quinta-feira, 27 de novembro de 2008
:: Medeski Martin & Wood ::
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
:: arnaldo baptista ::
CÊ TÁ PENSANDO QUE EU SOU LÓKI, BICHO?
- Documentário sobre Arnaldo Baptista ilumina vida e obra de um dos mais excêntricos e idiossincráticos artistas da música brasileira -
por EDUARDO CARLI DE MORAES,
vulgo LÚCIO ESPONJA.
Na nova cine-biografia do artista, LóKi, produzida pelo Canal Brasil e dirigida por Paulo Henrique Fontenelle, raras entrevistas e imagens de arquivo elucidam um pouco do percurso artístico e existencial do ex-Mutante através dos tempos: suas bandas, amores, casamentos, manicômios, exílios, tombos e vôos. Em duas horas e pouco de passeio, mergulhamos na alma do cara e todos os que o rodearam, num percurso repleto de revelações comoventes e com um desfile de brilhantes loucuras.
Lóki poderia ser um pungente documentário sobre a queda de um rock star no labirinto da loucura, das drogas e da auto-destruição. Mas a chincha, a essência, a gema da coisa está em outro lugar: na descrição de como Arnaldo Baptista, mesmo aos trancos e barrancos, conseguiu se tornar algo muito mais belo: um sobrevivente. Pode ter chegado ao aqui-e-agora meio estropiado, na mente e no coração, e com algumas dúzias de parafusos soltos na cabeça, mas chegou. E é comovedor que ele ainda esteja entre nós, falando, pintando, cantando, brincando, iluminando e marcando época.
Quem pode negar que foi uma inacreditável volta por cima? Ele, que depois de integrar o trio mais genial da história do rock nacional, passou por várias pedreiras, provou que saiu delas vivo e tendo o que comunicar - o que já é grande coisa. Pois foram muitas orgias de tomação ácido. Cinco internações em hospícios. Um exílio de eremita numa chácara em Minas. Uma tentativa de suicídio seguida de coma. Três casamentos (o último ainda vigente). E pelo menos um coração partido em mil pedaços - que Rita Lee, seu primeiro amor, não parece ter feito esforço algum para ajudar a curar. Tudo combustível para o mito.
Apesar de fiel aos fatos, o documentário beira a elegia, montando um mosaico de hinos em louvor ao homenageado. O panteão de entrevistados que dão declarações extremamente positivas sobre Arnaldo só contribui para adicionar ainda mais densidade ao seu status mitológico. Para Tom Zé, Arnaldo Baptista é o depositário de uma sabedoria vivida que transcende o domínio da Academia e do conhecimento livresco, sendo descrito como um Iluminado com quem temos muito a aprender. Nosso pequeno Buda!
Para o maestro Rogério Duprat, foi ele o grande criador dentro dos Mutantes, que por sua vez foram os grandes criadores dentro do tropicalismo, e por isso o responsável direto por tudo que ocorreu na música brasileira de 1967 para frente. Para Lobão, compôs um dos 10 melhores álbuns da história da música nacional, Lóki. Já o irmão e mutante Sérgio Dias trata-o com reverência e o defende da acusação de ser um louco-bobo qualquer, destacando a espantosa sensibilidade que possui Arnaldo – e perguntando, provocativo: “quem é louco, Van Gogh ou a gente?”
O fã Sean Lennon, um dos responsáveis pelo “re-despertar” de Arnaldo na mídia após um longo período de ostracismo, chegou a considerá-lo o “Syd Barrett brasileiro”, estabelecendo altos paralelos entre o menino mutante e o genial e esquizofrênico primeiro vocalista do Pink Floyd.
Para o também fã Devendra Banhart, os Mutantes foram melhores do que os Beatles (!) em termos de ousadia, criatividade e capacidade de unir ecletismos radicais dentro da mesma canção. Zélia Duncan, que assumiu o papel de vocalista no revival dos Mutantes, descreve Arnaldo como “a encarnação da ‘Balada do Louco’” por conseguir encontrar um modo de ser genuinamente feliz, mesmo vivendo de seu próprio modo num mundo de fantasia completamente idiossincrático.
Já Kurt Cobain, no auge do sucesso do Nirvana, quando passou pelo Brasil para tocar no Hollywood Rock, derreteu-se em elogios à heróica banda que enfrentou um regime militar perverso a golpes de irreverência e psicodelismo. Escreveu para Arnaldo uma carta, que caiu na Internet e assim se espalhou para o resto do mundo, elogiando o músico, que mal sabia quem era esse tal de Cobain.
Os exemplos poderiam se multiplicar... mas só por esse grupo seleto de fãs e admiradores de Arnaldo Baptista já se vê o poder do retrato que Lóki traça. Partindo do passado distante, onde narra rapidamente a infância e a adolescência do artista, o filme chega até tempos mais recentes. O lançamento do disco de inéditas “Let It Bed”, em 2002, produzido por John, do Pato Fu, e distribuído nas bandas de jornal pela revista criada por Lobão, trouxe-o de volta à cena com um álbum elogiado.
Depois, é a hora do filme mostra o quanto o ‘revival’ dos Mutantes foi extremamente bem-sucedido, com DVD gravado em Londres e ovações em Nova York, mostrando ser algo muito maior que uma mera turnê caça-níqueis. Sabe disso quem esteve nos dois brilhantes shows que os novos Mutantes fizeram em São Paulo nos últimos anos: na Virada Cultural, em 2008, e no aniversário da cidade, em 2007, em ambas ocasiões tocando para um público que ultrapassava as 50 mil pessoas. Se foi bom? Como diria Devendra Banhart: “em uma palavra: bompracaralho!”
Já Rita Lee é assunto tabu quando se trata da vida de Arnaldo Baptista. Os dois, de namoradinhos juvenis e casal sacramentado pelos laços do santo matrimônio, passaram a um quase completo afastamento. Rita, como era de se prever, não dá declaração alguma para o filme. Mas Sérgio Dias aponta, sem firulas, que a saída de Rita Lee dos Mutantes, o que daria início à fase prog chatona e viajandona da banda, tem pouco a ver com diferenças musicais. Nada a ver com a suposta falta de virtuosismo instrumental dela, que a tornaria inapta a acompanhar os Mutantes em suas novas viagens nas estratosferas sônicas. Sem meias palavras, Sérgio indica que foi o fim do casamento entre Arnaldo e Rita foi o que causou a saída dela da banda e, assim, o desfazimento do trio mais genial da história do rock nacional.
Lóki é um documento histórico de primeira linha que homenageia uma de nossas figuras musicais mais excêntricas, idiossincráticas e doidamente geniais. Como filme, tem a vantagem de não ser uma mera descrição de um percurso pessoal, mas uma panorâmica de uma época cultural efervescente, dominada pela psicodelia, pelo tropicalismo, pelo LSD e pela experimentação vivencial livre e solta.
Além do mais, é uma meditação sobre a loucura, que nos convence, mais uma vez, que não há nada de errado em ter um ou outro parafuso solto e dizer coisas sem pé-nem-cabeça – e que louco mesmo é quem diz que não é feliz. Arnaldo Baptista aparece aqui como uma pessoa no limiar entre a doidice e a genialidade e um convite vivo para que reencontremos a simplicidade da infância perdida.
Arnaldo sempre jurou: “é bem melhor não ser um normal / se posso crer que Deus sou eu”. O filme só traz mais fiéis a este credo. Se Lóki, o filme, servir para deixar os normopatas menos orgulhosos de sua insossa normalidade, já terá feito muito bem. Mas faz mais: ergue um monumento sobre a ascensão, queda e ressurreição desse adorável pimpolho pirado que o Brasil faz muito bem em louvar.
TRAILER:
DOWNLOADS:
Alguns destaques da discografia de Arnaldo pós-Mutantes:
LÓKI
http://www.mediafire.com/?yi0mijguztb
http://www.mediafire.com/?vwmmmzolzyz
http://www.mediafire.com/?nhyntmwz1mm
ELO PERDIDO
http://www.mediafire.com/?nzamijwmzda
LINKS LEGAIS: NEW YORK TIMES - PERFECT SOUND FOREVER - NYT II - GUARDIAN - AMG ALL MUSIC - OFICIAL.
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
:: da série PÃO QUENTINHO ::
http://www.mediafire.com/?imeqzrewotj
http://www.mediafire.com/?0euzwyhmldd
"I Know You're Married, But I've Got Feelings Too" [67 MB]
http://www.mediafire.com/?dzwo5nhweyd
http://www.mediafire.com/?2y4gmocnmn1
THE STREETS - "Everything is Borrowed" [45 MB]
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
:: No apologies, no lyrics, no regrets, just abstract ::
Esse textinho mal merece ser chamado de resenha: está mais para uma orientação do que você encontrará acaso adquira o novo disco do Black Rebel Motorcycle Club, The Effects of 333, entrecortado por algumas reflexões sobre a banda, a indústria, a arte, e algo sobre cavernas.
Começo por dizer que adquirir The Effects of 333 é algo que eu sugiro que você faça, tanto pela música (com as ressalvas que virão logo a seguir) quanto pela iniciativa da banda: gravar um disco de forma independente, sem apoio de estúdios, e vendê-lo em seu próprio site, sem intermediários, por honestos 6 euros/dólares. Acredito que um modelo de vida digno e sustentável entre bandas e seu público, via internet, se aproxime disso. Assim, prestigiar as bandas precursoras é mais do que justo, é uma obrigação nossa. Para ficar só nos nomes grandes, Radiohead e Nine Inch Nails são outras com as quais eu já compactuei, ideologicamente e monetariamente. Neste segundo aspecto, não que estas bandas em particular precisem, mas é pelo princípio. Acabaremos sendo os responsáveis por fazer a coisa se desenvolver neste sentido, estendendo-se para todas, as grandes, médias e as pequenas. Pense nisso.
Quando ao BRMC, nota-se que a banda continua inquieta. Depois do fantástico Howl, que representou uma primeira quebra na discografia do grupo, tivemos uma retomada com o Baby 81. Pois agora, uma vez mais, eles mostram o dedo médio para quem quer que esperasse uma nova emulação de Jesus and Mary Chain e saem do estúdio com um punhado de músicas ditas "instrumental/ambient". Esse rótulo está lá no site deles, como um aviso. Lê-se pouco depois: "no apologies, no lyrics, no regrets, just abstract".
E é isso mesmo, são dez faixas em sua maioria desprovidas de melodia, formadas por ruídos, fundos sonoros contínuos, sinistros e intrigantes; sons que se estendem com o objetivo aparente de soar como qualquer coisa, menos com música no sentido tradicional da coisa. Desconfio que boa parte disso seja a definição de ambient music (ou ambient music do mal), e de fato não há muito o que acrescentar à própria definição. Como um atenuante, e para não assustar totalmente os mais conservadores, algo de melodia aparece aqui e ali, começando pela bela And With This Comes, e depois esparsamente, em faixas que parecem versões instrumentais e inacabadas de sobras das sessões de Howl. Descontruídas por camadas extras de sons alienígenas, naturalmente.
Peter Hayes cantando não se ouve, mas disto você já desconfiava, ao chegar até aqui. Aliás, parece haver pouca intervenção humana mais direta, salvo os violões e guitarras ocasionais que conduzem as tímidas linhas melódicas já citadas. Em verdade, estas linhas parecem meros traços soterrados na tal ambiência, sem destinos possíveis, prestes a submergirem no caos. Soam até, paradoxalmente, como distúrbios breves, incapazes de se manterem, ao invés de serem elas próprias as mantenedoras da música, como se faz convencionalmente. Em And When Was Better, a última música, ouvimos finalmente uma voz humana. Vozes, melhor dizendo. Algo como um passeio pela faixa AM de um aparelho de rádio, a confusão de vozes e chiados somando-se à confusão já estabelecida desde a primeira faixa. Se ainda havia alguma esperança de conclusão, de sentido, já era. O disco termina e, sendo você uma pessoa normal, deverá estar algo perturbado, na dúvida se encara de novo a parada pedregosa.
Não é música para qualquer um -- nem sei direito ainda se é para mim, nem sei direito se é música. De qualquer forma, é sempre merecedora de atenção uma banda que arregaça as mangas e registra aquilo que quer, sem concessões e sem receios. Entendo como um forte indício de arte genuína. Daí que -- não sei se é uma falha de caráter minha ou alguma espécie de sentimentalismo -- costumo me identificar com material deste tipo, por mais distante que esteja de meus interesses habituais. Botou coração e uma boa dose de independência, fico mais tolerante e com espírito mais aberto. É, é um negócio meio sem sentido, mas cá estou eu realmente envolvido com este The Effects of 333. Ouço, não entendo muito, mas curto o processo, o desafio que parece estar ali escondido nas sombras desta música inóspita, esquisita. Vou me acostumando, e começo a procurar por outras bandas do estilo, para compreender um pouco melhor este mundo, que parece habitado por criaturas que moram em cavernas. Acho até que é um interesse com prazo de validade etiquetado, mas isso não descaracteriza o valor da coisa. Vamos ver o que as outras bandas têm a me dizer.
Devaneios à parte, fato concreto é que o BRMC mostrou coragem redobrada e cometeu mais esta ruptura, ainda mais brusca que a anterior. Algo a ver com as críticas ao Baby 81? Talvez. A nova saída do baterista Nick Jago? Provável. E assim seguem traçando sua trajetória, errando aqui, acertando ali, perdendo público cá, ganhando acolá. "Hold back the edges of your gowns, ladies, we are going through hell". À sua maneira, e isso tem peso grande. Não faço a mínima idéia do que os caras aprontarão a seguir -- não acho que esse disco antecipe nada, assim como Howl não o fez -- mas a essa altura eles já são, para mim, uma das bandas contemporâneas mais relevantes, uma das com que eu mais me identifico.
:: amarante on the rocks ::
:: LITTLE JOY - idem (2008)
Um dos pães quentinhos mais aguardados do ano! O GURMAN, na Revista O Grito!, escreveu: "...chamar o Little Joy de “projeto paralelo de Amarante” é praticamente ufanismo. Muito bem acompanhado pelo rockstar americano (mas com sangue brasileiro) Fabrício Morreti, baterista do The Strokes e de sua namorada, Bikini Shapiro (nome sugestivo, não?!), Amarante solta o seu inglês nesta banda que já nasceu grande ou, como gostam de dizer por aí, hype. A gravadora responsável pelo lançamento é a pequena-grande Rough Trade Records e com a produção de Noah Georgeson (parceiro constante de Devendra Benhart), o clima livre, leve e solto faz com que o ouvinte “folk-se” junto. Impossível não se deleitar com o futuro hit “Brand New Start”, segunda música do disco, “Shoulder to Shoulder”ou “Unattainable”, cantada por Shapiro. Ou ainda com a country “How To Hang a Warhol”. E “Don’t Watch Me Dancing”, então?
Apesar de o Little Joy ser “vendido”no exterior como o projeto paralelo do “baterista do Strokes” – apesar de, no caso, ele também se arriscar na guitarra, baixo e piano - é Amarante quem assume as rédias. Sua voz, tão criticada na época de Los Hermanos se encaixa perfeitamente nas melosas melodias do trio. Seu característico timbre de guitarra, considerado deplorável por cri-críticos brasileiros soa como uma onda (desculpem a breguice). Outro ponto que vale ser ressaltado é a belíssima “Evaporar”, última música do disco, cantada em bom português e que remete institivamente a…Marcelo Camelo!! Aliás, se gravada por Camelo, “Evaporar” facilmente seria a melhor canção de seu Sou..."
DOWNLOAD (37MB - 11 músicas - 30min):
http://www.mediafire.com/?hdyrjjrmimu
sexta-feira, 7 de novembro de 2008
:: Leonard Cohen ::
Apesar de sua obra ser mais conhecida por causa de versões de suas canções (Hallelujah, pelo Jeff Buckley; Suzanne, por um sem fim de artistas; Hey, That’s No Way To Say Goodbye, pelo Renato Russo… haha!), Cohen é um dos artistas mais respeitados na música pop. É o típico “ídolo do meu ídolo”. E é sempre infalível ir atrás dos ídolos dos ídolos porque, invariavelmente, eles fazem você ficar feliz em esquecer seu anteriormente-considerado-como-artista-favorito.
Leo Cohen cantou/canta sobre sexo e amor e religião e suicídio e relacionamentos de uma maneira tão própria, lírica e desconcertantemente adulta que chega a doer. Sua mão direita no violão não é nem de perto virtuosa, mas, uma vez que se ouça, é impossível de confundir. Claro, estamos falando do Cohen dos seus primeiros trabalhos. Depois, a música caminhou por outros rumos – uns felizes, outros, não –, mas estes primeiros anos do “Cohen músico” (ele também é poeta e romancista respeitado) são essenciais para entrar em seu universo.
As músicas de Songs of Leonard Cohen (1967), Songs From a Room (1969) e Songs of Love and Hate (1971) são em sua maioria minimalistas e mais próximas do folk europeu do que de qualquer outra coisa (apesar de Cohen canadense). Apesar das comparações com Bob Dylan, o outro judeu-poeta-gênio de sua geração, sua obra é bem mais datada. E, de um jeito curioso, isso só dá mais força a ela. São polaróides de uma época que já acabou, se é que já existiu. Um mundo mais lento, velho, escuro, salgado, inteligente, melancólico, sóbrio e difícil pra caralho de se descrever em uma resenha de 2000 toques.
Enfim, Leonard Cohen não merecia ser apresentado por este texto. Mas pode ter certeza que a sua vida merece o prazer e o descanso que é ouvir qualquer um destas três obras-primas. Boa pirataria.
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:: Arrigo Barnabé ::
Esse preâmbulo serve para dar a devida dimensão a um acontecimento aparentemente sem nenhuma importância: a chegada às minhas mãos de uma fitinha cassete, contendo as músicas do disco Clara Crodolilo. Quem me apresentara foi Sérgio Shuller. Na ocasião, 1982, fazíamos Faculdade de Letras na UFRJ, localizada na Av. Chile. É curioso que Sérgio dizesse parte daquele contingente citado acima de "filhos de pais torturados", porque todo seu movimento era justamente no sentido de negar esse fato. Fazíamos parte de grupos de poesia, líamos Rimbaud e fundamentalmente ele discutia muito com a mãe, formada no quado do antigo partido comunista. Claro que Caetano era uma referência, assim como Chico Buarque e toda mpb. E eu ia vivendo essa estória meio a contragosto, como se tivesse sido empurrado para dentro dela.
Hoje pensando no choque que representou Clara Crocodilo, produzido em 1980 (produção independente de Robinson Borba) com Arrigo Barnabé e a banda Sabor de Veneno, e trazendo no cast pessoas como Paulo Barnabé (Patife Band), o baixista Otávio Fialho, Itamar Assunção, Vânia Bastos, Tetê Espíndola, para não mencionar o texto das músicas e a capa do disco, é que de fato um novo mundo se descortinava. Era um golpe de karatê na MPB já moribunda.
A pergunta "onde andará Clara Crocodilo?", pergunta essa que eu reintroduzo no "SKYLAB III", abre uma nova perspectiva: não se fala mais do sujeito, mas sobre o sujeito; se está além dele. Após possíveis respostas sobre onde andará Clara, chega-se nesta: "Será que ela está adormecida em sua mente, esperando a ocasião propícia para despertar e descer até seu coração, ouvinte meu, meu irmão?" Essa última possibilidade nos desloca para fora do sujeito, objetivando-o e dando-lhe um campo de foco. E esse é o último momento do disco, como se para chegarmos a tal revelação fosse preciso uma longa travessia: não só pelas músicas anteriores como pelos 20 anos que passou aprisionada num disco de sebo. De fato essa idéia de tempo contrasta com o imediatismo do mercado. E talvez tenha sido esse o pecado capital do rock brasileiro.
Em verdade, o rock Brasil traiu suas origens. A Blitz é um bom exemplo, porque foi a partir dali que o rock brasileiro dava os seus primeiros passos - isso, claro, sem considerar experiências isoladas e anteriores como os Mutantes. Mas foi com a Blitz que se desencadeou um movimento articulado que viria a dar no "Rock Brasil". E a experiência bem sucedida do movimento deve-se única e exclusivamente a essa traição: aproveitam-se as inovações no tocante a idéia de coro, a narrativa descolada da música, a total informalidade do narrados, coisas que estão presente em Clara Crocodilo, mas a estrutura musical continua intacta, dentro do universo da MPB - tão convencional como esta. Daí porque a sensação de que o rock brasileiro foi muito mais reformador que revolucionário: muda-se exteriormente toda a mis-èn-scène da MPB, mas interiormente a estrutura é intocável.
Talvez o futuro da música brasileira acene numa outra direção e algumas bandas, muito precariamente, já começam a dar sinais nesse sentido. A semelhança com a MPB é puramente externa - porém ao nível da estrutura, internamente falando, há uma profunda inversão. E a idéia de perversão é justamente essa. Os refrões não foram abolidos,mas têm uma outra função. O canto continua presente, assim como a guitarra, o violão, o baixo. Como em Clara Crocodilo, tudo isso está presente, mas a sensação de estrago, de terra arrasada é grande. Revivendo aquela primeira audição, a primeira idéia que surge é a falta de chão. Nada disso foi sentido ouvindo os grandes ícones da música brasileira. Seja Tom Jobim, seja Villa Lobos, você está em território seguro: nenhum susto, nenhuma sensação de mal estar; tudo já foi devidamente explorado antes: em Tom Jobim o jazz americano, em Villa Lobos o folclore nacional com a dignidade da música clássica. Mas em Arrigo há uma junção insólita: a música contemporânea com suas dissonâncias e seu atonalismo mais a cultura de massa. E isso deixa no ouvinte uma certa perplexidade: tudo que é dito em Clara Crocodilo é estranho e familiar ao mesmo tempo. "Você, ouvinte incauto, que no aconchego do seu lar, rodeado de seus familiares, desafortunadamente colocou esse disco na vitrola... o pesadelo começou."
Não existe uma história do trágico. Até mesmo porque ele aparece repentinamente, abruptamente. "Araçá Azul" é o momento trágico na MPB, rapidamente ocultado. Assim como foi "Cabeça Dinossauro" no rock brasileiro. Daminhão Experiença é tão trágico que a MPB permanece resoluta em desconhecê-lo. Mas Clara Crocodilo, mais do que Tubarões Voadores ou Gigante Negão, é a expressão mais acabada do que poderíamos denominar "trágico" na música brasileira. Até mesmo porque tudo aquilo foi construído conscientemente. E também porque não existe antecedente nessa junção da música erudita, via atonalismo e dodecafonismo, com a música popular. Essa junção insólita extrapola todos os códigos: é algo novo no Brasil e no mundo.
Fazer música para mim é não encontrar ressonância no punk, nem no Rock Brasil, e nem no hip-hop - esse último, hoje em dia, tão em voga através da MTV e selos supercultuados como o Instituto. O que significa estar também a mil milhas da MPB. Porque fazer música é fundamentalmente captar o que ainda não foi transformado em ideologia. O mais terrível é ouvir artistas supercultuados, como é o caso de Marcelo D2, passando pelos Racionais MCs, Nação Zumbi, e sentir em toda a verborragia exposta o laivo de moralismo que a sustenta. Fazer música pra mim é de uma certa forma repetir Clara Crocodilo. Ou então repetir infinitamente aquele momento inusitado quando ouvi pela 1a vez aquela fita cassete. Sérgio Schüller continua me olhando enquanto eu vou combinando alguns acordes para uma nova música. Logo ele que nunca mais encontrei. Lógico que existe um abismo entre essas minhas músicas e Clara Crocodilo. Mas o processo de repetição é esse mesmo: o eterno retorno do diferente.
(in: Noite Passada um Disco Salvou Minha Vida
- org: Alexandre Petillo. Ed. Geração Editorial)
http://www.mediafire.com/?jzmhyzi2yjn
terça-feira, 4 de novembro de 2008
:: Short Music For Short People ::
Lançado em 1999, Short Music For Short People representa um ótimo recorte de como era o punk-rock e hardcore dos anos 90.
domingo, 2 de novembro de 2008
:: Echo and the Bunnymen ::
“Porcupine” (1983)
ALTURAS INATINGÍVEIS
- Em momento de crise, o Echo & The Bunnymen
gravou um marco dos anos 80 -
por PEDRO SÓ (Showbizz, Discoteca Básica, Julho de 1999)
O Echo & The Bunnymen desenvolveu um trabalho tão bom que, apesar de amado por todos os que se iniciaram no rock durante a década passada, tem poucos discípulos. Discos como este, terceiro de sua carreira, realmente intimidam possíveis seguidores. Porcupine, porém, é uma escolha polêmica entre os fãs do grupo, que apreciam bastante o primeiro álbum, Crocodiles, de 1980, e mais ainda o quarto, Ocean Rain, de 1984. Para tirar a teima, ninguém melhor do que a própria voz de Ian McCulloch (vocalista e líder da banda), em recente entrevista: “Este é provavelmente o melhor disco do Echo. Foi horrível de fazer, mas é o melhor.”
Estamos diante de um daqueles álbuns que merecem ser escutados a fundo dezenas de vezes, em épocas diferentes da vida. Em 1982, Ian, Will Sergeant (guitarrista), Les Pattinson (baixista) e Pete De Freitas (bateria) jamais poderiam ter se permitido passear pelo mundo da fantasia de canções ultra-românticas como “Killing Moon” e “Crystal Days”, do belíssimo Ocean Rain. Depois de lançar dois discos cultuados, eles ainda perseguiam a sobrevivência: tiveram 25 libras (cerca de 100 reais) por semana. O sucesso não vinha e o clima na banda era de desconfiança. “Estamos perdendo o sentido da nossa missão”, verso da faixa-título, “Porcupine”, não era endereçado a nenhuma musa.
“Era Apocalypse Now na hora em que Marlon Brando sai retalhando porcos e faz sua pintura de guerra. Foi a fase mais claustrofóbica da minha vida”, lembra hoje o cantor. Os arranjos do disco, porém, jogam sempre para cima, para o épico. Somados às letras, eles denotam uma adorável arrogância de Napoleão de hospício.
Poucas vezes uma cozinha (Pattinson e De Freitas) tão limitada tecnicamente rendeu tanto, segura nas variações de dinâmica aprendidas ouvindo Velvet Underground. Raros são encontros como o do guitarrista Will Sergeant (versátil e sempre inventivo – talvez a grande estrela do álbum) com o do violinista indiano L. Shankar, convidado especial.
Em “The Cutter”, com introdução chupada de “Matthew and Son”, de Cat Stevens, até os trompetes sintetizados incluídos por “sugestão” da gravadora funcionam. Essa canção e “The Back Of Love”, encorpada com celos, deram ao Echo os hits que lhe faltavam. Mas o disco tem muitos outros momentos inspirados.
Na dramática “Clay” (“quando eu me fiz em pedaços, não era feito de areia / quando você me arrasou, o barro se esfacelou em minhas mãos”) e na lindíssima “Porcupine”, Ian McCulloch tira o rock do beco-sem-saída pós-punk, recuperando ambições jim-morrisonianas em canções sempre concisas (grande vantagem em relação ao Doors). Seu lirismo atinge o auge na última faixa, a ciranda psicodélica “In Bluer Skies”: “Estou contando com seu coração pesado / Será que ele me impedirá de me dilacerar?”
DOWNLOAD:
http://www.mediafire.com/?m2kmjmzydyk
:: admite-se novos depredadores! ::
- pequeno perfil biográfico, com idade, profissão, interesses, hobbies e outros detalhes que visem seduzir a simpatia do júri;
- uma listinha do que o candidato julga serem os 5 discos mais fodas de cada década, dos anos 60 à atual;
- uma listinha de 10 bandas prediletas;
- de duas a quatro pequenas resenhas, de no máximo 1.500 caracteres, sobre qualquer álbum, que serviriam como os primeiros posts do novo membro no blog;
p.s.: o upload dos discos e o design dos posts fica a nosso cargo!
É isso aí! Caso algum desequilibrado mental se interesse em fazer parte desse blog, considere-se convidado. Mais fácil que passar na Fuvest...!