sábado, 21 de fevereiro de 2015

PALESTINOS DA PASSAGEM [DOC] - Manifestação da Frente De Luta Pelo Transporte Público, Goiânia (20 02 2015)


Goiânia, 20/02/2015.

Estivemos na 1ª Manifestação da Frente De Luta Go contra o aumento de 50 centavos na tarifa do transporte público em Goiânia. A danada saltou de R$2,80 para R$3,30 e está entre as 3 mais caras do país.

Uma bandeira da Palestina tremulava nas mãos dos manifestantes que caminhavam e cantavam na vanguarda da marcha quando, nas imediações do Terminal da Praça da Bíblia, as bombas brucutus da PM começaram a chover sobre a juventude combativa de Goiânia.

Não tardaram as lágrimas nos olhos, a ardência na garganta, a sensação de sufocamento, tudo cortesia desse entulho autoritário que nos legou a Ditadura Militar - a PM - e que viola cotidianamente a liberdade de expressão e manifestação na pólis, atirando bombas tóxicas de (d)efeito moral, em nome da “ordem” e “segurança”. Cada bomba de gás lacrimogêneo custa mais de 1.000 reais; cada vez que uma delas explode, é um leito a menos nos hospitais, um computador a menos nas escolas, um indignado a mais pronto a apedrejar o Choque como os palestinos fazem contra os tanques de Israel.

Estávamos lá, professores universitários e estudantes, cinegrafistas e jornalistas, punks e Black Blocs, militantes de partidos de esquerda e vendedores de algodão-doce e pipoca, e todos - manifestantes e testemunhas - foram brindados com uma chuva de chemical warfare, cortesia do Marconi, quando chegavam ao terminal. Cof, cof!

"Protestar não é crime" e "Pelo direito de livre manifestação" eram algumas das palavras-de-ordem carregadas a desfilar pelas ruas. Entre os gritos entoados em coro estavam: "Se não abaixar, o pau vai quebrar!", e o clássico punk da banda goiana Señores: "Recua, polícia, recua! O poder popular está na rua!"


A mídia burguesa pode até armar seu barraco clichê e dizer que está em questão uma guerra entre os vândalos e depredadores, de um lado, e os protetores heróicos da ordem pública, de outro. A Tv Anhanguera, a Globo de Goiás, foi previsivelmente patética em sua reportagem, criminalizadora dos manifestantes e que bate palmas para a truculência policial.

Hoje, a juventude radicalizada de Goiânia, empunhando bandeiras vermelhas do MEPR, camisetas do Che Guevara e do Bob Marley, portando dreadlocks e skates, demandava ser ouvida em sua revolta. Às dúzias erguiam os dedos-médios e bradavam impropérios para o helicóptero sinistro da PM que voava baixo ao redor de um abutre solitário.

Uma ou outra pedrada foi dada, de fato, no banco Santander da Av. Anhanguera, mas que não passou de um arranhão, que não trará dano sério nenhum à mega-corporação. Aliás, poucos dias após a revelação do escândalo HSBC com os leaks suíços, é mais compreensível do que nunca que a fúria popular - pelo menos dos elementos mais bem-informados sobre as maracutaias de nosso capitalismo global - volte-se contra bancos privados mafiosos.

Alguns lixos foram incendiados, algumas toscas barricadas foram improvisadas - amostras do ímpeto combativo de parte dos manifestantes. Um carro da imprensa - do SBT, se não me engano - foi capotado, um sinal de que o conservadorismo, o fascismo e o mandonismo tão comuns na mídia comercial de massas também irá sofrer represálias nas ruas, como ocorreu nas Jornadas de Junho de 2013, caso insista em criminalizar manifestantes e aplaudir quando a PM desce o pau.

"Não pago, não pagaria! Transporte público não é mercadoria!", entoou a manifestação diante do Centro de Aulas da UFG (Universidade Federal de Goiás). Na real, é isso: o que está em questão é todo um sistema econômico mafioso, que transforma todos os serviços públicos em mercadoria, que insiste em aplicar a cartilha tucana da Privataria. Os interesses de uma elite de empresários vão prevalecendo sobre os direitos-de-ir-e-vir da massa da população; alguns enchem o rabo com milhões de dólares, que grandes bancos depois ajudam a esconder na Suíça ou sei lá onde, enquanto a gente anda espremido no Eixão, como sardinhas numa lata de ferro tamanho Busão…

É um pouco de tudo isto, e muito mais que ainda não tive fôlego de narrar neste texto corrido, o que está documentado neste filme, registrado hoje nas ruas nuas e cruas, editado na correria e urgência Ninja, e que publico a fim de pôr em comum algumas imagens dos agitos políticos que têm tomado o espaço público em Goiânia neste começo de 2015.

O doc foi batizado brilhantemente pela Gisele Toassa como “Os Palestinos da Passagem”.

Foto: Ruber couto, Cristovão Matos, Daniele Reis