quinta-feira, 16 de julho de 2009

:: Ella! ::


ELLA FITZGERALD

por Arthur Nestrovski
(Folha de S. Paulo, 13/3/99)


"Get happy!" - nem sempre é tão fácil. A alegria é uma forma de sabedoria: toda alegria é sábia, mas nem toda sabedoria é alegre, e, se uma já é difícil, imagine-se a outra. Alegria e sabedoria se cruzam, imprevistamente, na voz dessa mulher, capaz de fazer qualquer um feliz, ou pelo menos mais feliz, se não mais sábio.

Seu nome não podia ser mais apropriado: Ella. Uma voz como essa, com todas as metamorfoses para cima e para baixo de três oitavas, escapa a qualquer definição. Toda palavra, afinal, é uma generalização, a média do significado. Mas uma voz - qualquer voz, e essa de modo mais marcante que as outras - é o que existe de mais específico no mundo: seu sentido não pode ser traduzido, embora seja muito bem compreendido. É a voz dela. Não tem descrição, mas tem nome: Ella.

Não é um acidente, então, que Ella Fitzgerald (1917-96) seja nossa maior intérprete de canções de amor. O que há de repetitivo nessas músicas, nessas letras, torna-se específico como nunca, peloa força da voz e pela inteligência da paixão. Talvez não haja outro modo mais imediato de alimentar a presença do afeto fora do próprio afeto senão nessas palavras tão engenhosamente simples e nessas melodias tão simplesmente engenhosas, que a voz dela faz flutuar no ar. Só ar no ar, afinal: que mistério é a música...

Assim como os terrores do amor não estão nunca completamente ausentes de uma alma que já se apaixonou antes, também as sombras de um passado vivido e de um futuro imprevisível cercam as canções, mesmo ali onde menos se espera. As inúmeras façanhas de scat-singing, que Ella exibe como se tivesse virado um trompete humano, ou sobre-humano, não deixam de fazer escutar um lamento entre as notas que, por sua vez, deixa escutar o quanto não foi vivido e vencido para chegar até aqui..."
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Disponibilizamos abaixo um ótimo ponto de partida para quem quer começar a se aventurar no Universo Ella: 2 CDs dElla cantando clássicos de Cole Porter. Como diz a AMG, "a striking two-CD set featuring arguably history's finest jazz singer singing some of the best-written American pop standards on one of jazz's most prolific labels." Essencial!

Um comentário:

siu ô disse...

Belo texto. Cantora agradabilíssima!