segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

:: os 10 melhores dos anos 60...- #07 ::

[7º]


THE BAND
"Music From Big Pink" (1968)

- por Eduardo Carli de Moraes -

Antes de soltar este clássico álbum de estréia, um dos mais poderosos e originais debuts da história do folk-rock, a The Band era célebre “somente” como a banda de acompanhamento de Bob Dylan. Foi esta A Banda que forneceu a força elétrica bruta que Bob quis adicionar ao seu som folk a partir de Bringin’ It All Back Home, seu primeiro álbum que fugiu da sonoridade exclusivamente acústica e folky e arriscou-se no reino da eletrificação e da distorção.

Os músicos da The Band – na sua grande maioria de origem canadense - já estavam na ativa desde o começo dos anos 60, tocando com o cantor de rockabilly Ronnie Hawkins com o nome de The Hawks. Uma vez instalados no Greenwich Village em meados da década, acabaram chamando muita atenção de figurinhas graúdas da cena boêmia-artística efervescente de lá, inclusive de Bob Dylan, que estava à procura de um grupo que estivesse ao mesmo tempo profundamente enraizado na cultura americana mas que ao mesmo tempo tivesse uma atitude aventureira e ousada.

Contratados como back-up band para a primeira turnê rock and roller de Bob Dylan, a The Band acompanhou o mito de Outubro de 1965 a Maio de 1966, quase sempre frente a platéias de “folkies puristas” que soterravam os músicos debaixo de vaias e tomates. Bob Dylan, na época, era tido como o Traidor do Movimento Folk de Protesto por ter abraçado a eletricidade - e a the Band, coitada, acabou acusada de cúmplice no crime.

Após o acidente de motocicleta de 1966, tornando-se subitamente uma estrela reclusa, Bob Dylan fechou-se num porão com a The Band e ai começaram suas contribuições mais antológicas – que permaneçaram inéditas por muitos anos e foram lançadas só em 1975; são as famosas e cultuadíssimas The Basement Tapes. Só o fato de terem estado no mesmo palco que Bob Dylan em momentos cruciais dos anos 60 já serviria para colocar a The Band na história do rock – eles estavam lá, por exemplo, no célebre show no Royal Albert Hall, em 1966, quando Dylan sente uma certa animosidade do público folk mais purista em relação ao barulho extremo que saía do palco e, antes do início de “Like a Rolling Stone”, faz o singelo pedido à The Band: “Play it fucking LOUD!” O mito é atendido com prontidão.

Mas foi mesmo em 1968 que a The Band se tornaria uma banda de primeira grandeza na cena rocker mundial, livrando-se do estigma de estar em segundo plano em relação à Bob Dylan. Este, porém, é uma presença espiritual e uma influência musical inegável em Music From The Big Pink. Só lembrar que Dylan aparece aqui em várias facetas: é dele a linda e lamentosa balada “I Shall Be Released”, que fecha o álbum, e a co-autoria de outras duas canções, “Tears Of Rage” e “This Wheel’s On Fire”; é dele a pintura exposta na capa do álbum; e o próprio nome do disco faz referência à casa em Woodstock onde a The Band e Bob Dylan se conheceram e começaram suas jams em meados dos anos 60 – a “Big Pink”.

“Apesar de ter sido criado por quatro canadenses e um cara natural do Arkansas, Music From Big Pink é uma peça duradoura de ‘americana’, um acontecimento dos que marcam uma época e que parecia sintetizar um século de cultura americana”, diz Andrew Gilbert. “O quinteto afundou as raízes de seu som e suas letras no solo americano usando órgãos, violinos e bandolins em vez de guitarras elétricas carregada de efeitos.”

O álbum mostra-se extremamente coeso e bem estruturado para um banda que fazia sua estréia fonográfica “solo”, por assim dizer, e o quinteto parecia muito bem sincronizado, sem que o guitarrista Robbie Robertson chegasse a representar neste início o papel de líder que cada vez mais assumiria na sequência. Robbie comenta que modificou bastante seu estilo de tocar e sua estética musical na época do parto de Music From The Big Pink – saíram os solos de guitarra ruidosos e tocados com ira e vingança que ele tanto apreciava na juventude (“eu tocava guitarra como se estivesse com ejaculação precoce”, comentou sobre sua abordagem urgente e frenética do instrumento em tempos idos), dando lugar a algo mais doce, atmosférico e etéreo, com riffs “à la Curtis Mayfield”.

Já os vocais gritados e/ou grunhidos foram preteridos em prol de uma cantoria mais suave e uma harmonização mais mansa entre o vocal principal e os de apoio. A decisão de iniciar o álbum com uma música lenda e arrastada, com respingos de melancolia, era já uma originalidade digna de nota na época: “Tears Of Rage” tinha a intenção de ser um cartão de visitas provando ao mundo que estavam diante de uma banda tremendamente original. Já a clássica “The Weight” tornou-se um dos hinos tardios dos anos 60, utilizada com efeitos encantadores na trilha sonora de um dos filmes mais quentes da época – Easy Rider, de Dennis Hopper.

Nas letras de Robbie Robertson consegue-se notar o efeito da convivência com Dylan, cujo trabalho poético influenciou a “escolha temática, a construção formal e a imagética” de Robertson – suas letras tornaram-se menos diretas e mais misteriosas, moldadas com um esmero dylanesco que nunca soava como pastiche ou imitação barata. Robbie admite que estava fissurado também no trabalho de cineastas como Luis Buñuel, John Ford e Kurosawa na época, e tinha começado a se interessar por mitologia européia e nórdica, o que também entrou no caldo de suas influências com um peso semelhante ao de Dylan.


Assim que foi lançado, Music From The Big Pink recebeu críticas altamente favoráveis e foi entronizado por gente com opinião pra lá de respeitável como George Harrisson e Eric Clapton. O álbum passou longe de ser um sucesso de público, apesar de conter um dos maiores hits da The Band (“The Weight”), mas é reconhecido até hoje como um dos álbuns mais lindos, originais e atemporais da década de 60 – uma obra-de-arte esplêndida que o tempo não enferrujou e que revela cada vez mais encanto a cada nova ouvida.

No ano seguinte, 1969, o segundo álbum só consagraria ainda mais a The Band como uma dos mais talentosos e originais conjuntos de rock do mundo. A contribuição com Bob Dylan tornou-se um tanto mais escassa após os contágios mútuos constantes de meados dos anos 60, mas a The Band trabalhou novamente com Dylan várias vezes: foram a banda de apoio para o álbum Planet Waves; fizeram com ele uma turnê que geraria o álbum ao vivo Before The Flood; e fizeram uma aparição no show de Bob no Isle Of Wight de 1969.

Quando a The Band decidiu encerrar suas atividades em 1976, teve uma das despedidas mais chiques e inesquecíveis que uma banda de rock já teve a honra de possuir: no Dia de Ação de Graças, fizeram um show memorável ao lado de convidados de peso (além de Dylan, compareceram Neil Young, Van Morrison, Muddy Waters, Joni Mitchell, entre outros), registrado em filme pelo fã Martin Scorsese num dos melhores rockumentaries que existe – The Last Waltz. Homenagem digníssima para uma banda esplendorosa.


DOWNLOAD
(Music From The Big Pink remasterizado + 6 bonus tracks)
(mp3 de 192kps - 83 MB - 16 faixas - 1h):
http://www.mediafire.com/?7ykbftgqdeg

Nenhum comentário: