Funkjazzpsicodeliabossassambasoulforró
- Bernardo Santana -
Sério, se eu lesse um título desses em uma resenha um dia, nunca que ia chegar perto nem da primeira faixa da bolacha. Se tem uma coisa que o excesso matou nos últimos 15, 20 anos foi a fusão de estilos como uma característica de banda que chame a minha atenção. Na verdade virou algo como um adjetivo bem do malandro pros departamentos de marketing espertinhos. Em resumo — Chico Sciences e outras exceções fora — o lance hoje praticamente se alimenta de si mesmo, na maioria das vezes sem entregar o que é primário: música original (interessante ou divertida).
Já dita a desgraça, o lance é ouvir esse Som, Sangue e Raça, lançado em 1971 pelo pianista Dom Salvador e o grupo de músicos negros chamado A Abolição, e voltar a ter fé na tal mistura de ritmos. Como pode ter dado para perceber, A Abolição era bem influenciada pelo movimento dos direitos civis, que naquele tempo dava uma canseira no status quo do mundo. Mas, apesar disso, a influência parava por aí mesmo: nenhuma das três faixas cantadas do disco quase todo instrumental pega muito pesado na questão da segregação racial. E mesmo assim faz o serviço melhor que muita cota em universidade pública por aí…
Um dos pais do que se resolveu chamar de Brazilian Jazz, Dom Salvador já era uma figura respeitada no cenário da música nacional e internacional no começo dos anos 1960. Vindo do interior de São Paulo, em dez anos o músico tocou com precursores hoje clássicos da black music nacional, como Copa Trio e o Rio 65 Trio. Quando fundou A Abolição, Salvador colocou em prática seu plano-mestre (que ele na verdade chama de “coincidência”) e criou a obra-prima do tal Funkjazz blá blá blá do começo deste post.
Nas 12 faixas do disco, A Abolição lançou o embrião do movimento Black Rio, completando a técnica jazzística de Dom Salvador com suingues — rá! adoro essa palavra — emprestados do soul (Uma Vida, Hey Você), da bossa (O Rio, Samba do Malandrinho), do funk (Guanabara, Tio Macro) e até do forró (Folia de Reis). E o melhor, sem você nem perceber que está ouvindo tudo isso. Em vez de fazer como algumas bandas/músicos atuais e tulhar o cavaquinho (ou coloque aqui o instrumento típico brasileiro da sua escolha) lá na frente pra mostrar a malemolência brasileira, em Som, Sangue e Raça está tudo ali no lugar certo, fazendo seu papel com sossego…
É um disco que chega a ser até mesmo enciclopédico em sua excelência na hora de mostrar o que é o tal do supracitado Brazilian Jazz, e que conquistou admiradores tanto aqui quanto no exterior. Não à toa, Dom Salvador se mudou para Nova York dois anos depois do lançamento e lá reside até hoje, naturalizado e tocando em bares de jazz pelo país natal do ritmo. Ele às vezes ainda volta ao Brasil, faz alguns shows esporádicos e já falou até em montar uma nova versão d’A Abolição. A gente espera chacoalhando os fundilhos com o groove!
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4 comentários:
carai mano! ai sim, esse é foda
Inda num ouvi, mas parece trimmassa! Só faltou uma informação jornalística essencial: "o Dom é da terra natal de Axl Magal".
Rio Claro ruleia!!!
A BIG THANK YOU.
kisses
Obrigado por sua contribuição!
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