terça-feira, 7 de dezembro de 2010

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 #08

CORIN TUCKER BAND
"1.000 Years"


Após o lançamento do épico The Woods (Sub Pop, 2005; que disco do caralho!), o Sleater-Kinney decidiu fechar as cortinas vermelhas de seu teatro punk e entrar em hiato por tempo indeterminado. Foi a despedida (tomara que temporária!) de um dos mais geniais luminares do movimento Riot Grrrrl. Mas também o canto-de-cisne de um power-trio que tinha transcendido rótulos e gêneros redutores para se tornar uma das instituições sônicas mais respeitáveis (e adoráveis!) da América nos terríveis tempos de Bush Jr.

Fiéis à ética underground que preza por independência expressiva em face do corporativismo neoliberal, e patriotas mais da nação universal do Rock'n'roll  do que de um país endoidecido com um patriotismo fundamentalista, as garotas do Sleater-Kinney não sabiam separar expressão artística e ativismo político, música e transformação cultural. Mas sem jamais cair no panfletarismo, no dogmatismo, na demagogia ou na chatura. "A revolução não será televisionada", dizia Scott-Heron. E o riot-grrrl adicionava: a revolução será musicada, ritmada, festeira, ruidosa, cheia de melodia, revitalizando a sociedade com as potências vivificantes da música... E tão revolucionária das sensibilidades e das consciências quanto das instituições políticas. 

"I see myself as an artist and musician first and foremost", declarou um dia Corin Tucker, "but I believe that the political climate affects us all in some way, especially now. I've always seen things from a feminist, leftist point of view, and the current ultra-patriotic national fever chills me to the bone." 

O Sleater-Kinney, que em seus primeiros anos podia até ser tido como só mais um espécimen no balaio do "punk-de-menininha", vociferando sobre feminismo e convidando ao ativismo indie (e de modo não muito distinguível do que faziam na época o Bikini Kill e o Bratmobile), tinha se tornado em seus últimos anos uma das bandas alternativas mais respeitadas e cultuadas dos EUA. E com todo o mérito. Abriam shows para o Pearl Jam, tocavam no David Letterman e soltavam álbuns primorosos  --- como One Beat (2002), que considero, sem sombra de dúvida, uma das melhores coisas que a música americana produziu na década passada.

Depois que escolheram entrar de férias, cada uma das três Sleaters prosseguiu com seus projetos: Carrie Browstein prosseguiu em plena efervescência como uma espécie de ativista da cultura independente, fazendo experimentos com cinema e escrevendo o excelente blog Monitor Mix; Janet Weiss continuou tocando bateria no Quasi e depois foi integrar a banda de apoio de Stephen 'Pavement' Malkmus; e Corin Tucker foi ser mamãe por uns anos, para retornar neste 2010 com 1.000 Years, seu primeiro álbum-solo.

Seria desleal da nossa parte, fãs do Sleater-Kinney, exigir que Corin conserve o mesmo gás juvenil que demonstrava quando cantava "Quero Ser Seu Joey Ramone", lá pelos idos de 1996, agora que beira os 40 e tem 2 filhotes (virou uma legítima Rock'n'Roll Mama, que marcou até presença num documentário sobre roqueiras que arriscaram-se nos domínios frequentemente punk da maternidade...). Também não dá para pedir que a interação com os membros de sua nova banda chegue perto da magnífica harmonia e espírito colaborativo que ela tinha junto de Carrie e Janet.


Mas, de modo geral, o álbum de Corin é sereno, maduro, expressivo e muito simpático, ainda que bem modesto em suas pretensões. 1.000 Years tem uma clima relaxado, como se tivesse sido gravado num confortável estúdio caseiro, onde as guitarras disputavam espaço com os carrinhos de brinquedo e as mamadeiras. A instrumentação, apesar de rica, é discreta: um belo piano introduz "Thrift Store Coats", que soa como uma canção de The Hot Rock (outro disco lindo...), e belos violinos fazem de "Dragon" quase um quarteto-de-cordas em miniatura. A voz de Corin, porém, ganha licença neste álbum para ir ao primeiro plano e contentar nossos tímpanos com sua inefável beleza: "Miles Away" é uma balada bonita de chorar; "Doubt", um punk-pop bubblegum pra pogar-sem-pudor; e o resto... é tão fofo quanto o Belle & Sebastian e tão dinâmico quanto uma batida de Marky Ramone.

Não sei ao certo como este disco será sentido e julgado por alguém que não tenha tido, como eu, um vasto relacionamento de afeição duradoura e admiração alegre pelo Sleater-Kinney, uma banda que amo do fundo do coração (a ponto de fazer a ela declarações sentimentais saturadas de pieguice...). Talvez o ideal, antes de encará-lo, seja dar um passeio pelos álbuns de sua banda-matriz, ou pelo menos por algumas das canções do Sleater que mais se parecem com estas da carreira solo (fiz uma seletinha de 3 delas aí embaixo....). Pra mim, que considero Corin Tucker mais com os olhos benevolentes do coração do que com o juízo crico da racionalidade, 1.000 Years é um disco que me traz o tipo de contentamento que sentimos ao reencontrar uma velha amiga, com quem trocamos altas idéias anos atrás, e que animou muitas de nossas noites de fossa emocional, e que nos injetou entusiasmo em tempos de apatia, e que agora retorna para nos confidenciar sobre a quantas anda sua vida e quais são alguns dos segredos para envelhecer com tanta dignidade, tanta vitalidade e tanta beleza.






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Um comentário:

Carlos Alberto disse...

Muito bom esse vídeo, e saber dessa então novidade pra mim que é este disco de Corin, e que xá está baixado aqui. Valeu.