil e na Europa, já deu de perceber que esse tipo de maratona não é para mim. Seria legal um dia experimentar um Coachella ou um All Tomorrow’s Parties, cujas escalações e discursos sempre me dão a impressão de serem eventos mais voltados para a música propriamente dita, e não para a festa, a bebedeira, brincadeiras de parques de diversões, esses ambientes e circunstâncias sob medida para gente com roupas esdrúxulas e comportamento idem. Nada contra — só não é para mim.

Eu já tinha tomado essa decisão antes, na verdade, mas quando anunciaram o Pumpkins como atração deste Terra, tive que abrir uma exceção. Não é nem de longe minha banda preferida hoje, mas já foi, e a obra-prima deles, o Mellon Collie and the Infinite Sadness, continua sendo meu disco preferido de todos os tempos. Sendo uma banda de importância pessoal incalculável e nunca vista ao vivo antes, mesmo com o cheiro de necrofilia pairando no ar, comprei os ingressos. O anúncio da participação do Pavement — que pelo visto quem viu, viu, que não viu, não verá nunca mais — tornou a decisão inevitável, e o do Hurtmold, se não acrescentou nada a esta motivação do agora-ou-nunca gerada pela presença das duas bandas amigonas, ao menos tornou a coisa toda mais justificável pela via da música mais arejada.

Minha escalação particular era, então, Hurtmold, Pavement e Smashing Pumpkins. As muitas horas de intervalo entre estas apresentações foram sofridas, mas o sacrifício compensou, no fim das contas. O tempo ajudou: nem chuva, nem sol escaldante. Ter encontrado alguns amigos teria tornado a coisa mais agradável, mas alguns loucos ficaram lá na frente do palco do Pumpkins desde cedo, outros chegaram mais tarde, desencontros gerais. Mas, depois de ver um trecho do Mombojó, banda que gosto moderadamente, finalmente os paulistas do Hurtmold estavam no palco. O show foi bem bacana, com músicas que me pareceram todas inéditas — nada do meu disco preferido, o Mestro, muito menos dos discos anteriores. 

Hurtmold

Sem problemas: Hurtmold é fantástico, das minhas bandas preferidas, e não falo só em termos regionais. Pouca gente parecia entender o que ocorria ali no palco e o ambiente não deve ser mesmo o mais adequado ao som da banda, mas, num esforço de abstração, eu consegui curtir o show. É percussão, clarinete, xilofone, baixo, guitarra, entre outros, a serviço de uma sonoridade jazz-rock (acho que dá de falar isso sem soar pedante, não?) afiada, exata. Muitas vezes uma música começa e ficamos naquela expectativa de um crescendo, de algum assalto elétrico à la post-rock, mas tudo vai caminhando plácido e consciente, ritmo e melodia perseguindo-se e entendendo-se constantemente, à exceção de um ou outro arroubo percussivo, o que também os aproxima das tradições musicais brasileiras e africanas, toque distintíssimo num já muito rico caldo sonoro. Longa vida ao Hurtmold — espero que este tenha sido só o primeiro de muitos shows dos caras que eu ainda verei (ainda que morar em Florianópolis não ajude muito nisso).

Na sequência veio o Holger, ocupando o palco deixado pelo Hurtmold, que saiu aplaudido sem grandes convicções, compreensivelmente. Tinha uma curiosidade de assistir ao Holger pois gostei do disco deles que a Trama colocou de graça na internet, mas o show começou e, apesar das músicas legais mesmo, as palhaçadas da banda sobre o palco foram tirando minha paciência, e quando tocaram um trechinho de Hey, do Pixies, eu já estava numa lanchonete ali perto fazendo o lanche da tarde.

Depois, hora de migrar pro palco principal, para arrumar um lugar bacana para ver o Pavement. Algum tempo esperando e finalmente, ainda com a vinheta de apresentação da próxima atração rolando nos sons e nos telões, a mítica banda sobe ao palco. Stephen Malkmus se apresenta, diz que a banda é da América, começa com “go back…”, interrompe, esclarece dizendo que é da porção setentrional da América, retoma Gold Soundz e o show começa. Achei muito bom — a distância entre Malkmus e os demais é evidente, a ponto do cara dar uns passos pro lado oposto ao da banda quando sua participação vocal finalizava, mas os clássicos foram se sucedendo em ótimas execuções, o resto da banda se esforçando, Nastanovich se esgoelando, Malkmus fazendo a parte dele, e assim transcorreu o, ao que tudo indica, único show do Pavement no Brasil em sua história, pois parece que, terminada esta turnê de reunião, a banda se desfaz definitivamente.

Stephen Malkmus (Pavement)
 
Sobre o setlist basta dizer que foi impecável, e o público me pareceu bastante satisfeito ao fim da apresentação da banda. O que seguiu-se, no fim de Here, não foi a maior ovação que eu já presenciei (seria o excesso de camisetas ZERO no público?), mas a banda agradeceu efusivamente, Malkmus despediu-se sugerindo ao público, com sorrizinho maroto, que aproveitasse o show do Smashing Pumpkins (foi a segunda citação à banda de Billy Corgan na noite — antes, é claro, tocaram Range Life), e foi isso aí. O Pavement foi uma banda que eu demorei para a apreciar devidamente, só recentemente eu percebi a preciosidade que são todos os cinco discos da banda — antes, eu ouvira com atenção só mesmo o Crooked Rain, Crooked Rain, e sempre voltei a ele com regularidade, mas hoje meu respeito pelo legado dos caras é altíssimo, e, ao fim do show, eu já estava plenamente satisfeito com a ida ao Terra.

Então sobem ao palco Billy Corgan e seus empregados. De uma perspectiva pessoal e egoísta, essa ressurreição do Pumpkins se justificou por essa oportunidade enfim aproveitada de ver ao vivo a reluzente cabeça por trás do meu disco preferido. Portanto, no que dependesse de mim, Billy poderia agora sepultar novamente o grupo, deixá-lo enfim descansando em paz, aproveitando que seu legado fonográfico não está ainda irremediavelmente comprometido, e prosseguir daí em diante numa carreira solo que pode sim ser bacana, digna. Porque o que vem produzindo-se em estúdio sob a alcunha Smashing Pumpkins, se eu não chego a achar totalmente ruim, é, na minha opinião, evidentemente bastante deficiente em comparação ao legado que a notabilizou. Pois o Pumpkins criou, em sua maturidade, em seu período de relevância, músicas eternas, geniais, inesquecíveis, coisas realmente transcendentes. Foi isso que aprendemos a esperar deste nome. E hoje a distância é enorme, e não dá de se acostumar com isso. Não se discute Billy Corgan compor e gravar suas canções pelo resto da vida — eu serei um que, certamente, irá ouvi-las todas sempre, nem que seja uma única vez —, mas sim, reconhecer limites, fases, etapas, começo, fim. Sintonia, desapego, humildade. Mas, enfim, são só opiniões de alguém que nutre incomensurável admiração pelo legado Pumpkiniano e não consegue evitar, mal acostumado que foi, de projetar nesta nova encarnação da banda certos ideais aparentemente defasados, não mais possíveis. E, por isso, a decepção. Paro essa reflexão por aqui, mas sei que tem muito fã que me entende.

Ao que interessa, pois: o show. Mas alguns minutos adentro, pois a abertura com The Fellowship e Lonely is the Name foi quase nula, vazia de qualquer substância. Today, finalmente, abre os trabalhos, mas sem engrenar plenamente: Billy parece tocar com alguma resignação os clássicos, algo desanimado em ver que eles despertam euforia e uivos mesmo após tê-los tocado já tantas e tantas vezes. Enquanto que as novas, conforme já opinei, não se sustentam, mas recebem de seu compositor alguma empolgação, o que por sua vez deve compungi-lo ao não vê-la espelhada no público. O careca mostra também empenho em solos desnecessários, em tocar o hino dos EUA com os dentes num prolongamento da fraquíssima United States (eu até acho o Zeitgeist escutável, mas essa faixa de intenções épicas à la Silverfuck e Thru The Eyes of Ruby é tão aquém destas duas que fico até constrangido de colocá-las na mesma frase) que depois é prolongada mais ainda com um trecho de Moby Dick numa jam calculada e asséptica, cuja ironia ou eu não entendo ou está algumas décadas atrasadas.

Para não ser injusto: das novas, Astral Planes soa majestosa, trampo de guitarras que te pega pelo pescoço e afeta o raciocínio — não é uma música ruim, mas não é melhor do que, por exemplo, The Everlasting Gaze, para citar outra pesadona que também não faz lá muito minha cabeça, em contraponto a uma Bodies, por exemplo. A Song of a Son é bacaninha, mas o que ela tem a dizer perto de uma Drown? Sim, rolou Drown, umas das minhas preferidas, e também Zero, Cherub Rock e Stand Inside Your Love. Mas terei sido o único a perceber esta contrariedade de Billy nas canções antigas? Sei lá — ao menos, ela é amenizada numa tentativa de bom relacionamento com seus parceiros de palco, a D’Arcy morena, o guitarrista coadjuvante e Daniel Sam na bateria, e mesmo tendo faltado inúmeras, dezenas, de outras (nem 1979, Billy Ronaldinho?), o Smashing Pumpkins novo é isso aí, tá de bom tamanho para as minhas estrategicamente diminutas expectativas.

Enfim, não foi um show fracassado, tampouco ótimo, mas mediano, algo burocrata nas revisitações de seu catálogo da década passada, com Billy vez ou outra se esforçando em legitimar a coisa toda e chegando a causar alguma compaixão com sua causa, que não durava muito, sob a luz de uma racionalidade que eu não deixo me escapar nunca (ou quase nunca). E se com a insistência nas novas composições a coisa não chega a soar de todo desonesta, fato é que eu preferiria estar ali assistindo algo com um nome diferente, ou uma carreira solo, e quem sabe até umas releituras de Pumpkins seriam bem-vindas, como quando o Paul McCartney tocou, na noite seguinte, não muito longe dali, vários clássicos do Beatles.

Mas era o Smashing Pumpkins no palco e, de um jeito ou de outro, objetivo pessoal cumprido. Quero dizer, não antes do bis com Heavy Metal Machine, um desfecho emblemático: uma música quadradona, antítese do melhor Pumpkins e tão insignificante perto de tantas outras do catálogo, fecha o show e nivela mais para baixo os espíritos que até justamente elevaram-se, nostalgicamente, com uma mais emocionante execução de Tonight Tonight minutos atrás. Tonight Tonight, o ponto alto do show para mim, e uma música tão sublime que eu posso até acreditar que nem o Roberto Carlos cantando pode estragá-la. Mas o show termina com Heavy Metal Machine mesmo, os três prestadores de serviços saem e Billy fica sozinho no palco, agradecendo modestamente a seus súditos — “desculpem-me, mas só assim para trazê-los todos aqui”, é o que eu ouço ele pensar. Pois é. Agora, pelo menos, eu posso dizer: eu vi o Smashing Pumpkins. Ou o mais próximo disso que poderíamos ter em 2010.



Set list do Pavement: Gold Soundz; Grounded; Perfume-V; Stereo; Date With IKEA; Unfair; Shady Lane; Starlings Of The Slipstream; Kennel District; Conduit For Sale!; Rattled By The Rush; In The Mouth A Desert; Summer Babe; Cut Your Hair; Stop Breathin’; Spit On A Stranger; Silent Kid; Frontwards; Range Life; Two States; Here.

Set list do Smashing Pumpkins: The Fellowship; Lonely is the Name; Today; Astral Planes; Ava Adore; A Song for a Son; Bullet With Butterfly Wings; Tarantula; United States (The Star-Spangled Banner / Moby Dick [Led Zeppelin]); Spangled; Drown; Shame; Cherub Rock; Zero; Stand Inside Your Love; Tonight, Tonight; Heavy Metal Machine.


* Fabrício Boppré, camarada e contribuidor do Depredas, é o criador do Portal Dying Days, o antigo e o novo. Cole lá!

domingo, 19 de dezembro de 2010

<<< 10 de 2010: Supergrama Reloaded >>>


 #4

THE HOT RATS
"Turn Ons"

Mal tinham saído da puberdade e os pirralhos anfetaminados do Supergrass já tomavam de assalto as paradas com o delicioso bubblegum beatle-punky de "Allright". O hit, carro-chefe do delicioso e desavergonhado I Should Coco (1995), acabou tornando o Supergrama um one-hit-wonder dos mais memoráveis dos anos 90. Quem foi esperto de ir conferir os álbuns na íntegra, porém, pôde descobrir que o revólver do power-trio inglês não tinha aquela única bala no tambor e que a banda brigava pau-pau com o Oasis, o Blur e o Verve pelo posto de maiorais do Brit-pop.



Atirando pra todo lado, o Supergrass reverenciava o punk-pop de Buzzcocks e Undertones, a psicodelia sessentista dos Kinks e da coleta Nuggets, a fase glam de Bowie e do Roxy Music, dentre miríades de outras referências, sempre transbordando vitalidade juvenil, melodias ganchudas e refrões de tirar o sono do ouvinte. Após o debut, três pepitas deliciosas vieram na sequência - In It For The Money (1997), Supergrass (1999) e Life On Other Planets (2002) - antes de um certo mergulho numa sofisticação quase prog (Road To Rouen, 2005) e um retorno à jovialidade power-pop com Diamond Hoo Ha (2008).

Neste 2010, Gaz Coombes (vocal) e Dan  Goffey (batera), que com estes nomes podiam ser personagens de tirinhas humorísticas  do Angeli ou do Laerte, voltaram a dar o ar de sua graça. Enquanto Mick (o outro terço do Supergrass) se recupera dum capote que lhe arregaçou a coluna, Gaz & Dan montaram um projeto paralelo só pela curtição de tocar músicas que adoram. Juntaram-se ao renomadíssimo Nigel Grodrich (produtor de Ok Computer e The Soft Bulletin, dentre outros recentes clássicos modernos), pegaram o nome emprestado do fodástico LP de Zappa e gravaram um discaço de covers, semelhante ao que fez David Bowie em Pin-Ups.

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Eles andam chamando esta brincadeira de "punk psicodélico", mas pode chamar também de garageira-chic, retrô-sem-pudor ou reciclagem hedonística. Os caras não tiveram medo da mistureba: selecionaram um hip-hop dos Beastie Boys, um lisérgico bicicletismo do Floyd fase Syd Barrett, uma cacetada pós-punk do Gang Of Four, boniteza delicada do Roxy Music...

Mas não é uma gororoba indigesta o que sai desta mescla, mas um a iguaria fina: um álbum que parece feito por dois amantes entusiásticos da música pop, e com um conhecimento enciclopédico dela. Enquanto aguardamos pelo retorno do Supergrass, nada melhor do que curtir este passeio da dupla Gaz e Danny por  suasprediletas-da-casa, relidas e reinterpretadas com classe, desencanação e tesão de sobra. The kids are allright!


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01. I Can't Stand It (The Velvet Undergroud)
02. Big Sky (The Kinks)
03. The Crystal Ship (The Doors)
04. (You Gotta) Fight For You Right (To Party!) (Beastie Boys)
05. Damaged Goods (Gang Of Four)
06. Love Is The Drug (Roxy Music)
07. Bike (Pink Floyd)
08. Pump It Up (Elvis Costello)
09. The Lovecats (The Cure)
10. Queen Bitch (David Bowie)
11. E.M.I. (Sex Pistols)
12. Up The Junction (Squeeze)
13. Drive My Car (Beatles)








sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

<<< 10 de 2010 >>>



#5

BLACK CROWES
Croweology


É na estrada que o Black Crowes se sente mais em casa. Que o diga "Wiser Time", uma das mais lindas baladonas de Amorica, um hino em celebração da vida errante, cigana, boêmia, que louva o estilo-de-vida pé-na-estrada de quem sai em busca de tempos mais sábios. Eddie Vedder fez um excelente serviço com a trilha original de Into the Wild, mas "Wiser Time" também seria um belíssimo pano-de-fundo sonoro para as aventuras de Alexander Supertramp, no Alaska e além...

 Mas 20 anos vivendo à la Easy Rider, até para o mais entusiástico hippie, é algo um tanto desgastante. Chega uma hora, lá por perto dos 50, em que os cabeludos, depois de alguns milhões de quilômetros rodados e alguns milhares de miligramas de ácido ingeridos, escolhem tirar um descanso da vida de rolling stone pelas ladeiras do tempo... They choose to settle down. Começam a sonhar com a serenidade de uma cabana de madeira no bosque, lotada de vinis e violões, onde viver só fumando um baseado e ouvindo clássicos do Grateful Dead ou da The Band. "Who could ask for anything more?"


Tenho quase certeza que este é o fim da linha. Os irmãos Robinson dizem estar entrando num hiato (palavrinha cada vez mais recorrente: vide Los Hermanos e Sleater-Kinney....), mas suspeito que é só para que o pranto dos fãs não seja histérico, inconsolável. Eles dizem "hiato" e com isso nos dão de lambuja a esperança de um retorno, sabe-se lá quando. O fato é que ficaremos sem os Black Crowes por um punhado de anos, mas com um belo legado a explorar, re-ouvir, re-curtir, re-amar.

Como presente de despedida, os caras gravaram para os fãs este delicioso duplaço Croweology, com 20 das melhores canções da banda rearranjadas num classudo formato semi-acústico. Digamos que é o equivalente de um MTV Unplugged, mas realizado sem quaisquer obrigações contratuais com grandes emissoras de TV ou interesses corporativos. Liberdade não falta para que a banda encare long-distance-trips: 3 faixas tem mais de 9 minutos de duração, e apenas uma acaba em menos de 4'. Os Crowes aqui planam no ar com tranquilidade, sem pressa, viajando nos trilhos da memória e curtindo-se no processo de gerar curtição. Share the ride!

Talvez seja preciso já ser admirador de longa data da banda para enxergar este álbum pelo que ele é: um rico tesouro que nos deixam alguns amigos queridos antes de darem aquela sumida no mundo. Desde o primeiro play em Croweology, eu abri meus ouvidos para o que viria não com desconfiança, senso crítico, como um júri na frente de um réu, mas com o amplo afeto que os Crowes já me conquistaram. Neste disco, they preach to the converted. E eu, faz tempo, sou assecla entusiasta deste culto sem deus cuja única igreja é a estrada, cujo único messias é o som e cuja única pregação é em prol da paz, do amor e de uma rock'n'rolling soul...

Aqui pára, por hora, a caravana hippie'n'roll dos Crowes. Ao invés do pranto, prefiro a alegria por terem existido. Let's wave goodbye. And let's keep on playin' these songs!



<<<< disco 1  - disco 2 >>>>




(Assista em 360p para uma experiência estética completa!)


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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

<<< Proyecto Finlândia >>>


HERMANADOS

- Em mais uma edição de La Bomba Latina, colocamos Brasil e Argentina no mesmo time: é o duo Finlândia, que mescla gêneros latino-americanos e música eletrônica -


Nos gramados onde rola a gorduchinha, a rivalidade Brasil x Argentina é pra lá de lendária. Que o digam os torcedores esmeraldinos, que prantearam recentemente a derrota do Goiás para o Independiente na finalíssima da Copa Sul-Americana. No universo dos ritmos e melodias, no entanto, os rivais podem facilmente se tornar aliados. Afinal de contas, notas musicais não respeitam fronteiras e podem irmanar pessoas das mais variadas latitudes, que passam a pulsar juntas na mesma batida.


Um bom exemplo é o Proyecto Finlândia, que une o argentino Mauricio Candussi (acordeom, teclados e programação eletrônica), ex-integrante do Los Cocineros, e o brasileiro Raphael Evangelista (violoncelo e guitarra), músico da Orquestra Filarmônica de São Paulo. Esta dupla viajada, que já tocou em vários países latino-americanos (Chile, Bolívia, Peru, dentre outros), lançou em 2010 seu álbum de estréia, Nandhara (disponível na íntegra para dowload gratuito em seu site oficial).



Este “duo que vale por mil”, como escreveu Ligia Francilino em seu blog na MTV Brasil, procura mesclar estilos musicais típicos da Argentina e do Brasil com beats eletrônicos que lembram o som do Four Tet, do Flying Lotus e das bandas do selo Warp.
Riverbreeze

Em declaração à Folha de São Paulo, Evangelista esclareceu a proposta estética do Finlândia: “Para muita gente, Argentina é tango e Brasil, samba e bossa nova. Porém, existem muitos outros ritmos que incluímos no projeto: na parte brasileira, o baião e o frevo; já na argentina, a milonga e o chamamé.”

O público goiano já pôde provar desta mistura no festival Release Alternativo, em Novembro, e nesta quinta-feira, 16/12, a Fósforo Cultural traz novamente à cidade o instigante groove do duo latino-americano. A abertura ficará a cargo da Riverbreeze, ex-Travellers Inn, banda goiana que faz um indie-rock modernoso influenciado por Killers, Strokes, Franz Ferdinand, Muse e Foals, dentre outros.

Cole lá!

<<< d >>>
(inclui EP Extension)



FÓSFORO CULTURAL APRESENTA
Festa La Bomba Latina com FINLÂNDIA e RIVERBREEZE
16/12/2010. Quinta-Feira. R$ 10. 22hs.
No Metrópolis: Avenida 83, Nº 372, Setor Sul. Goiânia/GO. (62) 30874927
Sorteio de ingressos no twitter da Fósforo. Siga e retuite: @fosforocultural

domingo, 12 de dezembro de 2010

<<< 10 de 2010 >>>

# 07

G.B.H.
"Perfume and Piss"

"Perfume and Piss makes it clear that old punks don't have to burn out or fade away, they can just keep on rocking until they drop.JAMES ALLEN, AMG All Music Guide

No código penal britânico, G.B.H. é sigla para "Grievous Bodily Harm", algo como "Dano Corporal Cabuloso". É por este crime que um sujeito seria processado se enchesse alguém de porrada até reduzi-lo a farelo - ou um monte de ossos fraturados. Apologia da violência? No caso dos veteranos do punk inglês (Charged) G.B.H., com quase 30 anos com os amplificadores no talo, não se trata de fazer o elogio da violência gratuita, mas sim de uma violência bem dirigida e focalizada, mais artística que literal, mais sônica que armamentista: o pacifismo gandhiano é insuficiente para vencer os imperadores tiranos, parece dizer o G.B.H., mas talvez possamos confrontá-los com guitarras! They enrage to engage.

Com mais de 10 álbuns de estúdio (e mais um punhado de ao-vivos) no catálogo, o G.B.H. fez em Perfume and Piss um discaço de punk rock que só mesmo uma banda veterana, cheia de garra e extremamente segura de si poderia fazer. Uma das primeiras coisas que salta aos ouvidos é o sabor altamente rancidiano do disco, o que não é de surpreender, já que o G.B.H. foi uma das principais influências para a banda de Tim Armstrong e Cia. Agora Colin Abrahall e sua turma retornam o presente e gravam um comeback triunfante que honra o espírito do Rancid, coisa que os próprios não conseguiram fazer tão bem no ano passado, quando soltaram, após 6 anos de silêncio, Let The Dominoes Fall, disco que achei meio morno em comparação com a incandescência dos clássicos ...And Out Come The Wolves (1995) e Life Won't Wait (1998).

Se o mais recente álbum do Rancid tinha me feito concluir que é quase impossível que uma banda punk chegue à beira dos 20 anos de pogo e berro sem perder um pouco do gás, o novo do G.B.H. chegou para provar o contrário: que um bom punk sempre encontra a força para voltar a ser um vulcânico jorro de energia juvenil e indignação sadia. Está aí muito do meu afeto e empolgação por estas perenes Fontes da Juventude que são Rocket to Russia, Raw Power, London CallingBlank Generation, Kick Out The Jams!, Nevermind the Bollocks, Zen Arcade, Fresh Fruit For Rotting Vegetables, Nevermind, dentre tantos outros... É só dar um play  neles e sentir a juventude voltar a correr pelas veias, sentir o sangue renovar-se, veloz como um gabba gabba hey!

Por isso gosto de pensar que o punk ensina não exatamente o "live fast, die young!", mensagem muito niilista e auto-destrutiva, mas algo muito mais positivo: "be young your whole fucking life!". Ao invés de morrer jovem e deixar um belo cadáver (para usar a expressão de Oscar Wilde), por que não procurar ser um velhinho com energia de moleque, com pilhas sempre renovadas? A efervescência da juventude pode até parecer tão efêmera quanto uma palhetada de Johnny Ramone; mas seus frutos, por vezes, são tão imortais quanto "Rockway Beach" ou "God Save The Queen".

* * * * * 


O G.B.H. sobrevive desde 1979, tendo participado da primeira onda do hardcore britânico (que contou ainda com Varukers, Exploited, Discharged, dentre outros). São eles os legítimos "last ones to die" e "indestructibles" de que falam as canções do Rancid.

Apesar de citados como uma das primeiras bandas a tentar o crossover entre punk e metal que gerou o thrash e o speed metal,  e apesar de terem conseguido influenciar tanto o Slayer quanto o Rancid, o G.B.H. é bem mais do pogo do que do headbangin', como prova o moicanão de Colin Abrahall. 
"There aren't many first-generation British punk bands that have stayed the course all the way up through the 2000s, and it's striking how much furious energy still leaps out of the band's guitars, drums, and throats on Perfume and Piss. Perhaps most impressive is the fact that G.B.H. have stayed close to their original aesthetic -- Perfume and Piss isn't watered down by any attempts at "maturity" or "sophistication" -- two words that spell death for street punks." --- AMG ALL MUSIC GUIDE
 Perfume and Piss é um álbum mais rancidiano e cláshico do que qualquer outro que eu tenha ouvido neste ano, o que se explica fácil: Lars Frederiksen ficou responsável pela mixagem e o disco foi lançado pelo selo Hellcat da Epitaph (co-fundada por Tim Armstrong), o que basta para rancidificar o climão do álbum. Além disso, o álbum traz uma homenagem póstuma a Joe Strummer ("San Jose Wind", quase uma elegia fúnebre em ritmo punk-77 dirigida ao falecido líder do The Clash, cujas cinzas foram espalhadas pelo vento da cidade espanhola de San Jose).

Como era de se esperar, o disco é pedrada pra todo lado: contra o terrorismo islâmico (em"Invisible Gun"), contra os reality shows ("This Is Not The Real World"), contra os presidentes genocidas ("Cadillac One") e, claro, contra baladinhas água-com-açúcar ("Ballads", que reclama pelo retorno da "teenage angst" bradada em alto e bom som e pelo fim das cancionetas de amor mela-cueca). 

 "All I can smell is perfume and piss!!!", esbraveja o G.B.H. na faixa-título.  Eu pensava que estavam se referindo, é claro, àquelas criaturas odiáveis que borrifam perfume pelo ambiente para que ninguém perceba que mijaram no chão: os políticos, esta raça que domina a arte do kitsch e maquia suas pilantragens com maquiavélicas artes de perfumaria... Que Estado neste mundo não fede a perfume francês? Queremos um Estado que feda a suor proletário!

Mas o próprio Colin, no encarte e em entrevistas, garante que "perfume and piss" é algo mais que uma botinada nos poliqueiros: é uma metáfora para a vida e sua mescla de bem e mal, perfume e fedor, maravilha e horror, elementos sempre em dialéticas transações. "Every dark cloud has its silver lining, and vice-versa", comentou o vocalista do penteado porco-espinho. Muito bem dito.

"You've got the power to throw the bomb / You can blow us all to kingdom come", cantam em "Cadillac One". E aqui se escancara que o inimigo contra quem se volta a fúria da música do G.B.H., é claro, são estes com poderes para lançar bombas, dizimar vilas, empilhar civis, incendiar histórias. O G.B.H. vem com seus riffs-molotov e seus rifles-refrões para nos ajudar a nos livrar tantos destes bombermen do Império, quanto dos sanguinários terroristas com o dedo no gatilho das invisible guns. E como fazem muito mais barulho, literalmente falando, do que uma palestra de Noam Chomsky!

Já "Power Corrupts" podia muito bem ser um hardcore inspirado por Dogville, o clássico brechtiano de Lars Von Trier. Só que o G.B.H., é claro, é bem menos intelectualizado que o cineasta dinamarquês, e ainda mais selvagem. Estes brados de Birmingham a respeito dos efeitos corruptores do poder, saturados dum anarquismo escancarado e desavergonhado, são chutes-na-porta mais que argumentos lógicos. 

Mas quem foi que disse que um chute-na-porta não possa ter sua lógica?

Seja bem-vindo ao punk rock pé-na-porta e polícia-pra-fora, que berra com plena convicção sua certeza de que para a corrupção ser diminuída, só há um meio: que o poder seja melhor distribuído. Pois poder absoluto corrompe absolutamente. Que os megalomaníacos e control freaks tomem um chute na bunda, para fora do trono, e fiquem na deles, ao invés de segurando o remote da bomba atômica...

Enfim: ouvir um álbum primoroso como Perfume and Piss é um excelente lembrete não só da vitalidade perene do movimento punk, mas do quanto o punk é o mais urgente de todos os estilos musicais já inventados por humanos: pois é fruto daqueles que são plenamente conscientes da urgência de agir contra as desigualdades sociais, autoritarismos escrotos, costumes sociais "quadrados" e outras desgraceiras que impedem a pedra de seguir rolando adiante, sem juntar limo...


<<< d >>>

"There isn't a self-respecting gutter punk, hardcore kid or subcultural miscreant alive who hasn't seen the GBH logo emblazoned on the back of a leather jacket, a denim vest, or a torn-up t-shirt. And now the world  will be slapped upside the head with another reminder as to exactly why GBH is so important, in the form of Perfume and Piss, the legendary and iconic punk band's first album for Hellcat Records. Barn-burning, fist-pumping, palace-gates-storming tracks like "Kids Get Down," "Cadillac One" and "This is Not the Real World" carry the torch forward with the band's trademark fury that is alternately nihilistic, optimistic, pessimistic, anarchist, violent, humorous and deadly serious all at once." - Facebook 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

<<< Rola, Pedra, Rola! >>>


No ano do 50º aniversário de nossa capital federal, a grande caravana da cultura independente brazuca continua seu festório --- depois do Goiânia Noise e do Calango (Cuiabá), agora é hora da Esplanada dos Ministérios ser tomada de assalto.

 É o Rolla Pedra 2010, que vai reunir 50 bandas em 3 dias de festival, com destaque para os redivivos Little Quail & The Mad Birds e Plebe Rude, bandas brasilienses que já foram do primeiro escalão e que agora ensaiam um retorno triunfal. (No Goiânia Noise 2010, Phillipe Seabra, vocal da Plebe, tocou com os gaúchos do Superguidis... foi mais ou menos assim).

Não poderia faltar, também, a mais bem-sucedida prata-da-casa dos últimos anos, o Móveis Coloniais de Acaju, que lança seu primeiro DVD e fecha  a noite de sábado. Dentre as atrações locais, eu destacaria o quinteto de death-metal Estamira: 5 minas que fazem um barulho da peste e que fizeram um dos shows mais aplaudidos do Porão 2010.

Estamira, no Porão do Rock 2010,
depredando o público brasiliense com seu som podreira.

Esse é pra fazer tremer nos alicerces os prédios dos ministérios, para descabelo dos politiqueiros...

E o melhor: é tudigrátis. Mas leva aquele quilinho de alimento não-perecível que o Brasil agradece (se não me engano, só o Porão do Rock, somando todas as suas edições, já coletou mais de 70 toneladas de comida para minorar o ronco no estômago do povo brasileiro...).

Tae a programação completa:

click para aumentar

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

<<< 10 de 2010: nossas bolachas prediletas do ano >>>



 #08

CORIN TUCKER BAND
"1.000 Years"


Após o lançamento do épico The Woods (Sub Pop, 2005; que disco do caralho!), o Sleater-Kinney decidiu fechar as cortinas vermelhas de seu teatro punk e entrar em hiato por tempo indeterminado. Foi a despedida (tomara que temporária!) de um dos mais geniais luminares do movimento Riot Grrrrl. Mas também o canto-de-cisne de um power-trio que tinha transcendido rótulos e gêneros redutores para se tornar uma das instituições sônicas mais respeitáveis (e adoráveis!) da América nos terríveis tempos de Bush Jr.

Fiéis à ética underground que preza por independência expressiva em face do corporativismo neoliberal, e patriotas mais da nação universal do Rock'n'roll  do que de um país endoidecido com um patriotismo fundamentalista, as garotas do Sleater-Kinney não sabiam separar expressão artística e ativismo político, música e transformação cultural. Mas sem jamais cair no panfletarismo, no dogmatismo, na demagogia ou na chatura. "A revolução não será televisionada", dizia Scott-Heron. E o riot-grrrl adicionava: a revolução será musicada, ritmada, festeira, ruidosa, cheia de melodia, revitalizando a sociedade com as potências vivificantes da música... E tão revolucionária das sensibilidades e das consciências quanto das instituições políticas. 

"I see myself as an artist and musician first and foremost", declarou um dia Corin Tucker, "but I believe that the political climate affects us all in some way, especially now. I've always seen things from a feminist, leftist point of view, and the current ultra-patriotic national fever chills me to the bone." 

O Sleater-Kinney, que em seus primeiros anos podia até ser tido como só mais um espécimen no balaio do "punk-de-menininha", vociferando sobre feminismo e convidando ao ativismo indie (e de modo não muito distinguível do que faziam na época o Bikini Kill e o Bratmobile), tinha se tornado em seus últimos anos uma das bandas alternativas mais respeitadas e cultuadas dos EUA. E com todo o mérito. Abriam shows para o Pearl Jam, tocavam no David Letterman e soltavam álbuns primorosos  --- como One Beat (2002), que considero, sem sombra de dúvida, uma das melhores coisas que a música americana produziu na década passada.

Depois que escolheram entrar de férias, cada uma das três Sleaters prosseguiu com seus projetos: Carrie Browstein prosseguiu em plena efervescência como uma espécie de ativista da cultura independente, fazendo experimentos com cinema e escrevendo o excelente blog Monitor Mix; Janet Weiss continuou tocando bateria no Quasi e depois foi integrar a banda de apoio de Stephen 'Pavement' Malkmus; e Corin Tucker foi ser mamãe por uns anos, para retornar neste 2010 com 1.000 Years, seu primeiro álbum-solo.

Seria desleal da nossa parte, fãs do Sleater-Kinney, exigir que Corin conserve o mesmo gás juvenil que demonstrava quando cantava "Quero Ser Seu Joey Ramone", lá pelos idos de 1996, agora que beira os 40 e tem 2 filhotes (virou uma legítima Rock'n'Roll Mama, que marcou até presença num documentário sobre roqueiras que arriscaram-se nos domínios frequentemente punk da maternidade...). Também não dá para pedir que a interação com os membros de sua nova banda chegue perto da magnífica harmonia e espírito colaborativo que ela tinha junto de Carrie e Janet.


Mas, de modo geral, o álbum de Corin é sereno, maduro, expressivo e muito simpático, ainda que bem modesto em suas pretensões. 1.000 Years tem uma clima relaxado, como se tivesse sido gravado num confortável estúdio caseiro, onde as guitarras disputavam espaço com os carrinhos de brinquedo e as mamadeiras. A instrumentação, apesar de rica, é discreta: um belo piano introduz "Thrift Store Coats", que soa como uma canção de The Hot Rock (outro disco lindo...), e belos violinos fazem de "Dragon" quase um quarteto-de-cordas em miniatura. A voz de Corin, porém, ganha licença neste álbum para ir ao primeiro plano e contentar nossos tímpanos com sua inefável beleza: "Miles Away" é uma balada bonita de chorar; "Doubt", um punk-pop bubblegum pra pogar-sem-pudor; e o resto... é tão fofo quanto o Belle & Sebastian e tão dinâmico quanto uma batida de Marky Ramone.

Não sei ao certo como este disco será sentido e julgado por alguém que não tenha tido, como eu, um vasto relacionamento de afeição duradoura e admiração alegre pelo Sleater-Kinney, uma banda que amo do fundo do coração (a ponto de fazer a ela declarações sentimentais saturadas de pieguice...). Talvez o ideal, antes de encará-lo, seja dar um passeio pelos álbuns de sua banda-matriz, ou pelo menos por algumas das canções do Sleater que mais se parecem com estas da carreira solo (fiz uma seletinha de 3 delas aí embaixo....). Pra mim, que considero Corin Tucker mais com os olhos benevolentes do coração do que com o juízo crico da racionalidade, 1.000 Years é um disco que me traz o tipo de contentamento que sentimos ao reencontrar uma velha amiga, com quem trocamos altas idéias anos atrás, e que animou muitas de nossas noites de fossa emocional, e que nos injetou entusiasmo em tempos de apatia, e que agora retorna para nos confidenciar sobre a quantas anda sua vida e quais são alguns dos segredos para envelhecer com tanta dignidade, tanta vitalidade e tanta beleza.






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domingo, 5 de dezembro de 2010

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#09

BLACK MOUNTAIN
"Wilderness Heart"


"In their heart of hearts, Black Mountain are really just peaceful hippies, but ones who aren't afraid to deploy heavy artillery to assert and protect their way of living" - PITCHFORK


"The children are havin' their fun with the blues". Este verso de "The Hair Song", um dos mais empolgantes singles já lançados pelo Black Mountain, serve como um bom cartão de visitas para o som dessas lisérgicas "crianças" canadenses. Mas o blues surge aqui não em seu estado primordial, como era nos tempos em que faziam-se pactos com Satanás na encruzilhada e Robert Johnson só tinha um violãozinho puído para acompanhar seus queixumes.  

O blues, em sua versão-Black Mountain, é algo como um navegante inter-estelar que pousa em 2010 depois de ter atravessado a psicodelia hippie dos 60, o metal-de-raiz dos 70,  o grunge dos 90 e o stoner-de-garagem dos últimos anos. Matematizando a coisa, eu arriscaria dizer que a banda é o resultado da soma Led Zeppelin + Soundgarden, Howlin' Wolf + Queens of the Stone Age, Black Sabbath + Black Rebel Motorcycle Club, Jimi Hendrix + Neil Young...

(Sim, sim: escolhi o jornalismo por ser mó prego em aritmética...)


Wilderness Heart, terceiro álbum da banda de Vancouver, é tão aventureiro, eclético e chapado quanto seus dois precedentes, In The Future (2008) e Black Mountain (2005), mas tem a vantagem de ser mais sintético (nada daquelas jams viajadas de 17 minutos, só curtíveis por quem tomou as drogas propícias para embarcar na onda dos caras...).
O que se destaca de imediato, além dos galopantes riffões à la Page e Iommi que recheiam boa parte das canções (com destaque para a fodástica "Roller Coaster"), é a transa certeira entre os vocais de Stephen McBean (genes-XY) e Amber Webber (XX). A beleza das melodias vocais e o modo como elas se fundem com perfeição na densa massa sonora da banda é acachapante, mesmo para um ouvinte sóbrio. E é difícil não sentir um delicioso arrepio na espinha, por exemplo, quando a linda voz de Amber canta: "I will cradle you beneath my wings / As you tremble in my warmth / I will cradle you beneath my wings / And teach you all my scorn".

Mas "blues" refere-se não só a um estilo musical, mas também a um estado de espírito --- e é este blues da melancolia e do desconsolo que impregna as baladonas soturnas que o Black Mountain nos entrega aqui: "Buried By The Blues" (o nome diz tudo...), "Sadie" (quase um lullaby) e "The Space of Your Mind" (uma espécie de tributo a David Bowie em sua fase "espacial"). Nestas faixas, a banda uiva na madrugada como nas melhores faixas do Howl, do Black Rebel Motorcycle Club, e demonstra que é tão poderosa acústica quanto elétrica. 

Agora resta torcer para que eles retornem em breve ao Brasil: quando vieram em 2008, como uma das atrações internacionais do Goiânia Noise (que naquele ano trouxe também Helmet, Vaselines e Black Lips), não tive a chance de conferi-los ao vivo.  E eis uma banda cujos álbuns me deixam afinzaço de testemunhá-los de perto gerando este chapante roller coaster de peso, blueseira, psicodelia e lirismo.



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