Caros leitores & cosmonautas da blogosfera:
Desde que foi exterminada toda a música que era por aqui compartilhada, este blog vêm sofrendo com uma certa crise de identidade, semelhante àquela que acomete alguém que teve um membro amputado e que, apesar de precisar redefinir seu papel no mundo e suas ações cotidianas em sua nova condição de handicaped, ainda sente o braço ou a perna que já não tem.
O Depredando o Orelhão é hoje um dos estropiados e mutilados em outra das guerras que o capitalismo norte-americano teima em inventar: "a guerra em prol do direito autoral" - guerra esta que, me parece, pretende atacar a própria estrutura da Internet, cercear as potencialidades mais incríveis desse meio-de-comunicação tão revolucionário, em prol, como de praxe, do direito-ao-lucro das mega-corporações de mídia, dos magnatas da Indústria do Entretenimento, dos que já tem mais do que precisam ter ("e quase sempre se convencem que não tem o bastante... falam demais por não ter nada a dizer!").
Por isso o blog têm andado meio de luto, carregando ainda este "membro fantasma" que são 54 gigabites de MP3 e mais de 800 álbuns musicais recentemente dizimados. O que vocês vêem aqui é menos um blog do que um soldado ferido, internado no ambulatório, exangue e pálido depois dos tiros que tomou do "Esquadrão Anti-Pirataria".
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estatísticas do mediafire dias antes do deletamento da conta... tudo o que se perdeu! |
Dia desses, lá no Metrópolis, na noite memorável em que o M.Q.N. encerrou suas atividades após 15 anos de muito bad ass rock'n'roll (mas na certeza de que a "cena" de Goiânia prossegue muito bem representada por Black Drawing Chalks, Hellbenders e mais um monte de gente....), eu e o Batata divagávamos sobre o futuro da música na era da Internet. Concluímos que infelizmente há uma grande chance de nos tornarmos, no futuro, uns saudosistas, uns nostálgicos, uns "tiozões" cheios de discursinhos "ah como era boa a época em que a gente era jovem!"
“…uma das propostas do ACTA é que seja criminalmente punido todo e qualquer indivíduo que partilhe, ou usufrua, de forma livre e gratuita, de qualquer tipo de informação protegida por direitos de autor na Internet, seja essa informação uma música, um filme, ou até uma citação de jornal ou livro. Ou seja, a partir do momento em que o projeto-de-lei estiver em vigor, passará a haver um severo controle de todos os conteúdos publicados online, sejam eles música ou textos de opinião.” (@baixacultura)
É possível que nos tornemos, caso SOPAS, ACTAS e PIPAS sejam realmente efetivadas, tiozões cheios de saudade que lembram-se com lágrimas nos olhos dos bons-velhos-tempos em que a Internet era livre... Teremos que nos lamentar por ter ocorrido o cerceamento e o estrangulamento do compartilhamento livre de dados devido às tiranias do grande capital.Contaremos às novas gerações a história de um tempo em que a cultura circulava mais livremente e onde o acesso à maior biblioteca multimídia já criada era fácil e barato. "Filhão, era uma vez um tempo sublime onde existiam trecos chamados Napster e Megaupload...".
Àqueles que vêm pedindo insistentemente, nos comentários, que os álbuns sejam repostados, peço que entendam a imensa dificuldade de restabelecer uma biblioteca musical desse tamanho, que foi sendo construída aos poucos, ao longo de 4 anos de trabalho. Lamento dizer que não há nenhuma chance, no futuro próximo, desse blog voltar a operar com 100% de links funcionais, como foi até pouco tempo. Mesmo que eu recomeçasse os uploads, correria o risco de realizar um imenso Trabalho de Sísifo, arrastando pedregulhos para o topo de montanhas só para vê-los despencar de novo encosta abaixo.
Na real, a Internet, hoje, passa por um período instável e qualquer serviço de file-sharing corre o risco de ser fechado, processado e exterminado da noite pro dia. Os EUA estão chefiando uma enorme campanha de criminalização de blogs como este aqui e os mais truculentos e autoritários dos líderes políticos gostariam de botar um monte de gente na cadeia por baixar ou compartilhar música da Internet.
Os Estados Unidos da América, afinal de contas, há décadas vêm agindo como um truculento gigante brutalhão que só enxerga interesses privados, cego feito um poste para conceitos como "justiça social" ou "acesso universal à educação e à cultura". Meu anti-americanismo, que sempre foi intenso, só se intensifica mais - e muita gente, de Chomsky a Naomi Klein, de Michael Moore a Slavoj Zizek, nos mostram muitas razões legítimas para que sintamos indignação contra a política externa e interna do establishment yankee.
Eis um Estado que apoiou ditaduras militares na América Latina (antes do 11 de Setembro de Manhattan, é sempre bom lembrar, houve o 11 de Setembro de 1973 no Chile, com os EUA apoiando as tropas de Pinochet na derrubada de Allende...). Eis um Estado que devasta com suas bombas os países que ensaiam uma alternativa socialista ou comunista, e sempre papagueando que vai "ensinar o que é democracia". Eis um Estado que invade com sua máquina bélica, que aliás sofre de elefantíase, o Oriente Médio transbordante de petróleo, cego para o fato de que uma civilização baseada em petróleo é insustentável e que vai inevitavelmente, mais cedo ou mais tarde, sofrer mais e mais cracks.
Eis uma nação que encarcera grande parte de seus próprios cidadãos: 25% da população carcerária do mundo está nos EUA! Enfim: uma nação onde Wall Street, os banqueiros, as mega-corporações, o setor bélico e os militares têm muito mais poder do que seria recomendável; um Estado policial, autoritário, fundamentalista, violento, embriagado de ganância, poluidor atmosférico que caga em cima de Protocolos de Kyoto, e assim por diante...
Infelizmente, pois, não sinto ânimo para recomeçar a construção da Biblioteca de Música que eu estava construindo aqui no Depredando, sabendo do imenso descaso e desdém que o FBI e os acionistas de Wall Street possuem pela idéia de Cultura Livre. O acesso gratuito e massivo a bens culturais que formam, informam e inspiram não interessa aos grandes poderes (podres poderes!), não interessa ao 1% no topo da pirâmide. O que eles querem é se manter no topo, com tudo o que isso implica de prosseguimento da concentração de capital e da "monopolização" do que Bordieu chamaria de "capital cultural". O capitalismo não tem interesse em que nos tornemos cultos e bem-informados: quer-nos consumidores burrinhos, hipnotizáveis por propagandas escrotas, que comprem feito sonâmbulos e que prossigam sustentando um sistema insustentável.
Mas o Depredando o Orelhão é um vietcongue aguerrido. Foi mutilado e estrupiado, mas não quer cometer blogcídio e confessar derrota. Tenho muito gosto por este blog, rebento do meu ventre grávido de vontades de falar sobre a música que me entusiasma. Nunca imaginei, ao criar essa bagaça, que ela um dia chegaria a mais de 275.000 visitas e quase 1 milhão de downloads. É sinal de que há muita gente que se interessa por conhecer novos sons, expandir horizontes culturais, ir além da papinha mastigadinha da grande mídia. Coloquei um bocado imensurável de tempo e dedicação nisso aqui, por mais de 4 anos, sem jamais ganhar um único tostão com isso. Não ganho grana às custas do trabalho de artistas ou de corporações e, pra mim, pirataria "de verdade" é aquela feita com fins lucrativos, o que não é o caso de nenhum dos excelentes blogs brasileiros da "nossa turma":
Eu Ovo,
Um Que Tenha ou
Hominis Canidae, dentre muitos outros.
Tenho certeza que não é intenção de nenhum desses blogs, nem nunca foi do Depredando o Orelhão, prejudicar qualquer artista que seja: é a Indústria que demonstra muito mais desdém pelo valor "humano" da música do que qualquer desses blogueiros, muitos deles autênticos amantes da música, que desejam difundir e disseminar as criações que descobrem e, assim, contribuir para que os artistas se tornem mais conhecidos, mais apreciados, e que possam assim circular mais por aí, tocar mais ao vivo, estabelecer novas ligações e parcerias.
Já a Indústria é cega a todos os valores que não sejam os comerciais; pra ela, música não passa de mais uma mercadoria. Já os verdadeiros artistas, como eu entendo, desejam sobretudo que a música atinja outros seres humanos, que seja reproduzida o máximo possível por aí, que expresse algo de intenso, de comovedor, de belo ou de terrível que faça o público simpatizar, empatizar, se inflamar, cantar junto, dançar no ritmo... em suma: o artista quer contato genuíno com seres humanos que se abram à influência de sua obra.
Claro que todo artista precisa de seu ganha-pão e que aqueles que não têm contratos com grandes corporações (são maioria!) sofrem para viver de arte. Ora, me parece que a blogosfera existe como um "palco" privilegiado justamente para a difusão da arte independente, de tudo aquilo que não consegue atingir as grandes mídias tradicionais, que não toca no rádio nem passa na TV. Daqui pra frente, pois, a solução para o blog se manter vivo será investir cada vez na Independência. Por uma sociedade mais artística, mais lúdica, mais criativa, com uma circulação de idéias, criações e pessoas intensa e fecunda!
Se o Eixo nos rechaça e nos reprime, é mais um motivo para ir, cada vez mais, para fora do eixo. Incentivar os artistas locais. Divulgar a arte que nasce longe da indústria. Tentar fomentar cada vez mais estas redes que permitem ocorrências fantásticas como... 200 Gritos Rocks em 2012. Quem diria que um "agito" nascido em Cuiabá atingiria algo tão colossal! Mas também depende do público que frequenta os blogs tornar-se cada vez mais consciente dos malefícios do grande capital e dos abusos da Indústria do Entretenimento, e apoiar os inssurrectos, os que gritam "independência ou marte!", ou que saem do trilho, os que constroem alternativas.
Isto aqui, portanto, não é mais um "blog de MP3". Os coices que nos deram as ôtoridades em guerra contra nós, os "piratas", exigem que isto aqui passe por uma mutação. Não se assustem, pois, com as imprevisíveis modificações no conteúdo do blog. Serão experimentos de novos rumos. Como jornalista e filósofo, me interesso por um bocado de assuntos além de música e que, daqui pra frente, pretendo tratar em mais detalhes por aqui, com destaque para algumas "causas políticas" que eu me sinto cada vez mais serem urgentes e dignas de ativismo e luta - não só a libertação da Internet do jugo dos censores, mas muitas outras: libertação animal e vegetarianismo, aquecimento global e outras questões de sustentabilidade, fanatismo religioso e a preocupante sobrevivência de poderes pastorais, legalização da cannabis e políticas de drogas mais inteligentes, direitos civis de minorias, e por aí vai...
Tenho também uma pá de textos na gaveta, ainda sem publicação, que são os primeiros frutos das minhas pesquisas de mestrado. Há uns seis meses sou um mestrando em filosofia na UFG (Universidade Federal de Goiás) que têm se debruçado sobre as idéias de Nietzsche, Foucault, Huxley, Benjamin, Max Stirner, dentre outros. Melhor do que deixar mofando na gaveta, me parece, é postar os textões aqui, ainda que eu saiba que a paciência e a dedicação para ler textos mais longos e "exigentes" seja um tanto rara. Não estranhem, pois, com as "novas caras" que este blog vai experimentar, em "guinadas" em direções as mais diversas... mais à vanguarda, mais à esquerda, mais à míngua, mais com cara dum zinão punk, quiçá mais panfletário e mais politizado, mas espero que... mais indefinível do que nunca. Sugestões, conselhos, críticas e idéias serão sempre muito bem-vindas, em especial num momento desses, de crise identitária e tentativa de definição de novas vias, novas barricadas, novas guerrilhas.
Este vietcongue estropiado não confessa derrota e ainda quer sobreviver para pôr pulgas na cueca de Golias. A solução, por hora, é abandonar o MP3 e deixar os posts antigos como estão, uma espécie de ossário a céu aberto que lembre o visitante de tudo o que foi perdido, souvenir de uma biblioteca arruinada. Uma batalha foi perdida, mas não a guerra. Os anônimos são legião. E agora as guerrilhas são outras: na aldeia global, guerrilheiros de várias pátrias se unem em causas comuns, tentando se organizar contra o autoritarismo e os liberticidas num mundo em acelerada e constante mutação. Ferido mas longe de estar morto, este blog se arrasta para a Sierra Maestra!
Sigam antenados!
P.S.: as atualizações estão bem mais frequentes
lá no nosso Tumblr... confira!