quarta-feira, 12 de março de 2008

:: Kyuss ::


KYUSS
"Blues For The Red Sun” (1992)

O SOM ESCALDANTE DO DESERTO CALIFORNIANO
Rock pesado e viajandão, guiado por uma guitarra malandramente ligada num amplificador de contrabaixo: ainda não inventaram nada parecido com Blues For The Red Sun, álbum definitivo do Kyuss

- Por José Fávio Júnior,
na Showbizz de Julho de 2001
(seção “Discoteca Básica”)

O Velvet Underground foi um grupo que, durante seu pequeno período de existência, passou quase batido. Hoje é referência para 9 entre 10 artistas indie/lo-fi. Disse um crítico americano que o Kyuss é o Velvet Underground de sua seara. Só poderemos comprovar daqui umas duas décadas, mas a tese é boa.

Formada na cidade californiana Palm Desert, a banda durou cerca de 6 anos (1990-95) e lançou 4 álbuns. A época é relativa à adolescência do guitarrista Josh Homme, que fundou o Kyuss na tenra idade de 16 anos, ao lado do baixista Nick Oliveri (que tinha 17), do vocalista John Garcia e do baterista Brant Bjork (hoje no Fu Manchu). Ele teve a puberdade dos sonhos de qualquer jovem roqueiro: terminou o colegial, viajou o mundo tocando, foi chamado de deus e, quando o lance ficou repetitivo e chato, saiu do mundo do rock, entrou na faculdade e arrumou um emprego de adulto. (Mais tarde, graças às pressões dos chapas do Screaming Trees, com quem ele tocava esporadicamente, Josh montou o Queens Of The Stone Age e se deu ao luxo de convidar Mark Lanegan, ex-vocalista do ST, para integrar seu grupo – o convite foi aceito em maio de 2001.)

Foi na turnê do álbum de estréia, o cru Wretch, que a banda conheceu seu quinto membro. Chris Goss, ex-integrante da seminal Masters Of Reality, chapou com a performance e se tornou o responsável por toda a produção do Kyuss. Aquele hard rock, ora bem lento, ora bem rápido, com muito groove e quase sempre viajandão, precisava de alguém que soubesse fazer o solo tremer na mesa de som.

Josh plugava sua guitarra Ovation UK II preta num amplificador de baixo, a afinava o mais grave possível, pisava no fuzz e saía compondo riffs turbinados com a urgência de um garoto que acabara de tirar a habilitação para dirigir. É por isso que a sequência inicial de Blues For The Red Sun, com “Thum, “Green Machine”, “Molten Universe” e “50 Million Year Trip (Downside Up)”, cheira a estrada empoeirada. O grupo, que no início de carreira (quando se chamava Sons of Kyuss) promovia grandes festas no meio do deserto californiano usando geradores, onde tocava por horas a fio, transporta o ouvinte para esse ermo. Quente, seco, duro. Mas com um suingue atmosférico quase sensual, culpa do baixo do então cabeludo e desbarbado Nick Oliveri – substituído por Scott Reeder na turnê do disco. “50 Million...” é o maior exemplo: um rock que dá vontade de balançar a cabeça e a cintura ao mesmo tempo. Depois dela vem a filosofia de “Thong Song”. “Meu cabelo é compridão / Nenhum cérebro, só músculo / (...) Eu odeio música devagar”, canta Garcia, sem a menor culpa, como que sorvendo goles de cerveja entre os versos. Das 14 faixas, apenas oito possuem letra. Existe uma preocupação muito grande com o instrumental, vinhetas e introduções, como acontece em “Freedom Run” (7 minutos e meio de psicodelia e “lesação”).

Dave Grohl,. Billy Corgan, Mellisa Auf Der Maur e muita gente boa da cúpula do rock bota Blues For The Red Sun entre os dez discos da vida (há os que preferem o abusado Welcome to the Sky Valley, com suas três suítes musicais, cada uma dividida em várias partes). Um pouco da magnitude do Kyuss pode ser medida pela qualidade das bandas que excursionaram junto: Faith No More, Smashing Pumpkins, Ween... Ver Josh tirando aquele som lindo era (e sempre será) uma experiência mais do que incandescente.

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